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Vancomicina e derivados: Como a Era do AUC/MIC Está Redefinindo o Controle de Infecções por MRSA

Vancomicina, MRSA e AUC/MIC — três siglas que definem um novo capítulo na luta contra as infecções hospitalares.
Na era da resistência antimicrobiana, compreender e aplicar corretamente os glicopeptídeos e lipoglicopeptídeos tornou-se mais do que um desafio técnico: é um imperativo clínico. As diretrizes de 2020 da IDSA e da ASHP marcaram uma virada decisiva, substituindo o monitoramento baseado em níveis de vale pela razão AUC/MIC, símbolo de uma medicina de precisão que alia eficácia e segurança.

Mas o campo não parou aí. A chegada dos lipoglicopeptídeos de ação ultralonga — como dalbavancina e oritavancina — não apenas expandiu o arsenal terapêutico, como também reconfigurou o modelo de cuidado, permitindo tratar infecções graves com apenas uma ou duas doses semanais.
Neste artigo, revisamos criticamente os mecanismos, evidências clínicas e implicações práticas desses agentes, destacando como as CCIHs e equipes de stewardship antimicrobiano podem liderar essa transição para uma era de maior precisão, segurança e sustentabilidade terapêutica.

FAQ: Vancomicina e a Era do AUC/MIC no Controle de Infecções por MRSA

Este FAQ foi preparado para profissionais de saúde, incluindo gestores hospitalares, membros da CCIH, médicos, farmacêuticos e enfermeiros, com o objetivo de esclarecer dúvidas sobre o manejo de infecções por Staphylococcus aureus resistente à meticilina (MRSA) com vancomicina e seus derivados, à luz das novas diretrizes baseadas em AUC/MIC.

Conceitos Gerais

1. O que é MRSA e por que é uma preocupação hospitalar?

MRSA é a sigla para Staphylococcus aureus resistente à meticilina, uma bactéria que desenvolveu resistência a antibióticos comuns, como a meticilina. É uma das principais causas de infecções relacionadas à assistência à saúde (IRAS), representando um grande desafio no ambiente hospitalar devido às limitadas opções de tratamento e ao risco de disseminação entre os pacientes.

2. O que é a vancomicina e qual seu papel no tratamento de infecções por MRSA?

A vancomicina é um antibiótico glicopeptídeo, considerado o tratamento de escolha para infecções graves causadas por MRSA. Ela age inibindo a síntese da parede celular bacteriana, sendo fundamental no combate a essas infecções.

3. O que significa AUC/MIC e por que este parâmetro se tornou o padrão para o monitoramento da vancomicina?

AUC/MIC é a razão entre a Área Sob a Curva de concentração plasmática do antibiótico em 24 horas e a Concentração Inibitória Mínima (CIM) do microrganismo. Este parâmetro reflete a exposição total do corpo ao medicamento ao longo do tempo. Tornou-se o padrão-ouro para o monitoramento da vancomicina por se correlacionar melhor com a eficácia clínica e estar associado a um menor risco de nefrotoxicidade, em comparação com o monitoramento tradicional pelos níveis de vale.

4. Quais são as metas terapêuticas de AUC/MIC para o tratamento de infecções por MRSA com vancomicina?

Para infecções graves por MRSA, a meta terapêutica recomendada para a razão AUC/MIC é de 400-600. Manter os níveis dentro dessa faixa otimiza a eficácia do tratamento e minimiza o risco de toxicidade renal.

5. O que é o VRSA e qual a sua importância clínica?

VRSA é a sigla para Staphylococcus aureus resistente à vancomicina. Trata-se de um fenótipo de resistência extremamente raro, mas de grande importância clínica, pois representa uma falha terapêutica a um dos principais antibióticos para o tratamento de infecções graves. A notificação de casos suspeitos é crucial para a vigilância e controle.

AUC/MIC na Prática

6. Como o monitoramento por AUC/MIC é realizado na prática clínica?

O cálculo do AUC/MIC pode ser feito por meio de softwares que utilizam modelos farmacocinéticos bayesianos. Coletam-se uma ou duas amostras de sangue do paciente em momentos específicos após a administração da vancomicina, e os resultados são inseridos no software, que estima a AUC e orienta os ajustes de dose.

7. Quais as vantagens do monitoramento por AUC/MIC em relação ao monitoramento do nível de vale?

As principais vantagens incluem maior precisão na otimização da dose, melhor correlação com desfechos clínicos positivos, redução do risco de nefrotoxicidade e a possibilidade de um manejo mais individualizado do tratamento, considerando as características de cada paciente.

8. O monitoramento por nível de vale ainda é aceitável em alguma situação?

Embora o AUC/MIC seja o padrão-ouro, o monitoramento por nível de vale (com metas entre 15-20 mg/L) ainda pode ser considerado em instituições com recursos limitados, onde a implementação do cálculo de AUC/MIC ainda não é viável. No entanto, a transição para o novo método é fortemente recomendada.

9. Como a função renal do paciente afeta a dose de vancomicina e o monitoramento por AUC/MIC?

A vancomicina é eliminada principalmente pelos rins. Portanto, a função renal (avaliada, por exemplo, pelo clearance de creatinina) é um fator crucial para determinar a dose e a frequência de administração. Em pacientes com insuficiência renal, as doses devem ser ajustadas para evitar acúmulo do fármaco e toxicidade. O monitoramento por AUC/MIC é especialmente importante nesses pacientes.

10. O que fazer quando o CIM do MRSA é alto (≥ 2 mg/L)?

Quando o CIM da vancomicina para o MRSA é ≥ 2 mg/L, atingir a meta de AUC/MIC de 400-600 pode exigir doses muito elevadas, aumentando o risco de nefrotoxicidade. Nesses casos, a utilização de outros antibióticos, como a daptomicina ou a linezolida, deve ser considerada.

11. Qual o papel do farmacêutico clínico no monitoramento da vancomicina?

O farmacêutico clínico tem um papel fundamental no monitoramento da vancomicina, atuando no ajuste de doses, na interpretação dos resultados de AUC/MIC, na prevenção de interações medicamentosas e na orientação da equipe multiprofissional para garantir a segurança e a eficácia do tratamento.

12. Quais os principais desafios na implementação do monitoramento por AUC/MIC nos hospitais?

Os desafios incluem a necessidade de softwares específicos, a capacitação da equipe multiprofissional (médicos, farmacêuticos e enfermeiros), a padronização da coleta de amostras e a integração com o laboratório de microbiologia para a obtenção do CIM.

Novos Lipoglicopeptídeos

13. O que são lipoglicopeptídeos e quais as principais opções disponíveis?

Lipoglicopeptídeos são uma classe de antibióticos derivados da vancomicina, com modificações estruturais que lhes conferem maior potência e uma meia-vida mais longa. As principais opções disponíveis são a dalbavancina, a oritavancina e a telavancina.

