Que medidas reduziram significativamente a colonização por Acinetobacter baumannii resistente a carbapenêmicos (CRAB). Continuando a polêmica sobre pesquisa de portadores e seu isolamento.
FAQ: Controle de Infecções por Acinetobacter baumannii Resistente a Carbapenêmicos (CRAB)
1. O que é o Acinetobacter baumannii e por que é um patógeno tão preocupante em hospitais?
Acinetobacter baumannii é uma bactéria Gram-negativa oportunista, extremamente adaptada ao ambiente hospitalar. Sua preocupação reside na sua capacidade intrínseca de sobreviver por longos períodos em superfícies secas e equipamentos, e na sua impressionante habilidade de adquirir resistência a múltiplos antibióticos.
- Referência: Controle de Infecções por Acinetobacter baumannii Resistente a Carbapenêmicos – ccih.med.br
2. O que significa ser “resistente a carbapenêmicos” (CRAB) e por que isso é tão grave?
Os carbapenêmicos (ex: Meropenem, Imipenem) são uma classe de antibióticos de amplo espectro, frequentemente usados como última linha de tratamento para infecções graves. Quando o Acinetobacter se torna resistente a eles (CRAB), as opções terapêuticas se tornam extremamente limitadas, muitas vezes exigindo o uso de drogas mais tóxicas e menos eficazes, o que eleva as taxas de mortalidade.
- Referência: Microrganismos Multirresistentes – ccih.med.br
3. Quais pacientes estão em maior risco de adquirir uma infecção por CRAB?
Os pacientes de maior risco são aqueles gravemente enfermos, internados em Unidades de Terapia Intensiva (UTIs), em ventilação mecânica, com dispositivos invasivos (cateteres venosos centrais, sondas vesicais), com internação prolongada e que fizeram uso prévio e extensivo de antibióticos, especialmente carbapenêmicos.
4. Como o CRAB é transmitido no ambiente de saúde?
A transmissão ocorre primariamente por contato indireto. As mãos dos profissionais de saúde se contaminam ao tocar em pacientes colonizados/infectados ou em superfícies e equipamentos contaminados (bombas de infusão, monitores, grades da cama), e a bactéria é então levada para outros pacientes.
- Referência: Controle de Infecções por Acinetobacter baumannii Resistente a Carbapenêmicos – ccih.med.br
5. Quais são os componentes essenciais de um “bundle” de prevenção e controle de CRAB?
Um bundle eficaz para o controle de CRAB deve incluir, no mínimo: 1) Higiene rigorosa das mãos; 2) Implementação de Precauções de Contato; 3) Limpeza e desinfecção terminal e concorrente do ambiente; 4) Coorte de pacientes e de profissionais de saúde; 5) Culturas de vigilância (screening) e 6) Programa de Antimicrobial Stewardship.
- Referência: Nota Técnica GVIMS/GGTES/ANVISA Nº 01/2013 – Medidas de prevenção e controle de infecções por enterobactérias multirresistentes (Nota: Princípios aplicáveis a outros multirresistentes como Acinetobacter)
6. Que tipo de precaução é necessária para um paciente com CRAB?
É mandatório implementar Precauções de Contato. Isso significa que, além das precauções padrão, todo profissional deve usar avental e luvas ao entrar no quarto do paciente. O paciente deve, preferencialmente, ser alocado em quarto privativo.
7. Por que a limpeza e desinfecção do ambiente são tão cruciais para o controle de CRAB?
Devido à sua notável capacidade de sobreviver em superfícies inanimadas por dias ou semanas, o ambiente se torna um reservatório contínuo para a bactéria. Uma limpeza inadequada permite que o CRAB persista e seja uma fonte constante de transmissão cruzada. A fricção mecânica durante a limpeza é tão importante quanto o produto químico utilizado.
8. O que é o “screening” ou culturas de vigilância para CRAB?
É a coleta de amostras (geralmente swab retal ou de outras áreas) de pacientes assintomáticos, mas que são considerados de alto risco (ex: contatos de um caso positivo, transferidos de outra instituição), para identificar se eles estão colonizados pela bactéria. A identificação precoce permite o isolamento e previne a disseminação.
