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Desvendando a rede oculta: transmissão de multi-R entre Hospitais e Instituições de Longa Permanência revelada por análise molecular

Panrresistência; mecanismos de transmissão

O que podemos fazer para controlar a transmissão de Multi-R entre hospitais e instituições de longa permanência.

Observação: para fluidez da leitura incluímos no final todas as siglas utilizadas neste artigo.

Introdução: O Desafio Global da Resistência Antimicrobiana e a Relevância da Transmissão Interinstitucional

A resistência antimicrobiana (AMR) emerge como uma das mais graves e complexas ameaças à saúde pública global no século XXI, com projeções alarmantes de morbidade e mortalidade. Estimativas recentes indicam que infecções bacterianas resistentes são diretamente responsáveis por aproximadamente 1,27 milhão de óbitos anualmente em todo o mundo.1 Este cenário crítico exige uma compreensão cada vez mais sofisticada e multifacetada dos mecanismos de disseminação de microrganismos multirresistentes (MDROs) e de

Clostridioides difficile (C. difficile), um patógeno notório por seu impacto significativo em ambientes de assistência à saúde.

As Infecções Relacionadas à Assistência à Saúde (IRAS) impõem um fardo substancial aos sistemas de saúde, manifestando-se não apenas em termos de aumento da morbidade e mortalidade dos pacientes, mas também por elevar consideravelmente os custos de tratamento e a duração das internações hospitalares.2 A complexidade inerente à transmissão de MDROs e C difficile transcende as fronteiras de uma única instituição, estendendo-se por uma intrincada rede de assistência, que abrange desde hospitais de cuidados agudos até instituições de longa permanência (ILPIs) e a própria comunidade. A compreensão dessa dinâmica interinstitucional é fundamental para o desenvolvimento de estratégias de controle verdadeiramente eficazes.

Esta sinose comentada se dedica à análise aprofundada do artigo “Transmission of MRSA, ESBL E. coli, and C. difficile within a tertiary care hospital and across surrounding facilities in Japan: a molecular epidemiological study with the PCR-based Open-reading frame typing”, de Saito et al., publicado em 2025.1 Este estudo oferece uma perspectiva inovadora e crucial sobre a dinâmica de transmissão desses patógenos em um contexto regional específico: o Japão. A escolha do Japão como cenário de pesquisa é particularmente pertinente, dada a sua demografia caracterizada por uma sociedade em rápido envelhecimento, onde as ILPIs desempenham um papel cada vez mais central e interligado na cadeia de cuidados de saúde.1 A elucidação das interações epidemiológicas nesse ambiente é indispensável para o aprimoramento das abordagens de controle de infecção.

O objetivo primordial do estudo de Saito et al. foi determinar o impacto regional da transmissão de MDROs e C. difficile entre um hospital de cuidados terciários e as instalações de saúde circundantes, incluindo as ILPIs.1 Ao investigar essa interação complexa, o artigo contribui significativamente para preencher uma lacuna no conhecimento sobre a epidemiologia de MDROs entre ILPIs e hospitais de cuidados agudos no Japão, uma área que, até então, não havia sido suficientemente explorada.1 A relevância deste estudo, contudo, transcende as fronteiras geográficas e o contexto japonês, oferecendo lições valiosas e aplicáveis para outros países. O Brasil, por exemplo, também vivencia um rápido envelhecimento populacional, resultando em uma demanda crescente por ILPIs e um aumento nas transferências de pacientes entre esses estabelecimentos e hospitais de agudos. A observação de que um país como o Japão, com um sistema de saúde geralmente bem estruturado, enfrenta desafios significativos de transmissão interinstitucional de MDROs, sugere que o Brasil, com suas vastas dimensões e diversidades regionais na infraestrutura de saúde e nos recursos de controle de infecção, pode enfrentar desafios análogos ou até mais complexos. Portanto, a análise aprofundada da dinâmica de transmissão e dos fatores contribuintes identificados no estudo japonês pode fornecer subsídios cruciais para informar e aprimorar as estratégias preventivas, as políticas de saúde pública e as diretrizes de controle de infecção no contexto brasileiro, servindo como um modelo para a identificação de vulnerabilidades e a proposição de soluções adaptadas.

Análise Aprofundada do Estudo: “Transmission of MRSA, ESBL E. coli, and C. difficile within a tertiary care hospital and across surrounding facilities in Japan: a molecular epidemiological study with the PCR-based Open-reading frame typing” (Saito et al., 2025)

Principal Achado

O achado central do estudo de Saito et al. é a demonstração inequívoca de que a transmissão de MDROs e C. difficile não se restringe ao ambiente hospitalar, mas é prevalente tanto dentro do hospital de cuidados terciários quanto em uma complexa rede de intercâmbio com instalações de saúde circundantes, incluindo ILPIs e outros hospitais no Japão.1 Esta observação sublinha a natureza regional e interconectada da epidemiologia da resistência antimicrobiana.

Uma descoberta crucial foi que mais da metade dos patógenos-alvo foram detectados muito precocemente após a admissão hospitalar dos pacientes (em até 2 dias).1 Este fato sugere fortemente que esses MDROs e

  1. difficile foram frequentemente importados para o hospital a partir de ambientes pré-hospitalares, como as ILPIs ou outros hospitais.1 Adicionalmente, a análise molecular confirmou que o contato intra-hospitalar, ou seja, a transmissão intrainstitucional, também constitui uma via comum e significativa de disseminação. Isso é particularmente relevante no contexto de internações hospitalares prolongadas, que oferecem maiores oportunidades para a aquisição e transmissão de patógenos dentro da própria instituição.1

Importância do Tema

A carga global da AMR é uma realidade sombria, com a resistência bacteriana sendo uma das principais causas de mortalidade infecciosa.1 Em resposta a essa crise, governos como o do Japão têm implementado planos de ação nacionais, como o de 2016, que incluem estratégias focadas em pesquisas relacionadas à AMR, com especial atenção às ILPIs.1 Residentes de ILPIs são reconhecidos por sua vulnerabilidade e por desproporcionalmente abrigarem MDROs.1 No Japão, por exemplo, cerca de 40% dos residentes de ILPIs são portadores de bactérias Gram-negativas multirresistentes na cavidade oral.1 Essa alta taxa de colonização os torna um reservatório significativo para a disseminação de patógenos.

Um ponto de preocupação destacado pelo estudo é que o controle de infecção em ILPIs no Japão não é sistematicamente avaliado.1 Esta lacuna na vigilância e na fiscalização pode comprometer os esforços de controle de infecção em toda a rede de saúde. A ausência de um monitoramento e avaliação rigorosos das práticas de controle de infecção em ILPIs, conforme explicitamente observado no contexto japonês, representa um ponto cego crítico e uma vulnerabilidade estrutural que pode amplificar a disseminação de MDROs.