14. O que é a dalbavancina e quais suas vantagens?

A dalbavancina é um lipoglicopeptídeo de ação ultralonga, com uma meia-vida de aproximadamente 14 dias. Sua principal vantagem é a possibilidade de administração em dose única ou semanal, facilitando o tratamento ambulatorial de infecções que exigiriam longos períodos de internação para antibioticoterapia intravenosa diária.

15. O que é a oritavancina e quais suas vantagens?

A oritavancina também é um lipoglicopeptídeo de ação ultralonga, com meia-vida de cerca de 10 dias. Assim como a dalbavancina, permite a administração em dose única, sendo uma opção eficaz para o tratamento de infecções de pele e tecidos moles.

16. O que é a telavancina e em que se diferencia dos outros lipoglicopeptídeos?

A telavancina tem um mecanismo de ação duplo, inibindo a síntese da parede celular e rompendo a membrana celular bacteriana. Tem uma meia-vida mais curta que a dalbavancina e a oritavancina, exigindo administração diária. É uma alternativa à vancomicina em infecções de pele e tecidos moles e em pneumonias hospitalares.

17. Quando se deve considerar o uso de lipoglicopeptídeos de ação ultralonga?

O uso de dalbavancina ou oritavancina deve ser considerado em pacientes com infecções de pele e tecidos moles, osteomielite ou outras infecções por MRSA que necessitariam de tratamento intravenoso prolongado, permitindo a alta hospitalar precoce e a continuidade do tratamento em regime ambulatorial.

18. Os lipoglicopeptídeos de nova geração precisam de monitoramento terapêutico como a vancomicina?

Não, dalbavancina e oritavancina não requerem monitoramento terapêutico de rotina, o que simplifica o seu uso e contribui para a segurança do paciente.

19. Quais as principais indicações aprovadas para dalbavancina e oritavancina?

Ambas são aprovadas para o tratamento de infecções bacterianas agudas da pele e estruturas da pele (ABSSSI). No entanto, estudos e a prática clínica têm expandido seu uso “off-label” para outras infecções, como osteomielite e endocardite.

20. Como os custos dos novos lipoglicopeptídeos se comparam aos da vancomicina?

Apesar de o custo por dose dos novos lipoglicopeptídeos ser mais elevado, a redução do tempo de internação e dos custos associados ao monitoramento terapêutico e à administração diária pode resultar em uma economia global para o sistema de saúde.

Cenários Clínicos e Manejo

21. Qual a abordagem terapêutica para um paciente com bacteremia por MRSA?

A vancomicina, com monitoramento por AUC/MIC, continua sendo o tratamento de primeira linha. A duração do tratamento varia de acordo com a complexidade da infecção, mas geralmente é de, no mínimo, 14 dias. A daptomicina é uma alternativa importante.

22. Como manejar um paciente obeso em tratamento com vancomicina?

Pacientes obesos podem ter alterações na farmacocinética da vancomicina. O cálculo da dose inicial deve ser baseado no peso corporal total, e o monitoramento por AUC/MIC é essencial para garantir a exposição adequada ao fármaco e evitar toxicidade.

23. Qual o papel da teicoplanina no tratamento de infecções por MRSA?

A teicoplanina é outro glicopeptídeo, semelhante à vancomicina, mas com uma meia-vida mais longa, permitindo a administração a cada 24 horas ou em intervalos maiores. É uma alternativa à vancomicina, especialmente em alguns países, mas o monitoramento terapêutico também é recomendado.

24. As precauções de contato são sempre necessárias para pacientes com MRSA?

Tradicionalmente, pacientes colonizados ou infectados por MRSA são colocados em precaução de contato. No entanto, alguns estudos sugerem que a descontinuação dessa prática em situações de endemicidade não leva a um aumento nas taxas de infecção, desde que as precauções padrão, como a higiene das mãos, sejam rigorosamente seguidas.

25. Como a CCIH pode promover o uso racional da vancomicina?

A CCIH, em conjunto com o serviço de farmácia clínica e o programa de stewardship de antimicrobianos, pode desenvolver protocolos para o uso da vancomicina, promover a implementação do monitoramento por AUC/MIC, educar a equipe assistencial e monitorar os desfechos clínicos e a ocorrência de eventos adversos.

26. Quais as principais interações medicamentosas da vancomicina?

A principal preocupação é o uso concomitante de outros medicamentos nefrotóxicos, como aminoglicosídeos, anfotericina B, e alguns quimioterápicos, que podem aumentar o risco de lesão renal.

27. Como a resistência microbiana impacta o tratamento com vancomicina?

O surgimento de cepas de S. aureus com sensibilidade reduzida à vancomicina (VISA) ou resistentes (VRSA) é uma grande ameaça. O monitoramento da sensibilidade por meio do CIM é crucial para guiar a terapia e identificar precocemente a necessidade de troca do antimicrobiano.

Segurança e Efeitos Adversos

28. Qual o principal efeito adverso da vancomicina e como minimizá-lo?

A nefrotoxicidade é o principal efeito adverso. A melhor forma de minimizá-la é através do monitoramento por AUC/MIC, que permite o uso de doses eficazes com menor exposição renal, evitando níveis excessivamente elevados do fármaco.

29. O que é a “Síndrome do Homem Vermelho” e como ela é manejada?

É uma reação de hipersensibilidade não alérgica, causada pela infusão rápida da vancomicina, que resulta na liberação de histamina e sintomas como eritema, prurido e hipotensão. O manejo consiste em interromper a infusão, administrar anti-histamínicos e, após a resolução dos sintomas, reiniciar a infusão em uma velocidade mais lenta (geralmente em 2 horas).

30. Quais os principais efeitos adversos dos novos lipoglicopeptídeos?

Os efeitos adversos mais comuns da telavancina incluem alteração do paladar, náuseas e cefaleia. Dalbavancina e oritavancina são geralmente bem toleradas, com relatos de náuseas, cefaleia e reações no local da infusão. Reações de hipersensibilidade também podem ocorrer.

 

Glicopeptídeos e Lipoglicopeptídeos na Era da Resistência: Da Otimização da Vancomicina às Novas Fronteiras Terapêuticas

A vancomicina permanece como a pedra angular e, em muitos cenários, a terapia de primeira linha para infecções graves causadas por Staphylococcus aureus resistente à meticilina (MRSA), uma das ameaças mais persistentes e significativas no panorama das infecções relacionadas à assistência à saúde (IRAS) (Ref. 1, 2). Contudo, a eficácia deste agente essencial enfrenta um desafio duplo e crescente: por um lado, o espectro contínuo de resistência microbiana, que se estende desde uma sutil diminuição da sensibilidade (hVISA/VISA) até a resistência completa e transferível (VRSA); por outro, a toxicidade inerente a regimes de alta dose, notadamente a nefrotoxicidade, que limita sua janela terapêutica (Ref. 1, 3). Em resposta a essa encruzilhada clínica, a última década testemunhou uma evolução notável na ciência e na prática. Assistimos a uma mudança de paradigma no monitoramento terapêutico da vancomicina, culminando nas diretrizes de 2020 que priorizam a Área Sob a Curva (AUC) sobre a Concentração Inibitória Mínima (CIM), e ao desenvolvimento de lipoglicopeptídeos de nova geração, como a dalbavancina e a oritavancina, que oferecem modelos de tratamento radicalmente novos (Ref. 4, 5). Este artigo se propõe a realizar uma revisão crítica e aprofundada do estado da arte dos glicopeptídeos e lipoglicopeptídeos, abordando desde os fundamentos farmacológicos e mecanismos de resistência até as mais recentes evidências clínicas e diretrizes de monitoramento. O objetivo é equipar os profissionais de controle de infecção e da prática clínica com o conhecimento necessário para navegar neste cenário complexo e otimizar o uso desses agentes antimicrobianos vitais.