- Referência: Controle de Infecções por Acinetobacter baumannii Resistente a Carbapenêmicos – ccih.med.br
9. Qual o papel do médico na prevenção e controle do CRAB?
O médico é fundamental no uso criterioso de antibióticos e dispositivos invasivos. Ele deve seguir as diretrizes do programa de Antimicrobial Stewardship, evitar o uso desnecessário de carbapenêmicos, solicitar a remoção de cateteres e outros dispositivos assim que possível e comunicar prontamente os casos à CCIH.
10. Como a equipe de enfermagem lidera o combate ao CRAB na unidade?
A enfermagem lidera garantindo a adesão consistente às precauções de contato por toda a equipe, realizando a higiene correta das mãos, supervisionando a limpeza do ambiente, e servindo como a principal barreira de contenção. A liderança do enfermeiro da unidade é vital para o sucesso do controle.
11. Qual a contribuição do farmacêutico clínico?
O farmacêutico é o pilar do Antimicrobial Stewardship. Ele analisa as prescrições, discute com a equipe médica as melhores opções terapêuticas (muitas vezes combinações de drogas), monitora o consumo de antibióticos na instituição e auxilia na otimização da terapia para infecções por CRAB, visando o melhor desfecho com a menor toxicidade.
12. Quais as principais infecções causadas por Acinetobacter baumannii?
As mais comuns são a pneumonia associada à ventilação mecânica (PAV) e as infecções da corrente sanguínea (ICS), especialmente em pacientes com cateteres venosos centrais. Também pode causar infecções de feridas cirúrgicas, do trato urinário e meningite.
13. Quais são as opções de tratamento para infecções por CRAB?
O tratamento é extremamente desafiador e geralmente requer terapia combinada. As opções podem incluir polimixinas (Polimixina B ou Colistina), muitas vezes associadas a outros agentes como tigeciclina, aminoglicosídeos ou até mesmo um carbapenêmico em altas doses (se houver sensibilidade parcial). A decisão deve ser individualizada e baseada no antibiograma.
14. A higiene das mãos com álcool em gel é eficaz contra o Acinetobacter?
Sim. O álcool em gel é eficaz e deve ser a prática padrão para a higiene das mãos antes e depois do contato com o paciente ou seu ambiente. A lavagem com água e sabão é indicada apenas quando as mãos estiverem visivelmente sujas.
15. O que é “coorte” de pacientes e de equipe?
Coorte de pacientes é a prática de agrupar, no mesmo quarto ou na mesma área da unidade, todos os pacientes com o mesmo microrganismo (neste caso, CRAB). Coorte de equipe é designar uma equipe de enfermagem para cuidar exclusivamente desses pacientes, evitando que cuidem de outros pacientes não colonizados/infectados.
- Referência: Surto em UTI: O que fazer? – YouTube CCIH Cursos
16. Quando um aumento de casos de CRAB é considerado um surto?
Um surto é definido como a ocorrência de um número de casos (ou a identificação de um único caso, dependendo do perfil do hospital) acima do esperado (da média histórica ou linha de base). A identificação de transmissão cruzada (dois ou mais casos ligados epidemiologicamente) também caracteriza um surto.
17. Equipamentos como celulares e estetoscópios podem transmitir CRAB?
Sim. Equipamentos de uso pessoal e de cuidado ao paciente que são levados de um leito para outro (estetoscópios, celulares, tablets, termômetros) são fômites importantes na transmissão do CRAB se não forem devidamente desinfectados entre cada paciente.
- Referência: Contaminação em Pias Hospitalares: Quais os Riscos para a Segurança do Paciente? – YouTube CCIH Cursos (Nota: O princípio da contaminação de superfícies é o mesmo)
18. Qual a diferença entre colonização e infecção por CRAB?
Colonização é a presença da bactéria no corpo do paciente (na pele, no trato respiratório ou digestivo) sem causar sinais ou sintomas de doença. Infecção ocorre quando a bactéria invade os tecidos e provoca uma resposta inflamatória e sinais clínicos. Pacientes colonizados são o principal reservatório para a transmissão.
- Referência: Colonization and Infection: What’s the Difference? – Society for Healthcare Epidemiology of America (SHEA)
19. É obrigatório notificar a identificação de CRAB para as autoridades sanitárias?