A falta de avaliação sistemática e robusta do controle de infecção em ILPIs, conforme explicitamente observado no contexto japonês, representa um ponto cego crítico e uma vulnerabilidade estrutural que pode amplificar a disseminação de MDROs. Isso sugere uma priorização histórica do ambiente hospitalar agudo em detrimento de outros elos igualmente importantes da cadeia de cuidados de saúde. A identificação de ILPIs como importantes reservatórios de MDROs, com uma alta prevalência de colonização entre seus residentes, e a frequência significativa de transferência de pacientes entre ILPIs e hospitais de agudos, leva a uma inferência causal: a ausência de um monitoramento e avaliação rigorosos das práticas de controle de infecção em ILPIs cria um ambiente propício para a aquisição e manutenção de MDROs.

Este cenário, por sua vez, facilita a reintrodução contínua desses patógenos em hospitais de agudos através dos pacientes transferidos, minando a eficácia dos programas de controle de infecção hospitalar. A identificação dessa lacuna no Japão serve como um alerta global, enfatizando a necessidade urgente de estender e fortalecer as políticas e os recursos de controle de infecção para além dos hospitais de agudos, abrangendo toda a rede de cuidados de saúde para uma abordagem mais holística e eficaz da AMR.

O que se Sabia Anteriormente

A magnitude da carga global da AMR já era amplamente reconhecida, com estimativas de milhões de mortes anuais.1 A adoção de planos de ação nacionais contra a AMR, como o implementado pelo Japão em 2016, era uma resposta estratégica global.1 A suscetibilidade e a alta taxa de colonização por MDROs em residentes de ILPIs eram conhecimentos estabelecidos.1

Métodos de tipagem molecular como a eletroforese em campo pulsado (PFGE), a tipagem de sequência multilocus (MLST) e o sequenciamento de genoma completo (WGS) eram as ferramentas padrão para avaliar a interação epidemiológica de MDROs, mas eram conhecidos por serem demorados e intensivos em recursos.1 O método POT (PCR-based Open-reading frame Typing), desenvolvido no Japão, já se apresentava como uma alternativa mais rápida e padronizada para a detecção de polimorfismos de DNA.1

A diferenciação entre MRSA adquirido na comunidade (CA-MRSA) e hospitalar (HA-MRSA) por meio dos valores POT1 (104/106/108/110 para CA-MRSA e 93 para HA-MRSA) era um conceito estabelecido.1 No entanto, relatórios anteriores no Japão já indicavam uma crescente prevalência de cepas de SCCmec e POT convencionalmente consideradas CA-MRSA em ambientes de saúde desde 2010.1 A observação de que cepas de CA-MRSA estão se tornando mais prevalentes em ambientes de saúde no Japão, apesar da distinção tradicional entre CA e HA-MRSA, sugere uma “hospitalização” ou “institucionalização” de patógenos originalmente comunitários.

Isso complica a epidemiologia da AMR e exige uma reavaliação das estratégias de controle. O conceito tradicional de CA-MRSA (comunitário) e HA-MRSA (hospitalar) era historicamente definido por padrões genéticos e epidemiológicos distintos, com diferentes perfis de resistência e virulência. No entanto, o estudo e relatórios anteriores no Japão indicam que cepas de CA-MRSA estão sendo cada vez mais detectadas em ambientes de saúde, incluindo hospitais e ILPIs. Essa “migração” de cepas comunitárias para ambientes de saúde apaga a linha clara entre infecções adquiridas na comunidade e no hospital. Isso significa que os patógenos não respeitam mais as fronteiras institucionais ou epidemiológicas tradicionais. As estratégias de vigilância e controle de infecção, que muitas vezes se baseiam nessa dicotomia CA/HA para direcionar intervenções, tornam-se menos eficazes. É necessário um olhar mais abrangente que reconheça a circulação contínua e a adaptação de patógenos em toda a rede de saúde, independentemente de sua origem inicial, tornando o rastreamento e a contenção de surtos mais desafiadores devido a fontes mais difusas e menos óbvias.

Observava-se que hospitais de atenção primária no Japão tendiam a apresentar pontuações mais baixas em avaliações de controle de infecção (IPCAF) em comparação com hospitais secundários ou terciários, provavelmente devido a diferenças na alocação de recursos.1 A frequência de hospitalizações e readmissões de pacientes de ILPIs era um padrão conhecido no sistema de saúde.1

Metodologia do Estudo

O estudo de Saito et al. empregou um desenho de coorte retrospectiva, conduzido em um hospital universitário terciário de 518 leitos localizado em Yokohama, Japão, com uma média de tempo de internação de 10,7 dias.1 Durante o período do estudo (julho de 2019 a julho de 2021), apesar dos desafios impostos pela pandemia de COVID-19, as medidas gerais de prevenção e controle de infecção do hospital permaneceram em grande parte inalteradas, e não foram registrados surtos de MDROs que exigissem investigação ativa. A adesão à higiene das mãos no hospital, no entanto, demonstrou uma melhora significativa de 50% em 2019 para >80% em 2020, mantendo-se acima de 70% em 2021.1

Foram elegíveis pacientes admitidos no hospital entre 1º de julho de 2019 e 31 de julho de 2021, cujas culturas microbiológicas coletadas clinicamente durante a hospitalização apresentaram crescimento dos patógenos-alvo. Os patógenos incluíram: Staphylococcus aureus resistente à meticilina (MRSA), Enterobacterales produtores de Beta-Lactamase de Espectro Estendido (ESBL) (tanto Escherichia coli (E. coli) quanto não-E. coli), Pseudomonas aeruginosa com resistência de difícil tratamento (PA-DTR), Enterobacterales resistentes a carbapenêmicos (CRE), Enterococos resistentes à vancomicina (VRE) e Clostridioides difficile (C. difficile).1 Características detalhadas dos pacientes, como idade, sexo, procedimentos médicos, local de origem antes da admissão, movimentação intra-hospitalar, tempo de internação e status de alta, foram coletadas por revisão de prontuários médicos.1

Os testes microbiológicos foram realizados por microbiologistas certificados, seguindo os padrões nacionais.1 Para a análise epidemiológica molecular dos isolados de MRSA, ESBL E. coli e C. difficile, foi empregado o método PCR-based Open-reading frame Typing (POT).1 Este método inovador detecta aproximadamente 20 ORFs (Open Reading Frames) utilizando PCR multiplex. Os ORFs-alvo são determinados por análise comparativa de sequências genômicas completas de múltiplas cepas da espécie bacteriana em questão. Os códigos POT são convertidos a partir dos padrões de bandas eletroforéticas, representando a presença ou ausência dos respectivos ORFs-alvo como uma combinação de valores numéricos (e.g., POT1-POT2(-POT3)).1 O estudo utilizou kits POT comercialmente disponíveis: Cica Geneus Staph POT kit (para MRSA), Cica Geneus ESBL Genotype Detection kit (para ESBL E. coli) e Cica Geneus Toxin Gene Detection kit (para C. difficile), todos da Kanto Chemical Co., Ltd., Tóquio, Japão.1