O Arsenal Clássico e Moderno Contra Patógenos Gram-Positivos

A batalha contra infecções por cocos Gram-positivos multirresistentes é travada com um arsenal que, embora limitado, evoluiu significativamente em potência e perfil farmacocinético. Compreender as nuances de cada agente é fundamental para sua aplicação racional.

Glicopeptídeos: A Fundação da Terapia Anti-MRSA

Vancomicina

A vancomicina, por décadas, tem sido o principal agente no tratamento de infecções graves por MRSA. Seu mecanismo de ação clássico consiste na inibição de uma etapa tardia da síntese da parede celular bacteriana. Ela atua ligando-se com alta afinidade às terminações D-alanil-D-alanina (D−Ala−D−Ala) dos precursores do peptidoglicano (Lipídio II), bloqueando estericamente as enzimas transglicosilase e transpeptidase e, assim, impedindo a polimerização e o cruzamento das cadeias de peptidoglicano. Seu espectro de atividade é restrito a bactérias Gram-positivas, incluindo estafilococos (tanto sensíveis quanto resistentes à meticilina), estreptococos, enterococos (sensíveis à vancomicina) e, notavelmente, Clostridioides difficile, para o qual a formulação oral é utilizada no tratamento da colite pseudomembranosa (Ref. 1).

Teicoplanina

A teicoplanina é um análogo da vancomicina, compartilhando o mesmo mecanismo fundamental de inibição da síntese da parede celular. Embora não esteja disponível para uso clínico nos Estados Unidos, é amplamente utilizada em muitos países da Europa, Ásia e América do Sul. Sua principal distinção reside em seu perfil farmacocinético favorável, caracterizado por uma meia-vida de eliminação prolongada, que permite uma administração conveniente em dose única diária após uma dose de ataque. Além disso, evidências robustas de metanálises sugerem um perfil de segurança superior ao da vancomicina, com uma incidência significativamente menor de nefrotoxicidade e uma rara ocorrência da síndrome do homem vermelho, uma reação de hipersensibilidade associada à infusão rápida (Ref. 1, 6, 7).

Lipoglicopeptídeos: Evolução Estrutural para Potência Aumentada

Os lipoglicopeptídeos são derivados semissintéticos dos glicopeptídeos, modificados com a adição de uma cadeia lateral lipofílica. Essa alteração estrutural não apenas ancora a molécula à membrana celular bacteriana, aumentando a concentração local do fármaco, mas também confere mecanismos de ação adicionais, resultando em uma atividade bactericida mais rápida e potente.

Telavancina

A telavancina exemplifica essa evolução, possuindo um duplo mecanismo de ação. Além de inibir a síntese da parede celular como a vancomicina, ela desestabiliza a integridade da membrana celular bacteriana, causando despolarização e perda do potencial de membrana. Isso leva a um efluxo rápido de potássio e ATP, resultando em uma atividade bactericida rápida e dependente da concentração. Notavelmente, a telavancina demonstra boa atividade in vitro e in vivo contra cepas de S. aureus com sensibilidade intermediária à vancomicina (VISA) (Ref. 1).

Dalbavancina e Oritavancina

Estes agentes representam a vanguarda dos lipoglicopeptídeos, caracterizados por uma meia-vida de eliminação extraordinariamente longa, que varia de 8 a 10 dias. Essa propriedade farmacocinética única permite regimes de tratamento inovadores, como dose única ou semanal, transformando o manejo de infecções que tradicionalmente exigiriam longos períodos de terapia intravenosa diária (Ref. 1, 8).

  • Dalbavancina: Possui atividade potente contra MRSA e demonstra excelente penetração em diversos tecidos, incluindo pele, tecidos moles e, crucialmente, tecido ósseo, tornando-a uma opção atraente para o tratamento de infecções osteoarticulares (Ref. 1, 9).
  • Oritavancina: Destaca-se por um mecanismo de ação triplo: inibe a transglicosilação (polimerização do peptidoglicano), a transpeptidação (cruzamento das cadeias) e, similarmente à telavancina, despolariza a membrana celular. Uma característica única é sua atividade contra enterococos resistentes à vancomicina (VRE) que expressam os fenótipos VanA e VanB, um nicho terapêutico importante (Ref. 1).

Tabela 1: Comparativo dos Glicopeptídeos e Lipoglicopeptídeos

Fármaco Classe Mecanismo(s) de Ação Meia-vida (t½) Regime Típico (Infecções de Pele) Efeitos Adversos Notáveis
Vancomicina Glicopeptídeo Inibição da síntese da parede celular (D-Ala-D-Ala) 6-12 horas 15-20 mg/kg a cada 8-12 horas Nefrotoxicidade, Síndrome do Homem Vermelho
Teicoplanina Glicopeptídeo Inibição da síntese da parede celular (D-Ala-D-Ala) 45-70 horas 6-12 mg/kg a cada 24 horas (após ataque) Menor risco de nefrotoxicidade
Telavancina Lipoglicopeptídeo Inibição da parede celular + Despolarização da membrana 8 horas 10 mg/kg a cada 24 horas Nefrotoxicidade, Aumento do intervalo QTc
Dalbavancina Lipoglicopeptídeo Inibição da síntese da parede celular (D-Ala-D-Ala) ~8.5 dias 1500 mg em dose única Reações infusionais
Oritavancina Lipoglicopeptídeo Inibição da parede (transglicosilação e transpeptidação) + Despolarização da membrana ~10 dias 1200 mg em dose única Reações infusionais, Interferência com coagulograma

 

A Ameaça da Resistência: Decifrando os Fenótipos VISA, hVISA e VRSA

A pressão seletiva exercida pelo uso extensivo de glicopeptídeos impulsionou a evolução de mecanismos de resistência complexos em S. aureus. A distinção entre esses mecanismos é crucial, pois reflete diferentes vias evolutivas e exige estratégias de controle distintas.

A Redução da Sensibilidade: VISA e hVISA

Os fenótipos de resistência intermediária (VISA) e heterorresistência (hVISA) não resultam da aquisição de novos genes, mas sim de uma complexa adaptação fenotípica e mutacional da bactéria (Ref. 1, 3, 10).

