O retorno dos velhos guerreiros: tetraciclinas e cloranfenicol voltam à linha de frente contra as superbactérias.
Enquanto o mundo busca incessantemente novos antibióticos para conter a escalada da resistência microbiana, um movimento inesperado ganha força: a revalorização estratégica de fármacos antigos. Tetraciclinas e cloranfenicol — outrora relegados ao passado pela toxicidade ou resistência — ressurgem como peças táticas em um tabuleiro dominado por Klebsiella pneumoniae produtora de KPC, Acinetobacter baumannii resistente a carbapenêmicos e MRSA hospitalar.
Mais do que um revival histórico, esse “renascimento” representa uma mudança de paradigma no stewardship antimicrobiano: compreender o ciclo de inovação reativa, reposicionar agentes esquecidos e aprender com o passado para enfrentar o futuro da infectologia hospitalar.
FAQ: O Papel das Tetraciclinas e do Cloranfenicol na Terapia de Infecções por Microrganismos Multirresistentes
Seção 1: Conceitos Fundamentais e Contexto Atual
1. Por que antibióticos “esquecidos”, como as tetraciclinas e o cloranfenicol, estão sendo reavaliados na era da multirresistência?
A reavaliação estratégica de classes de antibióticos mais antigas é um paradoxo que surge da necessidade urgente de encontrar tratamentos para infecções por microrganismos multirresistentes (MDROs). A busca por moléculas inovadoras é demorada e, enquanto isso, a resistência a antibióticos de última linha, como os carbapenêmicos, cresce de forma alarmante. Como esses fármacos mais antigos foram menos utilizados por um longo período, muitos patógenos não foram expostos a eles, preservando sua sensibilidade a essas drogas.
- Referências Adicionais:
- Instituto CCIH+. (s.d.). Resistência aos carbapenêmicos: o desafio crítico da infectologia moderna. CCIH.med.br. Disponível em: https://www.ccih.med.br/resistencia-aos-carbapenemicos-o-desafio-critico-da-infectologia-moderna/
- Wareham, D. W., & Wilson, P. (2011). The renaissance of chloramphenicol. Journal of Antimicrobial Chemotherapy. Disponível em: https://doi.org/10.1093/jac/dkr313
2. Quais são os principais microrganismos multirresistentes (MDROs) que representam um desafio no ambiente hospitalar?
Os principais desafios são as infecções relacionadas à assistência à saúde (IRAS) causadas por MDROs como as Enterobacterales produtoras de carbapenemases (EPC), incluindo a Klebsiella pneumoniae produtora de KPC, e o Acinetobacter baumannii resistente a carbapenêmicos (CRAB). Além destes, o Staphylococcus aureus resistente à meticilina (MRSA) continua a ser uma das principais causas de IRAS.
- Referências Adicionais:
- Mezzatesta, M. L. et al. (2011). Klebsiella pneumoniae carbapenemase (KPC) producing K. pneumoniae: a new threat for the nosocomial area. European Review for Medical and Pharmacological Sciences. Disponível em: https://www.europeanreview.org/wp/wp-content/uploads/294.pdf
- Castro, A. P. de, et al. (2022). Mecanismos envolvidos na resistência a carbapenémicos entre isolados de Acinetobacter baumannii recuperados no Brasil. Revista Colombiana de Ciencias Químico-Farmacéuticas. Disponível em: https://doi.org/10.15446/rcciquifa.v51n2.96918
3. O que é “Antimicrobial Stewardship” e por que é fundamental ao usar esses antibióticos?
“Antimicrobial Stewardship” é um conjunto de estratégias coordenadas para melhorar o uso de antimicrobianos, com o objetivo de otimizar os desfechos clínicos e minimizar consequências não intencionais, como toxicidade e seleção de resistência. Para antibióticos como as tetraciclinas e o cloranfenicol, o stewardship é crucial para posicioná-los de forma inteligente, evitando o uso indiscriminado, escolhendo o fármaco certo para o patógeno e o sítio de infecção corretos, e preservando sua eficácia para o futuro.
- Referências Adicionais:
- Instituto CCIH+. (s.d.). Estrutura molecular da resistência microbiana: como a medicina moderna é desafiada e o que fazer. CCIH.med.br. Disponível em: https://www.ccih.med.br/estrutura-molecular-da-resistencia-microbiana-como-a-medicina-moderna-e-desafiada-e-o-que-fazer/
- Instituto CCIH+ (YouTube). O que é Stewardship de Antimicrobianos?. Disponível em: https://www.youtube.com/watch?v=k-brolX-5hI
Seção 2: Farmacologia e Mecanismos de Ação/Resistência
4. Como as tetraciclinas atuam contra as bactérias? Elas são bactericidas ou bacteriostáticas?
As tetraciclinas e seus derivados exercem sua atividade ao se ligarem de forma reversível à subunidade ribossomal 30S da bactéria. Essa ligação impede que novos aminoácidos se encaixem para formar proteínas, interrompendo a síntese proteica. Como essa ação é reversível, o efeito é primariamente bacteriostático, inibindo o crescimento e a replicação bacteriana sem necessariamente causar a morte celular imediata.