A escolha estratégica do método POT, em detrimento de técnicas de sequenciamento de genoma completo (WGS) ou eletroforese em campo pulsado (PFGE), destaca uma abordagem pragmática e clinicamente orientada para a epidemiologia molecular em ambientes hospitalares. Isso demonstra um equilíbrio entre a necessidade de rapidez e padronização com a capacidade de diferenciação de cepas. Métodos como PFGE, MLST e WGS são robustos, mas demorados e exigem recursos significativos.1 O método POT, por outro lado, pode fornecer resultados em aproximadamente meio dia, em contraste com os vários dias exigidos pelo PFGE. Além disso, ele facilita procedimentos padronizados usando kits comercialmente disponíveis e minimiza a variabilidade entre examinadores devido à representação numérica dos tipos POT.1

Embora o POT possa ser inferior à análise de polimorfismos de nucleotídeo único (SNP) via WGS em termos de capacidade discriminatória para análise filogenética, ele é considerado equivalente ao PFGE e MLST.1 Para a investigação de surtos e o rastreamento da transmissão em tempo real ou quase real em ambientes hospitalares, a velocidade e a praticidade do método POT são vantagens consideráveis. A capacidade de obter resultados rápidos é crucial para implementar intervenções de controle de infecção de forma ágil. Portanto, a escolha do POT reflete uma decisão informada que prioriza a utilidade clínica e a eficiência operacional, mesmo que isso signifique uma resolução genômica ligeiramente menor em comparação com o WGS.

Para a análise da interação epidemiológica, foram estabelecidas definições claras: Contato Pré-hospitalar foi definido se o par de pacientes pertencia ao mesmo domicílio ou instalação (e.g., ILPI) e compartilhava a mesma cepa POT, com a cultura do patógeno sendo coletada em menos de 3 dias após a admissão hospitalar, sugerindo que o paciente já estava colonizado ou infectado antes de entrar no hospital.1

Contato Intra-hospitalar foi definido se a cultura do patógeno foi coletada 3 dias ou mais após a admissão hospitalar, indicando uma possível aquisição dentro do ambiente hospitalar. Esta categoria foi subdividida para maior precisão em: Contato direto na enfermaria (par de pacientes compartilhava a mesma cepa POT e esteve hospitalizado na mesma enfermaria com sobreposição de pelo menos um dia); Contato indireto na enfermaria (par de pacientes compartilhava a mesma cepa POT e esteve na mesma enfermaria, mas o período de admissão do paciente-fonte precedeu o do paciente-receptor sem sobreposição); Contato direto no hospital (par de pacientes compartilhava a mesma cepa POT e esteve hospitalizado no mesmo hospital dentro do período de risco, mas não na mesma enfermaria); e Sem contato intra-hospitalar (casos onde nenhuma das condições acima foi atendida).1

As ILPIs e outros hospitais que serviram como fonte de admissão e/ou destino de alta dos pacientes foram contatados. Se concordassem, eram visitados por uma equipe treinada de controle de infecção do hospital terciário para avaliar seu status de controle de infecção, utilizando o WHO Hand Hygiene Self-Assessment Framework (HHSAF) e o Infection Prevention and Control Assessment Framework (IPCAF), ambos ferramentas validadas. As pontuações obtidas eram classificadas em quatro categorias: Inadequado, Básico, Intermediário e Avançado.1 A análise estatística incluiu análise descritiva, com apresentação de frequências e proporções. A análise univariada foi conduzida para avaliar a associação entre variáveis categóricas, calculando odds ratios (ORs) com intervalos de confiança de 95% (CIs). O teste qui-quadrado de Pearson e o teste de Mann Whitney foram aplicados para comparar variáveis categóricas e contínuas entre dois grupos, respectivamente. Todas as análises estatísticas foram realizadas utilizando o software SPSS Versão 27.0, com um nível de significância estatística de P-valor < 0,05.1

Principais Resultados

O estudo incluiu 305 pacientes, totalizando 332 espécimes de cultura clinicamente obtidas com os patógenos-alvo.1 A idade mediana dos pacientes foi de 78 anos (IQR 71-85), e o tempo mediano de internação hospitalar foi de 26 dias (IQR 12-51).1 Os patógenos mais frequentemente detectados foram: MRSA (132 isolados, 43,3% dos 305 pacientes), seguido por ESBL E. coli (97 isolados, 31,8%) e ESBL Enterobacterales (não-E. coli) (32 isolados, 10,5%). CRE foi detectado em 4,6% e PA-DTR em 1,6%. C. difficile foi detectado em 8,2% dos pacientes. VRE não foi detectado na coorte estudada.1

A rota de admissão dos 305 pacientes foi a seguinte: 186 (61,0%) de casa, 93 (30,5%) de 50 ILPIs e 26 (8,5%) de 20 outros hospitais.1 Um achado estatisticamente significativo foi que os patógenos-alvo foram significativamente mais propensos a serem detectados dentro de 2 dias em pacientes admitidos de ILPIs ou outros hospitais do que naqueles admitidos de casa (Odds Ratio 4,6; IC 95% 2,8-7,6; P-valor < 0,001).1 Este dado corrobora a hipótese de importação de patógenos. Aproximadamente metade dos pacientes (150/305, 49,2%) teve alta para ILPIs ou foi transferida para outros hospitais, incluindo mais de um terço dos pacientes originalmente admitidos de casa (68/186, 36,6%).1

A combinação de uma população majoritariamente idosa, tempos de internação hospitalar prolongados e a alta frequência de transferências de pacientes entre diferentes tipos de instalações de saúde (ILPIs e hospitais de agudos) no Japão, conforme revelado pelos dados demográficos e de fluxo de pacientes, cria um “ciclo de transmissão” ideal e altamente eficiente para MDROs. Pacientes idosos (idade mediana de 78 anos) frequentemente apresentam comorbidades, fragilidade e sistemas imunológicos comprometidos, tornando-os mais suscetíveis à colonização e infecção por MDROs.1 Tempos de internação hospitalar longos (mediana de 26 dias) aumentam exponencialmente a duração da exposição dos pacientes a patógenos nosocomiais e, consequentemente, a probabilidade de aquisição de MDROs.1 A alta proporção de pacientes admitidos de ILPIs/outros hospitais e, subsequentemente, transferidos para essas mesmas instalações ou outras após a alta, estabelece uma rede de “compartilhamento de pacientes”.1 Esta rede não é apenas um caminho para a “importação” de patógenos para o hospital de agudos, mas também um mecanismo para a “exportação” de patógenos adquiridos no hospital para outras instalações.

Juntos, esses fatores formam um ciclo contínuo de circulação de MDROs. Pacientes vulneráveis adquirem patógenos em uma instalação, são transferidos para outra, potencialmente disseminando-os, adquirem novos patógenos ou reintroduzem os antigos, e assim sucessivamente. Isso não é apenas uma questão de “importação” ou “exportação”, mas de uma interdependência epidemiológica fundamental entre todos os elos da cadeia de cuidados de saúde, tornando o problema da AMR um desafio regional e sistêmico, e não meramente intrainstitucional.