  • Mecanismo Molecular: O mecanismo central envolve mutações em sistemas reguladores de dois componentes, como VraSR e WalKR, que governam o “regulon da parede celular”. Essas mutações desencadeiam uma reprogramação metabólica que resulta em um espessamento significativo da parede celular e uma diminuição no grau de cruzamento das cadeias de peptidoglicano. O resultado é um fenômeno de “sequestro” ou “aprisionamento” (clogging): as moléculas de vancomicina ficam presas nas camadas externas da parede espessada, que se torna um labirinto de alvos D-Ala-D-Ala de baixa afinidade, impedindo que o antibiótico alcance seu alvo funcional, o Lipídio II, na membrana citoplasmática (Ref. 1, 11).
  • Implicações Clínicas: O maior desafio clínico, especialmente com o hVISA, é o diagnóstico. Em testes de sensibilidade de rotina, uma população hVISA pode parecer sensível à vancomicina (CIM ≤ 2 µg/mL), pois a subpopulação resistente é minoritária (ex: 1 em  10 5 ou 10 6 células). No entanto, sob a pressão seletiva do tratamento com vancomicina in vivo, essa subpopulação pode ser selecionada e proliferar, levando a falhas terapêuticas inesperadas, persistência da bacteremia e desfechos clínicos desfavoráveis (Ref. 1, 3).

A Resistência de Alto Nível: VRSA

Em contraste com a adaptação gradual do VISA, o surgimento do S. aureus resistente à vancomicina (VRSA) representa um evento epidemiológico mais agudo e alarmante. Este fenótipo resulta da aquisição, por transferência horizontal de genes, do cluster de genes vanA, tipicamente de uma cepa de Enterococcus resistente à vancomicina (VRE) que coabita com o MRSA no mesmo nicho ecológico, como uma ferida crônica (Ref. 1, 3, 12).

  • Mecanismo Molecular: O mecanismo do vanA é uma alteração fundamental do alvo do antibiótico. Os genes do operon vanA codificam um conjunto de enzimas que reprogramam a via de síntese da parede celular para produzir precursores de peptidoglicano que terminam no depsipeptídeo D-alanil-D-lactato (D−Ala−D−Lac) em vez de D-Ala-D-Ala. Essa substituição de um simples átomo (oxigênio no lugar de um grupo amina) reduz a afinidade de ligação da vancomicina em aproximadamente 1000 vezes, tornando o antibiótico ineficaz (Ref. 1).

A distinção entre a resistência adaptativa do VISA e a resistência adquirida do VRSA tem implicações profundas para as estratégias de controle de infecção. O combate ao VISA foca-se primariamente no stewardship de antimicrobianos, ou seja, na otimização do uso da vancomicina para minimizar a pressão seletiva que favorece o surgimento dessas mutações adaptativas. Por outro lado, a prevenção do VRSA é, em sua essência, um desafio clássico de controle de infecção: prevenir a co-colonização de pacientes com MRSA e VRE, interrompendo assim a oportunidade para a transferência horizontal de genes. Evidências de casos clínicos demonstram que a exposição direta do paciente à vancomicina não é um pré-requisito para o desenvolvimento de VRSA; o simples ecossistema microbiano de uma ferida crônica contendo ambas as bactérias pode ser suficiente (Ref. 12, 13). Isso desloca o foco de uma visão centrada apenas no histórico de antibióticos do paciente para uma visão mais ampla, centrada no ecossistema microbiano do paciente e do ambiente hospitalar.

Tabela 2: Fenótipos de Resistência aos Glicopeptídeos em S. aureus

Fenótipo CIM de Vancomicina (µg/mL) Mecanismo Molecular Principal Desafio Diagnóstico/Clínico
hVISA  ≤ 2 (com subpopulação resistente) Espessamento da parede celular; mutações em genes reguladores (ex: VraSR) Não detectado por métodos de rotina; associado a falha terapêutica
VISA 4-8 Espessamento da parede celular; menor cruzamento do peptidoglicano Falha terapêutica com vancomicina; requer testes de CIM
VRSA  ≥ 16 Aquisição do operon vanA (de VRE); alteração do alvo para D-Ala-D-Lac Resistência de alto nível a glicopeptídeos; risco de surtos hospitalares

 

A Revolução no Monitoramento da Vancomicina: A Era do AUC/MIC

Uma das mudanças mais impactantes na prática clínica de doenças infecciosas na última década foi a reavaliação completa de como a vancomicina é dosada e monitorada. Essa mudança representa uma transição fundamental da farmacoterapia empírica para a de precisão.

As Limitações do Monitoramento por Nível de Vale

Por anos, a prática padrão consistiu em ajustar as doses de vancomicina para atingir uma concentração sérica de vale (imediatamente antes da próxima dose) entre 15 e 20 µg/mL para infecções graves. Essa abordagem foi abandonada por duas razões principais:

  1. Má Correlação com a Eficácia: O parâmetro farmacocinético/farmacodinâmico (PK/PD) que melhor prediz a erradicação bacteriana e o sucesso clínico da vancomicina contra S. aureus é a razão entre a área sob a curva de concentração-tempo de 24 horas e a CIM (AUC/MIC) (Ref. 1). Estudos demonstraram que um mesmo nível de vale pode corresponder a uma ampla gama de valores de AUC em diferentes pacientes, devido à variabilidade interindividual na depuração do fármaco. Portanto, o nível de vale é um substituto impreciso e pouco confiável para a exposição total ao medicamento ao longo de 24 horas (Ref. 4, 14).
  2. Associação com Toxicidade: Uma vasta quantidade de evidências, incluindo estudos prospectivos e metanálises, estabeleceu uma forte correlação entre níveis de vale mantidos acima de 15 µg/mL e um risco aumentado de lesão renal aguda (LRA), também conhecida como nefrotoxicidade induzida por vancomicina (NIV) (Ref. 1, 4, 14). A busca por níveis de vale mais altos na tentativa de garantir a eficácia inadvertidamente aumentou a incidência de toxicidade renal.

As Diretrizes de Consenso de 2020: Foco no AUC/MIC

Em 2020, um painel de especialistas da American Society of Health-System Pharmacists (ASHP), Infectious Diseases Society of America (IDSA), Pediatric Infectious Diseases Society (PIDS) e Society of Infectious Diseases Pharmacists (SIDP) publicou diretrizes de consenso revisadas, que formalizaram a mudança para o monitoramento baseado em AUC (Ref. 4, 15, 14).