Sim. A identificação de microrganismos com perfis de resistência de importância epidemiológica, como bactérias resistentes aos carbapenêmicos, deve ser notificada à CCIH, que por sua vez, tem a responsabilidade de comunicar à vigilância epidemiológica e à Anvisa, especialmente em caso de surtos.
20. Onde encontrar as diretrizes oficiais da Anvisa para controle de bactérias multirresistentes?
As diretrizes e notas técnicas da Anvisa, que estabelecem as medidas de prevenção e controle de infecções por microrganismos multirresistentes em serviços de saúde no Brasil, podem ser encontradas em seu portal oficial.
A crescente incidência de infecções nosocomiais causadas pelo Acinetobacter baumannii resistente a carbapenêmicos (CRAB) representa um desafio significativo para instituições de saúde em todo o mundo. Este patógeno oportunista é notório por sua capacidade de sobreviver em ambientes hospitalares e desenvolver resistência a múltiplos antibióticos, tornando essencial a adoção de estratégias eficazes de controle de infecção.
Importância do Tema
O CRAB está associado a infecções graves, como bacteremia, pneumonia associada à ventilação mecânica e infecções de feridas cirúrgicas. A Organização Mundial da Saúde (OMS) classificou o CRAB como um dos patógenos prioritários para pesquisa e desenvolvimento de novas terapias e medidas de prevenção, devido à sua alta taxa de mortalidade e resistência antimicrobiana.
Conhecimento Prévio sobre o Tema
Antes da implementação de intervenções multicamadas, as medidas de controle de infecção para CRAB incluíam precauções de contato, higiene das mãos e limpeza ambiental. No entanto, a eficácia dessas medidas isoladas era limitada, especialmente em unidades de alta dependência (HD) fora das unidades de terapia intensiva (UTI), onde a infraestrutura e a proporção de enfermeiros por paciente não atendem aos padrões das UTIs.
Metodologia de Estudo
Um estudo quase-experimental de séries temporais interrompidas foi conduzido ao longo de 3,5 anos em um centro médico terciário com 1.100 leitos. O estudo foi dividido em quatro fases:
- Pré-intervenção: Vigilância passiva e medidas padrão de controle de infecção.
- Introdução da intervenção: Implementação de limpeza ambiental aprimorada e uso de swabs específicos para amostras ambientais.
- Fase 1 da intervenção: Início da vigilância ativa com triagem de CRAB em três locais anatômicos (pele, orofaringe e reto) para todos os pacientes admitidos nas unidades HD e semanalmente posteriormente.
- Fase 2 da intervenção: Cohortização de pacientes positivos para CRAB em uma unidade HD dedicada, além das medidas anteriores.
Principais Resultados
O estudo incluiu 204 pacientes com isolamento de CRAB, com idade média de 69,8 anos, dos quais 59,8% eram do sexo masculino. Observou-se uma redução significativa na média de casos clínicos de CRAB, de 0,89 na fase pré-intervenção para 0,11 ao final da fase 2. Houve uma mudança significativa na inclinação e no nível após a intervenção, com valores de P = 0,02 e P = 0,004, respectivamente. Além disso, a positividade das culturas ambientais diminuiu significativamente em todas as áreas avaliadas durante a fase 2.
Conclusões dos Autores
A intervenção multicamadas, que incluiu limpeza ambiental aprimorada, vigilância ativa e cohortização de pacientes positivos, foi eficaz na redução da aquisição de CRAB em unidades de medicina interna e suas unidades HD não-UTI. Os autores destacam a importância de estratégias integradas e escalonadas para o controle de patógenos multirresistentes em ambientes hospitalares.
Fatores Limitantes e Possíveis Confundidores
As limitações do estudo incluem a especificidade do ambiente hospitalar estudado, o que pode limitar a generalização dos resultados para outras instituições. Além disso, a coincidência da introdução da intervenção com o início da pandemia de COVID-19 pode ter influenciado os resultados, devido às mudanças nas práticas de controle de infecção durante esse período.