Testes POT foram realizados em 239 espécimes de um total de 254 pacientes elegíveis (MRSA, ESBL E. coli, C. difficile).1 A análise revelou uma notável diversidade de cepas: 58 cepas distintas de MRSA (entre 126 pacientes), 70 de ESBL E. coli (entre 89 pacientes) e 20 de C. difficile (entre 24 pacientes).1 A proporção de pacientes que compartilhavam os mesmos códigos POT com outros pacientes foi significativa: 82 (65,1%) para MRSA, 29 (32,6%) para ESBL E. coli e 7 (29,2%) para C. difficile.1 Para MRSA, os valores POT1 indicaram que as cepas com SCCmec tipo IV (POT1 104/106/108/110), que predominantemente representam cepas adquiridas na comunidade (CA-MRSA), corresponderam a 70,6% dos isolados. Já as cepas com SCCmec tipo II (POT1 93), representando as cepas hospitalares (HA-MRSA), foram responsáveis por 22,2%.1

Houve uma associação estatisticamente significativa entre os valores POT1 e o momento da coleta da cultura: culturas de MRSA coletadas dentro de 2 dias da hospitalização tiveram uma maior associação com a detecção de cepas POT1 104/106/108/110 (OR 2,3; IC 95% 1,0-4,9; P-valor 0,039), reforçando a ideia de importação de CA-MRSA.1 Em contraste, culturas de MRSA coletadas após 3 dias da hospitalização tiveram uma maior associação com a detecção de cepas POT1 93 (OR 2,7; IC 95% 1,1-6,5; P-valor 0,022), indicando aquisição hospitalar de HA-MRSA.1

A prevalência de contato pré-hospitalar foi notável: 128 de 239 pacientes (53,6%) tiveram os patógenos-alvo detectados dentro de 2 dias da admissão, sugerindo uma origem pré-hospitalar.1 Para MRSA, entre 69 pacientes com culturas coletadas em menos de 3 dias, 44 compartilhavam códigos POT. Destes, 11 pacientes haviam estado nas mesmas ILPIs antes da admissão, e 7 compartilhavam os mesmos códigos POT dentro dessas ILPIs, sugerindo contato pré-hospitalar. A cepa POT 106-183-37 foi identificada em 5 dos 7 casos de contato pré-hospitalar.1 Para ESBL  E. coli, nenhum contato pré-hospitalar foi identificado entre 16 pacientes que compartilhavam os mesmos códigos POT.1

Em relação ao contato intra-hospitalar, entre 111 pacientes com culturas coletadas após 3 dias de admissão, 52 compartilhavam tipos POT.1 Para MRSA, o contato intra-hospitalar foi indicado em um terço dos pacientes (19/57, 33,3%), incluindo 11 de 43 pacientes (25,6%) admitidos de casa. A cepa POT 106-183-37 foi identificada em 11 dos 19 casos de contato intra-hospitalar.1 Treze pacientes apresentaram contato direto na enfermaria, compartilhando os mesmos códigos POT (12 MRSA, 1 C. difficile). Esses 13 pacientes tiveram um tempo mediano de internação hospitalar significativamente mais longo (34,0 dias versus 14,5 dias para aqueles sem contato direto na enfermaria, P-valor < 0,005).1

A avaliação do status de prevenção e controle de infecção em instalações circundantes revelou disparidades importantes. Nas duas ILPIs avaliadas, as pontuações HHSAF foram 125 (Inadequado) e 222.5 (Básico), enquanto as pontuações IPCAF foram 265 (Básico) e 310 (Básico).1 Em contraste, nos dois hospitais avaliados, as pontuações HHSAF foram 280 (Intermediário) e 305 (Intermediário), e as pontuações IPCAF foram 440 (Intermediário) e 770 (Avançado).1

Discussão Crítica e Reflexões

O estudo de Saito et al. oferece uma contribuição fundamental para a compreensão da epidemiologia da AMR, ao elucidar as complexas dinâmicas de transmissão de MDROs e C. difficile em uma rede de saúde regional no Japão.1 A prevalência de MDROs e C. difficile tanto dentro do hospital terciário quanto em sua interação com ILPIs e outros hospitais é um achado que ressoa globalmente.1 A detecção precoce de patógenos em mais da metade dos pacientes após a admissão sublinha a importação de microrganismos de ambientes pré-hospitalares, um fenômeno amplificado pela alta taxa de admissões de ILPIs e outros hospitais.1 Este fluxo bidirecional de pacientes, com quase metade sendo transferida para ILPIs ou outros hospitais após a alta, cria um ciclo contínuo de circulação de patógenos, transformando o problema da AMR em um desafio regional e sistêmico, e não meramente intrainstitucional.1

A escolha do método POT para a tipagem molecular é um destaque metodológico. Embora o sequenciamento de genoma completo (WGS) ofereça maior resolução, a rapidez e a padronização do POT o tornam uma ferramenta valiosa para investigações epidemiológicas em tempo real, permitindo respostas mais ágeis no controle de infecções.1 A capacidade do POT de diferenciar cepas de MRSA (CA-MRSA vs. HA-MRSA) e a observação de que cepas de CA-MRSA estão se tornando mais prevalentes em ambientes de saúde no Japão indicam uma “institucionalização” de patógenos originalmente comunitários. Essa quebra da dicotomia tradicional entre infecções adquiridas na comunidade e no hospital exige uma reavaliação das estratégias de vigilância e controle, que devem ser mais abrangentes e adaptáveis à circulação contínua de patógenos em toda a rede de saúde.1

As baixas pontuações de controle de infecção observadas nas ILPIs avaliadas são particularmente preocupantes.1 Esta deficiência sistêmica nas ILPIs, que servem como importantes reservatórios de MDROs e pontos de intercâmbio frequente com hospitais de agudos, representa uma vulnerabilidade crítica que pode minar os esforços de controle de infecção em toda a rede de saúde. A falta de avaliação sistemática e robusta do controle de infecção nesses ambientes, conforme explicitado no estudo, sugere uma priorização histórica do ambiente hospitalar agudo em detrimento de outros elos igualmente importantes da cadeia de cuidados. A melhoria do controle de infecção em ILPIs e hospitais de atenção primária é, portanto, crucial para impactar positivamente a epidemiologia regional da AMR.1

O estudo, apesar de suas importantes contribuições, apresenta algumas limitações inerentes ao seu desenho retrospectivo e ao contexto da pandemia de COVID-19. A inclusão apenas de culturas clinicamente coletadas pode ter subestimado a prevalência real de portadores assintomáticos de MDROs, que são vetores potenciais de transmissão.1 A ausência de triagem rotineira de MDROs no hospital estudado, uma prática comum no Japão, também limita a avaliação abrangente da transmissão.1 A impossibilidade de coletar espécimes microbiológicos em ILPIs e outros hospitais devido a restrições de recursos e logística impediu uma compreensão mais completa da transmissão interinstitucional.1 Além disso, a restrição de visitas durante a pandemia limitou o número de instalações que puderam ser avaliadas quanto ao controle de infecção, e as condições observadas podem não refletir o cenário em tempos normais.1 Finalmente, por ser um estudo de instituição única no Japão, a generalização dos resultados para outras regiões ou países deve ser considerada com cautela.1