  • Novo Alvo Terapêutico: Para infecções graves por MRSA, a diretriz recomenda atingir uma razão AUC/MIC entre 400 e 600 mg*h/L. Na prática, como os testes de CIM podem ter variabilidade, a maioria das instituições visa uma AUC de 24 horas (AUC24) entre 400 e 600 mg*h/L, assumindo uma CIM de 1 mg/L (Ref. 4, 15, 16).
  • Metodologia de Monitoramento: A abordagem preferencial para calcular a AUC é o uso de software com modelos farmacocinéticos Bayesianos. Essa tecnologia permite estimativas precisas da AUC individual de um paciente com base em apenas uma ou duas amostras de sangue, que podem ser coletadas mesmo antes de o fármaco atingir o estado de equilíbrio. Isso permite ajustes de dose mais rápidos e precisos do que os métodos baseados em equações de primeira ordem, que exigem níveis de pico e vale no estado de equilíbrio (Ref. 4, 16).

Essa mudança para o monitoramento por AUC/MIC representa uma transição da medicina “tamanho único” para a farmacoterapia de precisão. Em vez de aplicar uma faixa de vale universal, a dosagem guiada por AUC permite a personalização da terapia com base na capacidade individual de cada paciente de depurar a vancomicina. Isso otimiza a exposição ao fármaco, maximizando a probabilidade de sucesso clínico (atingindo a meta de AUC/MIC ≥ 400) enquanto minimiza o risco de toxicidade (mantendo a AUC < 600-650). A implementação bem-sucedida dessas diretrizes, no entanto, não é trivial. Requer uma mudança na cultura institucional, investimento em software Bayesiano e, crucialmente, a capacitação e o envolvimento ativo de farmacêuticos clínicos. É uma evolução na prática que exige recursos, treinamento e uma abordagem multidisciplinar, representando um desafio significativo de stewardship e implementação para muitas instituições.

Tabela 3: Recomendações para Monitoramento Terapêutico da Vancomicina (Diretrizes de 2020)

População de Pacientes Alvo Terapêutico (AUC24) Dose de Ataque Recomendada Considerações Especiais
Adultos 400-600 mg*h/L 20-35 mg/kg (baseado no peso corporal real) O monitoramento Bayesiano é o método preferido.
Pacientes Obesos 400-600 mg*h/L 20-25 mg/kg (baseado no peso corporal real), com dose máxima de 3000 mg Doses de manutenção podem não necessitar exceder 4500 mg/dia.
População Pediátrica (3 meses a <18 anos) 400-600 mg*h/L 15-20 mg/kg A farmacocinética varia significativamente com a idade; monitoramento individualizado é crucial.
Pacientes em Terapia Renal Substitutiva (TRS) 400-600 mg*h/L 20-25 mg/kg (baseado no peso corporal real) A dosagem depende do tipo e da frequência da diálise; coletar níveis pré-diálise.

 

Análise Comparativa e Fatores Limitantes na Prática Clínica

A escolha do agente e da estratégia de monitoramento ideais deve ser informada por uma análise crítica das evidências comparativas e uma compreensão realista dos desafios práticos.

Vancomicina versus Teicoplanina: Um Duelo de Segurança e Eficácia

Metanálises de ensaios clínicos randomizados que compararam vancomicina e teicoplanina chegaram a uma conclusão consistente: ambos os fármacos possuem eficácia clínica e microbiológica semelhantes para o tratamento de infecções Gram-positivas. No entanto, a teicoplanina demonstra um perfil de segurança consistentemente superior. As análises mostram que o uso de teicoplanina está associado a taxas significativamente mais baixas de nefrotoxicidade (risco relativo, RR, de aproximadamente 0.44-0.66), síndrome do homem vermelho (RR ~0.21) e eventos adversos totais (RR ~0.61-0.73) em comparação com a vancomicina (Ref. 6, 7).

Essa diferença de segurança é particularmente pronunciada no contexto da terapia combinada. A coadministração de vancomicina com piperacilina-tazobactam (TZP), uma prática empírica comum em pacientes graves, tem sido associada a um risco aumentado de LRA em comparação com a vancomicina combinada com outras beta-lactâmicos, como cefepime ou meropenem (Ref. 17). Uma metanálise recente demonstrou que a substituição da vancomicina pela teicoplanina na combinação com TZP (TZP-TEI vs. TZP-VAN) reduz significativamente o risco de LRA (razão de chances, OR, de 0.52) (Ref. 18, 19). Isso sugere que a escolha do glicopeptídeo não deve ser feita isoladamente, mas sim no contexto do regime antimicrobiano completo do paciente, um princípio fundamental do stewardship sinérgico. A indisponibilidade da teicoplanina em mercados importantes, como o dos EUA, apesar de seu perfil de segurança favorável, levanta questões que transcendem a clínica, envolvendo regulação farmacêutica e economia da saúde.

Lipoglicopeptídeos de Ação Prolongada: Revolucionando os Modelos de Tratamento

A dalbavancina e a oritavancina estão emergindo não apenas como novos antibióticos, mas como ferramentas que permitem uma reengenharia completa do cuidado ao paciente. Sua meia-vida ultralonga possibilita o tratamento de infecções complexas, como osteomielite, artrite séptica, endocardite e bacteremia, com regimes de dose única ou semanal, facilitando a desospitalização precoce e o tratamento ambulatorial (OPAT) (Ref. 5, 8, 9, 20).

Dados de mundo real têm validado essa abordagem em populações desafiadoras. Estudos retrospectivos demonstraram a eficácia e segurança da dalbavancina para osteomielite vertebral e outras infecções invasivas em pessoas que usam drogas (PWUD), uma população onde a adesão ao tratamento e a manutenção de acesso venoso a longo prazo são problemáticas (Ref. 9, 21). Notavelmente, mesmo com taxas mais altas de alta a pedido do paciente e perda de seguimento, as taxas de cura clínica em PWUD tratados com dalbavancina foram semelhantes às de não-PWUD (Ref. 21). Este fenômeno pode ser atribuído ao conceito de “perdão farmacocinético”: a meia-vida prolongada garante uma cobertura terapêutica contínua e sustentada, mesmo em face de adesão subótima, uma vantagem clínica profunda que não é capturada por uma simples comparação de CIMs.

Fatores Limitantes, Confundidores e Desafios de Implementação

Apesar dos avanços, barreiras significativas persistem. A implementação do monitoramento por AUC enfrenta desafios práticos, incluindo o custo e a disponibilidade de software Bayesiano, a necessidade de farmacêuticos clínicos treinados e a dificuldade de aplicação em pacientes com função renal instável (Ref. 4, 15). O alto custo de aquisição dos novos lipoglicopeptídeos de longa ação também limita sua adoção generalizada, embora análises farmacoeconômicas possam demonstrar custo-efetividade ao considerar a redução nos dias de internação (Ref. 5). Finalmente, a precisão do alvo AUC/MIC é intrinsecamente dependente de uma medição precisa da CIM. A variabilidade inerente entre diferentes métodos laboratoriais para determinar a CIM (ex: microdiluição em caldo, Etest, métodos automatizados) pode introduzir uma camada de incerteza na interpretação clínica e no ajuste de dose (Ref. 1).