Recomendações dos Autores
Os autores recomendam a implementação de intervenções multicamadas em ambientes hospitalares, especialmente em unidades de alta dependência, para controlar a disseminação de patógenos multirresistentes como o CRAB. Eles enfatizam a necessidade de vigilância ativa, limpeza ambiental rigorosa e cohortização de pacientes positivos como componentes essenciais dessas estratégias.
Comentários Adicionais e nossa opinião
Este estudo reforça a eficácia de abordagens integradas e escalonadas no controle de infecções hospitalares por patógenos multirresistentes. A adaptação de estratégias de controle de infecção às especificidades de cada unidade hospitalar é crucial para o sucesso na redução da transmissão de microrganismos resistentes.
Ao nosso ver os efeitos da pandemia sobre as práticas de controle e prevenção de infecção podem ter sido responsáveis por mudanças epidemiológicas importantes no padrão das infecções hospitalares, sendo um confundidor importantíssimo neste estudo, que apesar de resultados significativos ainda deixa em branco uma resposta importante sobre a pergunta se devemos ou não pesquisar e isolar pacientes colonizados por CRAB.
Fonte:
GRUPEL, D.; BORER, A.; YOSIPOVICH, R.; NATIV, R.; SAGI, O.; SAIDEL-ODES, L. A multilayered infection control intervention on carbapenem-resistant Acinetobacter baumannii acquisition: An interrupted time series. American Journal of Infection Control, [s.l.], v. 53, p. 98-104, 2025. https://doi.org/10.1016/j.ajic.2024.08.018
Fontes relacionadas:
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Disponível em: https://doi.org/10.1017/ice.2020.117
PASCALÉ, R. et al. Carbapenem-resistant bacteria in an intensive care unit during the coronavirus disease 2019 (COVID-19) pandemic: a multicenter before-and-after cross-sectional study. Infection Control and Hospital Epidemiology, v. 43, p. 461–466, 2022.
Disponível em: https://doi.org/10.1017/ice.2021.93
BIENKOWSKI, C. et al. Successful control of an outbreak of carbapenem-resistant Acinetobacter baumannii in a neonatal intensive care unit. American Journal of Infection Control, v. 47, n. 11, p. 1296–1300, 2019.
Disponível em: https://doi.org/10.1016/j.ajic.2019.04.182
SILVA, Bruna Rocha da. Adesão dos profissionais de saúde às medidas de precaução na prevenção da transmissão de microrganismos multirresistentes por contato direto. 2019. Dissertação (Mestrado em Enfermagem) – Universidade Federal de Minas Gerais, Belo Horizonte, 2019.
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IDSA 2024 – Acinetobacter resistente aos carbapenêmicos
https://www.ccih.med.br/idsa-2024-acinetobacter-resistente-aos-carbapenemicos/
Vale a pena fazer busca ativa para Acinetobacter baumannii resistente a carbapenêmicos (CRAB)?
https://www.ccih.med.br/vale-a-pena-fazer-busca-ativa-para-acinetobacter-baumannii-resistente-a-carbapenemicos-crab/
Opções terapêuticas para resistência aos carbapenêmicos
https://www.ccih.med.br/opcoes-terapeuticas-para-resistencia-aos-carbapenemicos/
ANVISA avalia a evolução da resistência aos carbapenêmicos no Brasil de 2015 a 2022
https://www.ccih.med.br/anvisa-avalia-a-evolucao-da-resistencia-aos-carbapenemicos-no-brasil-de-2015-a-2022/
Atualização da Lista de Patógenos Bacterianos Prioritários da OMS.
https://www.ccih.med.br/atualizacao-da-lista-de-patogenos-bacterianos-prioritarios-da-oms/
Nova Diretriz para tratamento de Infecções por Bactérias Gram-negativas resistentes a antimicrobianos da Sociedade Americana de Doenças Infecciosas (IDSA)
https://www.ccih.med.br/nova-diretriz-para-tratamento-de-infeccoes-por-bacterias-gram-negativas-resistentes-a-antimicrobianos-da-sociedade-americana-de-doencas-infecciosas-idsa/
Sinopse por:
Antonio Tadeu Fernandes:
https://www.linkedin.com/in/mba-gest%C3%A3o-ccih-a-tadeu-fernandes-11275529/
https://www.instagram.com/tadeuccih/
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