Artigos Relacionados e Contexto Ampliado

A temática da transmissão de microrganismos multirresistentes (MDROs) e Clostridioides difficile em ambientes de saúde é de relevância global, e diversos estudos têm contribuído para aprofundar o entendimento sobre suas dinâmicas. A seguir, são apresentadas referências adicionais que corroboram e expandem os achados do estudo de Saito et al., citadas no formato ABNT com um breve resumo de suas conclusões:

Artigos do site www.ccih.med.br

  • Vigilância Genômica como Ferramenta para Identificar Transmissão de Microrganismos Multirresistentes
    • Título: Vigilância genômica como ferramenta para identificar transmissão de microrganismos multirresistentes
    • Link: https://www.ccih.med.br/vigilancia-genomica-como-ferramenta-para-identificar-transmissao-de-microrganismos-multirresistentes/
    • Referência ABNT: ONG, S. W. X. et al. Genomic surveillance uncovers ongoing transmission of carbapenem-resistant Acinetobacter baumannii (CRAB) and identifies actionable routes of transmissions in an endemic setting. Infection control and hospital epidemiology, v. 44, n. 3, p. 460–466, 2023. DOI: https://doi.org/10.1017/ice.2022.115.
    • Resumo: Este artigo discute o uso do sequenciamento de genoma completo (WGS) para compreender os padrões de transmissão de microrganismos multirresistentes e aprimorar as intervenções de controle de infecção. Focou em Acinetobacter baumannii resistente a carbapenêmicos (CRAB), identificando clusters de transmissão em UTIs e sugerindo a presença de reservatórios ambientais persistentes. Concluiu que o WGS é uma ferramenta útil para caracterizar transmissões nosocomiais, oferecendo maior poder discriminatório e resolução taxonômica, o que ajuda a identificar rotas de transmissão menos óbvias e a otimizar medidas de prevenção.5
  • Fatores Organizacionais e Infraestruturais Associados a Infecções Hospitalares por Clostridioides difficile e MRSA
    • Título: Fatores Organizacionais e Infraestruturais Associados a Infecções Hospitalares por Clostridioides difficile e MRSA
    • Link: https://www.ccih.med.br/fatores-organizacionais-e-infraestruturais-associados-a-infeccoes-hospitalares-por-clostridioides-difficile-e-mrsa/
    • Referência ABNT: A referência ABNT completa para este artigo não pôde ser extraída diretamente da informação fornecida, pois o link direciona para uma página de blog que discute o tema, não para um artigo científico diretamente referenciável em formato ABNT.6
    • Resumo: O título sugere a avaliação de fatores organizacionais e infraestruturais que contribuem para infecções hospitalares por Clostridioides difficile e MRSA, indo além dos fatores óbvios para identificar as causas subjacentes e propor intervenções mais eficazes.6