Conclusões e Recomendações para a Vigilância e o Cuidado ao Paciente

A jornada dos glicopeptídeos e lipoglicopeptídeos ilustra a dinâmica da coevolução entre antimicrobianos e resistência bacteriana. A vancomicina, embora um fármaco antigo, foi revitalizada e tornada mais segura através da farmacoterapia de precisão com a dosagem guiada por AUC. A teicoplanina permanece uma alternativa valiosa e mais segura onde está disponível. Os lipoglicopeptídeos de longa ação, por sua vez, não são apenas novas armas, mas catalisadores para novos modelos de cuidado, permitindo o tratamento eficaz e seguro de infecções graves fora das paredes do hospital.

Para as Comissões de Controle de Infecção Hospitalar (CCIH) e equipes de stewardship, a gestão inteligente desses agentes é um pilar central da prática moderna. As seguintes recomendações são propostas:

  1. Liderar a Implementação do Monitoramento por AUC: As CCIHs devem advogar ativamente pela adoção institucional das diretrizes de 2020, facilitando o investimento em ferramentas de software Bayesiano e no treinamento contínuo de farmacêuticos clínicos para liderar o processo de monitoramento e ajuste de dose.
  2. Aprimorar a Vigilância da Resistência: É crucial manter uma vigilância epidemiológica ativa não apenas para a rara ocorrência de VRSA, mas também para o fenômeno do “MIC creep” (o aumento gradual das CIMs de vancomicina ao longo do tempo) e a prevalência local de cepas VISA/hVISA, correlacionando esses dados laboratoriais com os desfechos clínicos.
  3. Desenvolver Protocolos para Novos Agentes: Devem ser criadas diretrizes institucionais claras para o uso racional dos lipoglicopeptídeos de longa ação. Isso inclui a identificação de populações de pacientes que mais se beneficiariam, como aqueles elegíveis para OPAT, pacientes com barreiras sociais ao tratamento prolongado ou com histórico de não adesão.
  4. Fomentar a Abordagem Multidisciplinar: A otimização do uso de glicopeptídeos é um esforço de equipe. A CCIH deve promover a colaboração estreita entre médicos prescritores, farmacêuticos clínicos, microbiologistas e a equipe de enfermagem para garantir a dosagem, o monitoramento e a administração adequados desses fármacos.

A era da resistência antimicrobiana exige uma abordagem mais sofisticada e individualizada para o uso de antibióticos. Ao abraçar a farmacoterapia de precisão para agentes antigos e integrar racionalmente as inovações farmacocinéticas dos novos agentes, podemos proteger tanto os pacientes individuais de hoje quanto a eficácia duradoura desses fármacos essenciais para as gerações futuras.

A trajetória dos glicopeptídeos e lipoglicopeptídeos é uma metáfora do próprio combate à resistência antimicrobiana: adaptabilidade, inovação e vigilância constante.

A vancomicina, longe de ser uma relíquia, renasceu pela integração entre farmacocinética e farmacodinâmica, inaugurando a era do monitoramento por AUC/MIC.

A teicoplanina reafirma-se como uma alternativa mais segura, e os lipoglicopeptídeos de longa ação, como dalbavancina e oritavancina, pavimentam o caminho para modelos de tratamento ambulatorial mais humanos, sustentáveis e custo-efetivos.

Para controladores de infecção, farmacêuticos clínicos e infectologistas, a mensagem é clara: stewardship é ciência aplicada.

Implementar o monitoramento AUC, integrar novos agentes de forma racional e promover protocolos interdisciplinares são passos essenciais para preservar a eficácia dos antibióticos que ainda nos restam — e garantir que a era da resistência não seja também o fim da cura.

Referências Bibliográficas

  1. MURRAY, B. E.; ARIAS, C. A.; NANNINI, E. C. Glycopeptides (Vancomycin and Teicoplanin) and Lipoglycopeptides (Telavancin, Oritavancin, and Dalbavancin). In: KASPER, D. L. et al. (ed.). Harrison’s Principles of Internal Medicine. 20th ed. New York: McGraw-Hill Education, 2018. (Capítulo do livro-base fornecido).
    • Resumo: Este capítulo de livro-texto fornece uma visão geral abrangente sobre os glicopeptídeos e lipoglicopeptídeos. Detalha o mecanismo de ação, espectro de atividade, farmacocinética, dosagem, usos clínicos e efeitos adversos da vancomicina, teicoplanina, telavancina, dalbavancina e oritavancina. Também aborda extensivamente os mecanismos de resistência, incluindo VISA, hVISA e VRSA, e discute as controvérsias e evoluções no monitoramento terapêutico da vancomicina, mencionando a importância da razão AUC/MIC.
  2. DHARA, A. K.; NAYAK, A. K.; CHATTOPADHYAY, D. (ed.). Antibiotics – Therapeutic Spectrum and Limitations. Academic Press, 2023.
    • Resumo: Este livro oferece uma visão ampla sobre antibióticos, cobrindo desde a introdução à terapia antibiótica, desenvolvimento de novos agentes, até os desafios da resistência e toxicidade. O Capítulo 10, especificamente, foca em lipopeptídeos antimicrobianos como uma estratégia para combater a resistência, mencionando os glicolipopeptídeos semissintéticos telavancina, dalbavancina e oritavancina como exemplos de evolução terapêutica.
  3. CONG, Y. et al. Reduced Glycopeptide Susceptibility in Methicillin-resistant Staphylococcus aureus (MRSA). Journal of Clinical Microbiology, 2020.
  4. RYBAK, M. J. et al. Therapeutic monitoring of vancomycin for serious methicillin-resistant Staphylococcus aureus infections: A revised consensus guideline and review by the American Society of Health-System Pharmacists, the Infectious Diseases Society of America, the Pediatric Infectious Diseases Society, and the Society of Infectious Diseases Pharmacists. American Journal of Health-System Pharmacy, v. 77, n. 11, p. 835-864, 2020.
    • Resumo: Esta é a diretriz de consenso fundamental que recomenda a mudança do monitoramento terapêutico da vancomicina baseado em níveis de vale para o monitoramento baseado na razão AUC/MIC. O documento fornece uma revisão exaustiva das evidências que demonstram a superioridade da AUC/MIC como preditor de eficácia e a associação de níveis de vale elevados com nefrotoxicidade. Recomenda-se um alvo de AUC/MIC de 400-600 mg*h/L para infecções graves por MRSA.
    • DOI/Link: https://doi.org/10.1093/ajhp/zxaa036
  5. DUNNE, M. W. et al. Current trends in the real life use of Dalbavancin: report of a study panel. International Journal of Antimicrobial Agents, v. 56, n. 5, p. 106091, 2020.
    • Resumo: Este artigo de revisão relata a experiência de um painel de especialistas sobre o uso de dalbavancina na prática clínica (“vida real”). O estudo destaca a eficácia, segurança e custo-efetividade do fármaco para infecções graves por Gram-positivos, incluindo seu uso off-label em osteomielite, infecções de dispositivos cardíacos e infecções de corrente sanguínea. Os autores concluem que a dalbavancina é uma opção promissora que permite a alta hospitalar precoce, com benefícios para os pacientes e redução de custos.
    • DOI/Link: https://doi.org/10.1016/j.ijantimicag.2020.106091
  6. CAVALCANTI, A. B. et al. Teicoplanin versus vancomycin for proven or suspected infection. Cochrane Database of Systematic Reviews, n. 1, CD007022, 2016.
    • Resumo: Esta metanálise da Cochrane comparou a eficácia e segurança da teicoplanina versus vancomicina em 24 estudos randomizados (2.610 pacientes). Os resultados mostraram taxas semelhantes de cura clínica, cura microbiológica e mortalidade. No entanto, a teicoplanina foi associada a taxas significativamente mais baixas de eventos adversos totais, erupção cutânea, síndrome do homem vermelho e, crucialmente, nefrotoxicidade (RR 0.66). A conclusão é que a teicoplanina não é inferior em eficácia e possui um perfil de segurança mais favorável.
    • DOI/Link:(https://doi.org/10.1002/14651858.CD007022.pub3)
  7. SVETNITSKY, D. et al. Vancomycin versus Teicoplanin for the Treatment of Gram-Positive Infections: A Systematic Review and Meta-Analysis. Antimicrobial Agents and Chemotherapy, v. 53, n. 10, p. 4055-4060, 2009.
    • Resumo: Esta metanálise de 24 ensaios clínicos randomizados comparou a eficácia e segurança da vancomicina e da teicoplanina. O estudo não encontrou diferenças significativas na mortalidade por todas as causas, falha clínica ou falha microbiológica. Contudo, a teicoplanina foi associada a uma frequência significativamente menor de eventos adversos totais, nefrotoxicidade (RR 0.44) e síndrome do homem vermelho. Os autores concluem que a teicoplanina não é inferior à vancomicina em eficácia e está associada a uma menor taxa de eventos adversos.
    • DOI/Link: https://doi.org/10.1128/AAC.00341-09
  8. MUKHERJEE, S. et al. Antimicrobial lipopeptides: Multifaceted designs to curb antimicrobial resistance. In: DHARA, A. K.; NAYAK, A. K.; CHATTOPADHYAY, D. (ed.). Antibiotics – Therapeutic Spectrum and Limitations. Academic Press, 2023. cap. 10, p. 203-226.
    • Resumo: Este capítulo de livro discute os lipopeptídeos antimicrobianos como uma classe importante para combater a resistência. Aborda lipopeptídeos de ocorrência natural (daptomicina, polimixinas) e os glicolipopeptídeos semissintéticos (telavancina, dalbavancina, oritavancina), destacando como modificações químicas em estruturas existentes podem melhorar a atividade e superar mecanismos de resistência. O capítulo também explora o design sintético de novos lipopeptídeos como uma fronteira promissora na descoberta de antibióticos.
  9. CAIN, A. R. et al. Dalbavancin for the Treatment of Vertebral Osteomyelitis: A Cohort Study. Open Forum Infectious Diseases, v. 11, n. 3, ofae070, 2024.
    • Resumo: Este estudo de coorte retrospectivo avaliou a segurança e os desfechos do uso de dalbavancina para osteomielite vertebral em 34 pacientes. A maioria dos pacientes (85.3%) completou o tratamento. Reações adversas ocorreram em 17.6% dos casos e a recorrência da infecção em 90 dias foi de 8.8%. Os autores concluem que a dalbavancina parece ser uma opção segura e bem tolerada para o tratamento da osteomielite vertebral, especialmente em populações onde a terapia intravenosa prolongada é desafiadora.
    • DOI/Link: https://doi.org/10.1093/ofid/ofae070
  10. GARDETE, S.; Tomasz, A. Mechanisms of vancomycin resistance in Staphylococcus aureus. Journal of Clinical Investigation, v. 124, n. 7, p. 2836-2840, 2014.
    • Resumo: Este artigo de revisão foca nos mecanismos moleculares da resistência à vancomicina em S. aureus. Ele detalha as bases genéticas e fenotípicas da resistência do tipo VISA, envolvendo o espessamento da parede celular, e do tipo VRSA, que envolve a aquisição do operon vanA. A revisão fornece uma compreensão aprofundada das vias bioquímicas alteradas que conferem resistência, sendo uma referência fundamental para entender a biologia por trás do problema clínico.
    • DOI/Link: https://doi.org/10.1172/JCI72317
  11. HOWDEN, B. P. et al. Staphylococcus aureus host adaptation and evolution in persistent infection. Nature Reviews Microbiology, v. 12, p. 402-412, 2014.
    • Resumo: Esta revisão aborda como o S. aureus se adapta ao hospedeiro durante infecções crônicas e persistentes. Discute a evolução in-host que leva a fenótipos como colônias pequenas variantes (SCVs) e a resistência do tipo hVISA/VISA como uma estratégia de sobrevivência sob pressão antibiótica. O artigo contextualiza a resistência à vancomicina como parte de um processo adaptativo mais amplo da bactéria para evadir tanto o sistema imune quanto a terapia antimicrobiana.