Artigos de BIREME e outras plataformas

  • Manual sobre Prevenção de Infecções por Microrganismos Multirresistentes em Serviços de Saúde (ANVISA)
    • Referência ABNT: AGÊNCIA NACIONAL DE VIGILÂNCIA SANITÁRIA (ANVISA). Manual sobre prevenção de infecções por microrganismos multirresistentes em serviços de saúde. Brasília, DF: Anvisa, 2021. Disponível em: https://www.gov.br/anvisa/pt-br/centraisdeconteudo/publicacoes/servicosdesaude/publicacoes/manual-prevencao-de-multirresistentes7.pdf.
    • Resumo: Este manual da ANVISA, parte da “Série Segurança do Paciente e Qualidade em Serviços de Saúde”, oferece diretrizes e recomendações para a prevenção de infecções por MDROs no Brasil. Abrange hospitais, ILPIs e cuidados domiciliares, enfatizando a importância da higiene das mãos, precauções de contato, limpeza ambiental e vigilância. Destaca que a resistência microbiana é um grave problema de saúde pública, com impactos significativos na mortalidade e nos custos de saúde, e que o uso inadequado de antimicrobianos e as práticas inadequadas de controle de infecção são fatores de risco para a disseminação da resistência.7
  • Detecção dos Principais Microrganismos Multirresistentes no Ambiente de um Hospital Veterinário de Ensino no Brasil
    • Referência ABNT: SFACIOTTE, R. A. P. et al. Detection of the main multiresistant microorganisms in the environment of a teaching veterinary hospital in Brazil. Pesquisa Veterinária Brasileira, v. 41, 2021. DOI: https://doi.org/10.1590/1678-5150-PVB-6706.
    • Resumo: O estudo mapeou pontos de contaminação bacteriana em um hospital veterinário de ensino no Brasil, identificando MDROs como MRS, VRE, ESBL e CP em todas as 39 áreas amostradas. Concluiu que o ambiente veterinário pode ser uma fonte de infecção para profissionais e estudantes, representando um risco significativo para a saúde pública, e ressaltou a dificuldade de controlar a disseminação desses patógenos na ausência de protocolos de desinfecção específicos.8
  • Infecção por Clostridioides difficile: Diagnóstico, Tratamento e Perspectivas Futuras
    • Referência ABNT: CYMBAL, M.; CHATTERJEE, A.; BAGGOTT, B.; AURON, M. Management of Clostridioides difficile Infection: Diagnosis, Treatment, and Future Perspectives. Am J Med, v. 137, n. 7, p. 571–576, jul. 2024. DOI: https://doi.org/10.1016/j.amjmed.2024.03.024..
    • Resumo: Este artigo de revisão aborda a infecção por Clostridioides difficile (CDI) como a infecção associada à assistência à saúde mais comum nos EUA, com complicações potencialmente fatais e custos significativos. Enfatiza a importância da gestão de antimicrobianos e da descontinuação da terapia supressora de ácido gástrico para prevenção e tratamento. Conclui que novos tratamentos, como Bezlotoxumab, transplante de microbiota fecal e produtos bioterapêuticos vivos, são eficazes na CDI recorrente e na abordagem da disbiose.9
  • Controle de Infecção Hospitalar: Clostridioides difficile
    • Referência ABNT: TURNER, N. A.; ANDERSON, D. J. Hospital Infection Control: Clostridioides difficile. Clin Colon Rectal Surg., v. 33, n. 2, p. 98-108, mar. 2020. DOI: https://doi.org/10.1055/s-0040-1701234.
    • Resumo: Esta revisão destaca que Clostridioides difficile continua sendo uma das principais causas de infecção associada à assistência à saúde. A prevenção eficaz exige intervenções multimodais, incluindo precauções de contato, higiene das mãos com água e sabão, limpeza ambiental eficaz com agentes esporicidas e gestão de antimicrobianos. Os papéis de probióticos, evitação de inibidores de bomba de prótons e isolamento de portadores assintomáticos ainda são mal definidos.10
  • Epidemiologia e Dinâmica de Transmissão de Microrganismos Multirresistentes em Instituições de Longa Permanência nos Estados Unidos
    • Referência ABNT: MODY, L.; GIBSON, K. E.; CASSONE, M.; VIJAYASIRI, G.; CLEMENT, T.; SNITKIN, E.; SAINT, S.; KREIN, S. L.; JANEVIC, M. R.; THIEL, J.; RIDENOUR, J.; NGUYEN, A.; HICKS, O.; BEJ, T. A.; EL CHAKHTOURA, N. G.; MIN, L.; GALECKI, A.; GREENE, T.; ROGHMANN, M.-C.; CHIGURUPATI, L.; PEREZ, F.; JUMP, R. L. P. Epidemiology and transmission dynamics of multidrug-resistant organisms in nursing homes within the United States. Nat Commun., v. 16, n. 2487, 13 mar. 2025. DOI: https://doi.org/10.1038/s41467-025-57566-3.
    • Resumo: Este estudo de coorte prospectivo investigou a epidemiologia e a dinâmica de transmissão de MDROs em ILPIs nos EUA. Revelou alta prevalência de colonização na admissão e aquisição comum de novos MDROs durante a estadia. A transmissão de MDROs foi frequente durante visitas interativas, especialmente entre residentes com colonização nas mãos. Concluiu que são necessárias intervenções multimodais urgentes para reduzir a carga de MDROs e conter as transmissões, focando em pacientes de alto risco e transmissões fora dos quartos.11
  • Prevalência de Microrganismos Multirresistentes e Fatores de Risco para Portadores entre Pacientes Transferidos de Instituições de Longa Permanência
    • Referência ABNT: EONG, H.; KANG, S.; CHO, H.-J. Prevalence of Multidrug-Resistant Organisms and Risk Factors for Carriage among Patients Transferred from Long-Term Care Facilities. Infect Chemother., v. 52, n. 2, p. 183–193, 24 jun. 2020. DOI: https://doi.org/10.3947/ic.2020.52.2.183.
    • Resumo: O estudo buscou determinar a prevalência e os fatores de risco associados à colonização por MDROs em pacientes transferidos de ILPIs. Aproximadamente um terço dos pacientes transferidos carregava VRE ou MRSA. O fator de risco mais significativo para a colonização por MDRO foi a terapia antibiótica prévia. Os achados sugerem a necessidade de abordagens de manejo mais eficientes para pacientes de alto risco e destacam a importância da gestão de antimicrobianos tanto em hospitais de cuidados agudos quanto em ILPIs.4
  • Estratégias para Prevenir Infecções por Clostridioides difficile em Hospitais de Cuidados Agudos: Atualização de 2022
    • Referência ABNT: KOCIOLEK, L. K. et al. Strategies to prevent Clostridioides difficile infections in acute-care hospitals: 2022 Update. In: Infection Control & Hospital Epidemiology. Cambridge University Press: [s.n.], 2023. v. 44, n. 4, p. 527 – 549. DOI: https://doi.org/10.1017/ice.2023.18.
    • Resumo: Este documento atualiza as recomendações para prevenção de CDI em hospitais de cuidados agudos, categorizando as estratégias em “práticas essenciais” e “abordagens adicionais”. Destaca a gestão de antimicrobianos, a gestão diagnóstica, as precauções de contato, a limpeza e desinfecção ambiental, a avaliação da limpeza dos quartos, os sistemas de alerta laboratoriais, a vigilância e a educação como práticas essenciais. Reconhece que a prevenção da CDI exige a integração de melhores práticas em uma cultura de apoio, envolvendo equipes multidisciplinares e educação contínua.3
  • Identificação Precoce de um Surto de Clostridioides difficile Baseado em Enfermaria Usando Vigilância Genômica Prospectiva Baseada em Tipo de Sequência Multilocus Oxford Nanopore
    • Referência ABNT: BLOOMFIELD, M. et al. Early identification of a ward-based outbreak of Clostridioides difficile using prospective multilocus sequence type-based Oxford Nanopore genomic surveillance. Infection Control & Hospital Epidemiology, v. 45, n. 9, p. 1057-1063, 2024. DOI: https://doi.org/10.1017/ice.2024.77.
    • Resumo: O estudo demonstrou que a vigilância genômica prospectiva de C. difficile usando sequenciamento ONT permitiu a identificação precoce de um surto de CDI (ST2) que, de outra forma, teria passado despercebido. Isso sublinha o valor de tal sistema para permitir intervenções de prevenção e controle de infecção eficazes e oportunas.12
  • Vias de Transmissão de Microrganismos Multirresistentes no Ambiente Hospitalar: Uma Revisão de Escopo
    • Referência ABNT: BLANCO, N.; O’HARA, L. M.; HARRIS, A. D. Transmission pathways of multidrug-resistant organisms in the hospital setting: a scoping review. Infection Control & Hospital Epidemiology, v. 40, n. 4, p. 447-456, 2019. DOI: https://doi.org/10.1017/ice.2018.359.
    • Resumo: Esta revisão de escopo sintetizou a literatura sobre as cinco vias potenciais de transmissão de MDROs em ambientes de saúde: paciente para profissional de saúde (HCW), paciente para ambiente, HCW para paciente, ambiente para paciente e ambiente para HCW. Encontrou evidências consistentes para todas as vias, confirmando que a transmissão de MDROs em hospitais ocorre frequentemente e ressaltando a necessidade de esforços contínuos para fortalecer a prevenção e o controle de infecções.13
  • Risco de Infecção Invasiva por MDRO em Pacientes Colonizados por MDRO
    • Referência ABNT: ALSHUBAILY, A. M. et al. Risk of invasive MDRO infection in MDRO-colonized patients. Infection Control & Hospital Epidemiology, v. 45, p. 1415 – 1419, 2024. DOI: https://doi.org/10.1017/ice.2024.156.
    • Resumo: O estudo estimou o risco de desenvolver infecção clínica por MDRO (CRE, MRSA ou VRE) em pacientes colonizados versus não colonizados. Concluiu que a colonização por CRE, MRSA ou VRE é um fator de risco significativo para o desenvolvimento de infecções causadas pelas respectivas bactérias, e a alta concordância entre os genes de carbapenemase encontrados na colonização e na infecção sugere que os resultados da triagem podem ser valiosos para informar estratégias de manejo e tratamento de infecções.2

Conclusões e Recomendações

O estudo de Saito et al. reforça a compreensão de que a transmissão de microrganismos multirresistentes (MDROs) e Clostridioides difficile transcende as fronteiras institucionais, sendo um desafio epidemiológico regional complexo no Japão, com implicações globais.1 A alta prevalência de patógenos importados de ambientes pré-hospitalares, como as Instituições de Longa Permanência (ILPIs), e a ocorrência contínua de transmissão intra-hospitalar, especialmente em um contexto de pacientes idosos e longas internações, criam um ciclo de disseminação que exige uma abordagem sistêmica e integrada.1