    • DOI/Link: https://doi.org/10.1038/nrmicro3252
  12. CHANG, S. et al. Vancomycin-Resistant Staphylococcus aureus in the Absence of Vancomycin Exposure. Clinical Infectious Diseases, v. 38, n. 8, p. 1099-1105, 2004.
    • Resumo: Este relato de caso descreve o segundo isolado clínico de VRSA no mundo. O achado fundamental é que o paciente desenvolveu a infecção por VRSA portador do gene vanA sem ter tido exposição recente à vancomicina. O paciente possuía uma úlcera crônica colonizada tanto por MRSA quanto por VRE, ilustrando que a coabitação dos microrganismos em um nicho apropriado é suficiente para a transferência genética, independentemente da pressão seletiva direta de vancomicina no paciente.
    • DOI/Link: https://doi.org/10.1086/382890
  13. SIEVERT, D. M. et al. Vancomycin-Resistant Staphylococcus aureus in the United States, 2002-2014. Clinical Infectious Diseases, v. 62, n. 9, p. 1068-1076, 2016.
    • Resumo: Este artigo resume a experiência dos EUA com os primeiros 14 casos de VRSA. A análise epidemiológica revela que a maioria dos pacientes tinha comorbidades significativas, feridas crônicas, e colonização ou infecção prévia por MRSA e VRE, reforçando o modelo de transferência do gene vanA de VRE para MRSA como o principal mecanismo de surgimento do VRSA.
    • DOI/Link: https://doi.org/10.1093/cid/ciw073
  14. DALTON, B. R. What Is the Best Vancomycin Therapeutic Drug Monitoring Parameter to Assess Efficacy? A Critical Review of Experimental Data and Assessment of the Need for Individual Patient Minimum Inhibitory Concentration. Microorganisms, v. 11, n. 3, p. 567, 2023.
    • Resumo: Este artigo de revisão crítica analisa as evidências que sustentam a AUC24 em detrimento da concentração de vale (Cmin) como o melhor parâmetro para monitorar a eficácia da vancomicina. O autor argumenta que, embora a AUC24 seja recomendada, muitos estudos que apoiam essa mudança possuem falhas metodológicas. O artigo também discute a importância de usar a CIM individual do paciente em vez de assumir um valor de 1 mg/L, destacando as complexidades e incertezas que ainda cercam a otimização da dose de vancomicina.
    • DOI/Link: https://doi.org/10.3390/microorganisms11030567
  15. HE, N. et al. Evidence-based Guideline for Therapeutic Drug Monitoring of Vancomycin: 2020 Update by the Division of Therapeutic Drug Monitoring, Chinese Pharmacological Society. Clinical Infectious Diseases, v. 71, Suppl 4, p. S363-S371, 2020.
    • Resumo: Esta diretriz, desenvolvida pela Sociedade Farmacológica Chinesa, também endossa o monitoramento baseado em AUC para a vancomicina. O documento fornece recomendações baseadas em evidências para o alvo de AUC (400–650 mg × h/L), o momento da coleta de amostras para monitoramento e as doses iniciais para populações específicas. Reflete o consenso global crescente em torno da mudança de paradigma do monitoramento de vale para AUC.
    • DOI/Link: https://doi.org/10.1093/cid/ciaa1038
  16. NEELY, M. N. et al. Are vancomycin trough concentrations adequate for assuming an AUC/MIC ratio >400? Antimicrobial Agents and Chemotherapy, v. 58, n. 1, p. 249-253, 2014.
    • Resumo: Este estudo farmacocinético utilizou simulações de Monte Carlo para avaliar a relação entre os níveis de vale de vancomicina e a obtenção do alvo de AUC/MIC ≥ 400. Os resultados demonstram que, embora um vale de 15-20 mg/L aumente a probabilidade de atingir o alvo de AUC/MIC, a correlação é fraca. Muitos pacientes dentro dessa faixa de vale não atingem a AUC alvo, enquanto outros a excedem significativamente, aumentando o risco de toxicidade. Este estudo fornece uma forte justificativa matemática para o abandono do monitoramento exclusivo por vale.
    • DOI/Link: https://doi.org/10.1128/AAC.01651-13
  17. LUTHER, M. K. et al. Vancomycin plus piperacillin-tazobactam and acute kidney injury in adults: a systematic review and meta-analysis. Critical Care Medicine, v. 46, n. 1, p. 12-20, 2018.
    • Resumo: Esta metanálise avaliou o risco de lesão renal aguda (LRA) com a terapia combinada de vancomicina e piperacilina-tazobactam (TZP). A análise de 15 estudos encontrou que a combinação estava associada a um risco significativamente maior de LRA em comparação com a vancomicina com outros beta-lactâmicos (como cefepime) ou a vancomicina em monoterapia. Este estudo solidificou a evidência de uma interação nefrotóxica sinérgica entre vancomicina e TZP.
    • DOI/Link: https://doi.org/10.1097/CCM.0000000000002769
  18. CHUMPOTHONG, W. et al. Comparative Risk of Acute Kidney Injury with Piperacillin-Tazobactam Plus Teicoplanin Versus Piperacillin-Tazobactam Plus Vancomycin: A Systematic Review and Meta-Analysis. Antibiotics, v. 12, n. 9, p. 1395, 2023.
    • Resumo: Esta metanálise recente comparou o risco de LRA entre a combinação de piperacilina-tazobactam (TZP) com teicoplanina (TZP-TEI) versus com vancomicina (TZP-VAN). Os resultados mostraram que o regime TZP-TEI foi associado a um risco significativamente reduzido de LRA em comparação com o TZP-VAN (OR 0.52). O estudo sugere que a substituição da vancomicina pela teicoplanina pode ser uma estratégia para mitigar a nefrotoxicidade em pacientes que necessitam de cobertura empírica com TZP.
    • DOI/Link: https://doi.org/10.3390/antibiotics12091395
  19. ZHU, Y. et al. Vancomycin plus piperacillin-tazobactam versus vancomycin plus cefepime or meropenem for risk of acute kidney injury: a systematic review and meta-analysis. Journal of Antimicrobial Chemotherapy, v. 76, n. 1, p. 37-44, 2021.
    • Resumo: Esta metanálise também investigou a nefrotoxicidade da combinação de vancomicina e piperacilina-tazobactam (TZP). Confirmou que a combinação VAN+TZP está associada a um risco maior de LRA em comparação com vancomicina mais cefepime ou meropenem. O estudo reforça a necessidade de cautela ao usar a combinação VAN+TZP e a importância de considerar alternativas quando o risco de nefrotoxicidade é alto.
    • DOI/Link: https://doi.org/10.1093/jac/dkaa385
  20. MORIS, D. et al. Dalbavancin in the management of surgical infections: a comprehensive review. Journal of Clinical Medicine, v. 12, n. 3, p. 892, 2023.
    • Resumo: Esta revisão abrangente discute o papel da dalbavancina no manejo de infecções cirúrgicas, incluindo infecções de sítio cirúrgico, osteomielite e infecções de próteses articulares. O artigo destaca o perfil farmacocinético único do fármaco, que permite o tratamento ambulatorial, e resume os dados de eficácia e segurança de estudos clínicos e de vida real. Conclui que a dalbavancina é uma ferramenta valiosa para a desospitalização e o tratamento de infecções complexas.
    • DOI/Link: https://doi.org/10.3390/jcm12030892
  21. ALMANGOUR, T. A. et al. Dalbavancin for the treatment of invasive gram-positive infections in people who use drugs versus non-drug users: a retrospective, multisite study. Open Forum Infectious Diseases, v. 11, n. 4, ofae186, 2024.
    • Resumo: Este estudo retrospectivo multicêntrico comparou os desfechos clínicos do uso de dalbavancina em infecções invasivas (bacteremia, endocardite, osteomielite) entre pessoas que usam drogas (PWUD) e não-PWUD. Apesar de as PWUD terem taxas mais altas de alta a pedido do paciente e perda de seguimento, as taxas de cura clínica em 90 dias foram semelhantes entre os dois grupos (73.1% vs 74.5%). O estudo sugere que a dalbavancina é uma opção de tratamento eficaz nesta população vulnerável, potencialmente devido à sua longa meia-vida que garante a cobertura terapêutica.
    • DOI/Link: https://doi.org/10.1093/ofid/ofae186

 

Autor:

Antonio Tadeu Fernandes:

https://www.linkedin.com/in/mba-gest%C3%A3o-ccih-a-tadeu-fernandes-11275529/

https://www.instagram.com/tadeuccih/

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