A utilização do método POT demonstra a viabilidade de ferramentas de tipagem molecular mais rápidas e padronizadas para a vigilância epidemiológica, complementando métodos de alta resolução como o WGS.1 A observação da crescente prevalência de cepas de CA-MRSA em ambientes de saúde desafia as classificações tradicionais e sublinha a necessidade de estratégias de controle que considerem a fluidez da epidemiologia da AMR.1 A lacuna na avaliação sistemática do controle de infecção em ILPIs, com suas baixas pontuações de conformidade, representa um ponto cego crítico que compromete a eficácia dos programas de controle em toda a rede de saúde.1

Com base nos achados do estudo e na literatura correlata, as seguintes recomendações são propostas para fortalecer o controle de infecções e a gestão da AMR:

  1. Fortalecimento do Controle de Infecção em ILPIs e Atenção Primária: É imperativo estender e aprimorar as políticas, recursos e avaliações sistemáticas de controle de infecção para além dos hospitais de cuidados agudos, abrangendo integralmente as ILPIs e as unidades de atenção primária. Isso inclui a implementação de programas de higiene das mãos, precauções de contato e limpeza ambiental robustos, adaptados às realidades desses ambientes.1
  2. Vigilância Epidemiológica Integrada e Regional: Desenvolver e implementar sistemas de vigilância que permitam o rastreamento da transmissão de MDROs e C. difficile em toda a rede de saúde, não apenas dentro de instituições isoladas. Isso pode incluir o uso de ferramentas de tipagem molecular como o POT para identificar cadeias de transmissão interinstitucionais.1
  3. Triagem Ativa de MDROs: Considerar a implementação de políticas de triagem ativa de MDROs na admissão de pacientes provenientes de ILPIs ou outras instalações de alto risco, mesmo que assintomáticos, para identificar portadores e iniciar precauções de isolamento apropriadas, reduzindo a importação de patógenos.1
  4. Gestão de Antimicrobianos Abrangente: Continuar e intensificar os programas de gestão de antimicrobianos em todos os níveis de assistência à saúde, incluindo ILPIs, para otimizar o uso de antibióticos, reduzir a pressão seletiva e mitigar o desenvolvimento e a disseminação da resistência.3
  5. Educação e Treinamento Contínuos: Promover programas de educação e treinamento contínuos para todos os profissionais de saúde, pacientes e seus cuidadores sobre a importância da prevenção da AMR, as vias de transmissão e as medidas de controle de infecção, adaptados às especificidades de cada ambiente de cuidado.3
  6. Pesquisa Focada em Mecanismos de Transmissão em ILPIs: Investir em pesquisas adicionais para elucidar os mecanismos específicos de transmissão de MDROs em ILPIs e desenvolver estratégias de prevenção e controle mais direcionadas e eficazes para esses ambientes.1

A luta contra a resistência antimicrobiana é uma responsabilidade compartilhada que exige colaboração contínua e inovação em todos os elos da cadeia de cuidados de saúde. Ao adotar uma abordagem regional e multifacetada, é possível mitigar o impacto da transmissão de MDROs e C. difficile, protegendo a saúde dos pacientes e preservando a eficácia dos antimicrobianos para as gerações futuras.

Referências bibliográficas

  1. SAITO, H. et al. Transmission of MRSA, ESBL E. coli, and C. difficile within a tertiary care hospital and across surrounding facilities in Japan: a molecular epidemiological study with the PCR-based Open-reading frame typing. Infection Control & Hospital Epidemiology, v. 46, p. 35-42, 2025. DOI: https://doi.org/10.1017/ice.2024.178.
  2. ALSHUBAILY, A. M. et al. Risk of invasive MDRO infection in MDRO-colonized patients. Infection Control & Hospital Epidemiology, v. 45, p. 1415-1419, 2024. DOI: https://doi.org/10.1017/ice.2024.156.
  3. KOCIOLEK, L. K. et al. Strategies to prevent Clostridioides difficile infections in acute-care hospitals: 2022 Update. In: Infection Control & Hospital Epidemiology. Cambridge University Press: [s.n.], 2023. v. 44, n. 4, p. 527-549. DOI: https://doi.org/10.1017/ice.2023.18.
  4. JEONG, H.; KANG, S.; CHO, H.-J. Prevalence of Multidrug-Resistant Organisms and Risk Factors for Carriage among Patients Transferred from Long-Term Care Facilities. Infect Chemother., v. 52, n. 2, p. 183–193, 24 jun. 2020. DOI: https://doi.org/10.3947/ic.2020.52.2.183.
  5. ONG, S. W. X. et al. Genomic surveillance uncovers ongoing transmission of carbapenem-resistant Acinetobacter baumannii (CRAB) and identifies actionable routes of transmissions in an endemic setting. Infection control and hospital epidemiology, v. 44, n. 3, p. 460–466, 2023. DOI: https://doi.org/10.1017/ice.2022.115.
  6. A referência ABNT completa para este artigo não pôde ser extraída diretamente da informação fornecida, pois o link direciona para uma página de blog que discute o tema, não para um artigo científico diretamente referenciável em formato ABNT.
  7. AGÊNCIA NACIONAL DE VIGILÂNCIA SANITÁRIA (ANVISA). Manual sobre prevenção de infecções por microrganismos multirresistentes em serviços de saúde. Brasília, DF: Anvisa, 2021. Disponível em: https://www.gov.br/anvisa/pt-br/centraisdeconteudo/publicacoes/servicosdesaude/publicacoes/manual-prevencao-de-multirresistentes7.pdf. Acesso em: 18 jun. 2025.
  8. SFACIOTTE, R. A. P. et al. Detection of the main multiresistant microorganisms in the environment of a teaching veterinary hospital in Brazil. Pesquisa Veterinária Brasileira, v. 41, 2021. DOI:(https://doi.org/10.1590/1678-5150-PVB-6706).
  9. CYMBAL, M. et al. Management of Clostridioides difficile Infection: Diagnosis, Treatment, and Future Perspectives. Am J Med, v. 137, n. 7, p. 571–576, jul. 2024. DOI: https://doi.org/10.1016/j.amjmed.2024.03.024.
  10. TURNER, N. A.; ANDERSON, D. J. Hospital Infection Control: Clostridioides difficile. Clin Colon Rectal Surg., v. 33, n. 2, p. 98-108, mar. 2020. DOI: https://doi.org/10.1055/s-0040-1701234.
  11. MODY, L. et al. Epidemiology and transmission dynamics of multidrug-resistant organisms in nursing homes within the United States. Nat Commun., v. 16, n. 2487, 13 mar. 2025. DOI: https://doi.org/10.1038/s41467-025-57566-3.
  12. BLOOMFIELD, M. et al. Early identification of a ward-based outbreak of Clostridioides difficile using prospective multilocus sequence type-based Oxford Nanopore genomic surveillance. Infection Control & Hospital Epidemiology, v. 45, n. 9, p. 1057-1063, 2024. DOI: https://doi.org/10.1017/ice.2024.77.
  13. BLANCO, N.; O’HARA, L. M.; HARRIS, A. D. Transmission pathways of multidrug-resistant organisms in the hospital setting: a scoping review. Infection Control & Hospital Epidemiology, v. 40, n. 4, p. 447-456, 2019. DOI: https://doi.org/10.1017/ice.2018.359.

 

Siglas utilizadas no artigo:

  • AMR: Resistência Antimicrobiana (Antimicrobial Resistance) 1
  • CA-MRSA: Staphylococcus aureus resistente à meticilina adquirido na comunidade (community-acquired Methicillin-resistant Staphylococcus aureus) 1
  • CDI: Infecção por Clostridioides difficile (Clostridioides difficile Infection) 2
  • CI: Intervalo de Confiança (Confidence Interval) 1
  • C. difficile: Clostridioides difficile 1
  • CP: Produtores de Carbapenemase (Carbapenemase-producing) 3
  • CRAB: Acinetobacter baumannii resistente a carbapenêmicos (Carbapenem-resistant Acinetobacter baumannii) 4
  • CRE: Enterobacterales resistentes a carbapenêmicos (Carbapenem-resistant Enterobacterales) 1
  • E. coli: Escherichia coli 1
  • ESBL: Beta-Lactamase de Espectro Estendido (Extended-Spectrum Beta-Lactamase) 1
  • HA-MRSA: Staphylococcus aureus resistente à meticilina adquirido em hospital (hospital-acquired Methicillin-resistant Staphylococcus aureus) 1
  • HCU: Unidade de Cuidados Intensivos (High Care Unit) 1
  • HHSAF: Estrutura de Autoavaliação de Higiene das Mãos da OMS (WHO Hand Hygiene Self-Assessment Framework) 1
  • HPV: Vapor de Peróxido de Hidrogênio (Hydrogen Peroxide Vapor) 4
  • ICU: Unidade de Terapia Intensiva (Intensive Care Unit) 1
  • ILPIs: Instituições de Longa Permanência (Long-Term Care Facilities) 1
  • IPCAF: Estrutura de Avaliação de Prevenção e Controle de Infecção (Infection Prevention and Control Assessment Framework) 1
  • IQR: Intervalo Interquartil (Interquartile Range) 1
  • IRAS: Infecções Relacionadas à Assistência à Saúde (Healthcare-Associated Infections)
  • MDROs: Microrganismos Multirresistentes (Multidrug-resistant organisms) 1
  • MLST: Tipagem de Sequência Multilocus (Multi-locus sequencing typing) 1
  • MRSA: Staphylococcus aureus resistente à meticilina (Methicillin-resistant Staphylococcus aureus) 1
  • MRS: Staphylococcus resistente à meticilina (Methicillin-resistant Staphylococcus) 3
  • ONT: Oxford Nanopore Technologies 5
  • OR: Razão de Chances (Odds Ratio) 1
  • ORF: Quadro de Leitura Aberta (Open-reading frame) 1
  • PA-DTR: Pseudomonas aeruginosa com resistência de difícil tratamento (Pseudomonas aeruginosa with difficult-to-treat resistance) 1
  • PCR: Reação em Cadeia da Polimerase (Polymerase Chain Reaction) 1
  • PFGE: Eletroforese em Campo Pulsado (Pulsed-field gel electrophoresis) 1
  • POT: Tipagem de Quadro de Leitura Aberta Baseada em PCR (PCR-based Open-reading frame Typing) 1
  • SNP: Polimorfismo de Nucleotídeo Único (Single Nucleotide Polymorphism) 1
  • ST: Tipo de Sequência (Sequence Type) 1
  • VRE: Enterococos resistentes à vancomicina (Vancomycin-resistant Enterococci) 1
  • WGS: Sequenciamento de Genoma Completo (Whole Genome Sequencing) 1
  • WHO: Organização Mundial da Saúde (World Health Organization) 1

 

Adento: Explicando o método POT

O método POT (PCR-based Open-reading frame Typing), ou Tipagem de Quadro de Leitura Aberta Baseada em PCR, é uma técnica inovadora de caracterização genética desenvolvida no Japão, utilizada para detectar polimorfismos no DNA de microrganismos.1

Em sua essência, o método POT funciona da seguinte forma:

  • Detecção de ORFs: Ele identifica a presença ou ausência de aproximadamente 20 “Open Reading Frames” (ORFs) específicos, que são sequências de DNA que podem ser traduzidas em proteínas. Essa detecção é realizada por meio de uma técnica de PCR multiplex.1
  • Determinação dos ORFs-alvo: Os ORFs que servem como alvo para o teste são definidos a partir de uma análise comparativa das sequências genômicas completas de múltiplas cepas da espécie bacteriana em questão.1
  • Geração de Códigos POT: Os resultados obtidos a partir dos padrões de bandas eletroforéticas (que indicam a presença ou ausência dos ORFs) são convertidos em códigos numéricos, como POT1-POT2(-POT3). Essa combinação de valores numéricos representa o perfil genético da cepa analisada.1

Vantagens do Método POT:

  • Rapidez: Uma das principais vantagens do POT é a sua agilidade. Ele pode fornecer resultados em aproximadamente meio dia, o que é significativamente mais rápido do que outras técnicas de tipagem molecular, como a eletroforese em campo pulsado (PFGE), que pode levar vários dias.1
  • Padronização: O método utiliza kits comercialmente disponíveis, o que facilita a padronização dos procedimentos e minimiza a variabilidade entre diferentes examinadores, devido à representação numérica dos tipos POT.1
  • Capacidade de Identificação: Embora possa ser inferior à análise de polimorfismos de nucleotídeo único (SNP) via sequenciamento de genoma completo (WGS) em termos de capacidade discriminatória para análise filogenética, o POT é considerado equivalente a métodos como PFGE e MLST (Multi-locus sequencing typing).1

Limitações do Método POT:

  • ORFs Predeterminados: Uma limitação notável é que o método se restringe à detecção de ORFs específicos e predeterminados. Isso pode reduzir sua capacidade de diferenciar cepas novas ou incomuns que não foram antecipadas durante o desenvolvimento do kit.1
  • Resolução Filogenética: Como mencionado, sua capacidade discriminatória pode ser inferior à análise de SNP usando WGS para análises filogenéticas mais detalhadas.1

Aplicação no Estudo de Saito et al.:

No artigo em questão, o método POT foi empregado para a análise epidemiológica molecular de isolados de Staphylococcus aureus resistente à meticilina (MRSA), Escherichia coli produtora de Beta-Lactamase de Espectro Estendido (ESBL E. coli) e Clostridioides difficile (C. difficile). O estudo utilizou kits POT específicos para cada um desses patógenos.

A singularidade da aplicação do POT neste estudo reside no fato de que ele foi utilizado para avaliar a transmissão intrainstitucional de microrganismos multirresistentes (MDROs) em um hospital durante períodos sem surtos e para investigar a disseminação de MDROs no ambiente pré-hospitalar, o que é uma abordagem inovadora para a ferramenta.1

 

Autor da sinopse comentada:

Antonio Tadeu Fernandes:

https://www.linkedin.com/in/mba-gest%C3%A3o-ccih-a-tadeu-fernandes-11275529/

https://www.instagram.com/tadeuccih/

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