- Referências Adicionais:
- Chopra, I., & Roberts, M. (2001). Tetracycline Antibiotics: Mode of Action, Applications, Molecular Biology, and Epidemiology of Bacterial Resistance. Microbiology and Molecular Biology Reviews. Disponível em: https://doi.org/10.1128/MMBR.65.2.232-260.2001
5. Qual a diferença do mecanismo de ação do cloranfenicol em comparação com as tetraciclinas?
Apesar de ambos inibirem a síntese proteica, o alvo é diferente. Enquanto as tetraciclinas se ligam à subunidade 30S, o cloranfenicol se liga à subunidade 50S. Ao fazer isso, ele inibe a enzima peptidil transferase, essencial para formar as ligações entre os aminoácidos. Embora majoritariamente bacteriostático, pode ser bactericida em altas concentrações contra patógenos específicos como H. influenzae e S. pneumoniae.
- Referências Adicionais:
- Singhal, M., et al. (2023). Chloramphenicol and tetracycline (broad spectrum antibiotics). In Antibiotics – Therapeutic Spectrum and Limitations. Academic Press. Disponível em: https://doi.org/10.1016/B978-0-323-95388-7.00018-8
6. Quais são os principais mecanismos de resistência bacteriana às tetraciclinas de primeira geração?
Os dois principais mecanismos são:
- Bombas de efluxo ativo: Proteínas na membrana da bactéria que expulsam ativamente o antibiótico de dentro da célula, impedindo que ele atinja seu alvo.
- Proteínas de proteção ribossômica: Proteínas que se ligam ao ribossomo e deslocam a tetraciclina de seu sítio de ligação, permitindo que a síntese proteica continue.
- Referências Adicionais:
- Instituto CCIH+. (s.d.). Mecanismos de resistência bacteriana: o que preciso saber?. CCIH.med.br. Disponível em: https://www.ccih.med.br/mecanismos-de-resistencia-bacteriana-o-que-preciso-saber/
- Speer, B. S., et al. (1992). Bacterial resistance to tetracycline: mechanisms, transfer, and clinical importance. Clinical Microbiology Reviews. Disponível em: https://doi.org/10.1128/cmr.5.4.387
7. Como os derivados modernos (ex: tigeciclina) foram desenhados para superar esses mecanismos de resistência?
A tigeciclina foi projetada com uma modificação estrutural (um grupo glicilamido) que a torna um substrato pobre para a maioria das bombas de efluxo e proteínas de proteção ribossômica. Essa alteração explica sua atividade contra muitas bactérias que já são resistentes às tetraciclinas de primeira e segunda geração.
- Referências Adicionais:
- Grossman, T. H. (2016). Tetracycline Antibiotics and Resistance. Cold Spring Harbor Perspectives in Medicine. Disponível em: https://doi.org/10.1101/cshperspect.a025387
Seção 3: Guia de Fármacos Específicos
Doxiciclina e Minociclina
8. Qual o principal papel da doxiciclina e da minociclina no tratamento de infecções hospitalares?
Seu papel consolidado é no tratamento de infecções de pele e tecidos moles (SSTI) não complicadas, suspeitas ou confirmadas por Staphylococcus aureus resistente à meticilina de origem comunitária (CA-MRSA). São também excelentes opções para terapia de descalonamento (transição de tratamento IV para oral) em pacientes estáveis com infecções por MRSA de origem hospitalar (HA-MRSA) em sítios não bacteriêmicos, desde que o isolado seja sensível.
- Referências Adicionais:
- Liu, C., et al. (2011). Clinical Practice Guidelines by the Infectious Diseases Society of America for the Treatment of Methicillin-Resistant Staphylococcus aureus Infections in Adults and Children. Clinical Infectious Diseases. Disponível em: https://doi.org/10.1093/cid/ciq146
9. Doxiciclina ou minociclina podem ser usadas para infecções graves por MRSA, como pneumonia ou bacteremia?
Não como primeira linha. A evidência para o uso em infecções graves por HA-MRSA, como pneumonia ou bacteremia, é limitada. Nesses cenários, agentes intravenosos como a vancomicina, linezolida ou daptomicina permanecem como o tratamento padrão-ouro.
- Referências Adicionais:
- Johns Hopkins ABX Guide. (s.d.). Staphylococcus aureus. Hopkins Guides. Disponível em: https://www.hopkinsguides.com/hopkins/view/Johns_Hopkins_ABX_Guide/540518/all/Staphylococcus_aureus
10. Quais as vantagens da doxiciclina e minociclina para um programa de stewardship?
A principal vantagem é a excelente biodisponibilidade oral e as longas meias-vidas, que facilitam o descalonamento da terapia intravenosa para oral. Isso permite a alta hospitalar precoce, reduzindo custos e riscos associados ao uso de cateteres, pilares de um programa de stewardship.
- Referências Adicionais:
- Esposito, S., et al. (2020). Treatment of skin and soft-tissue infections: a focus on the role of doxycycline. Journal of Antimicrobial Chemotherapy. Disponível em: https://doi.org/10.1093/jac/dkaa102
Tigeciclina
11. Por que a tigeciclina é controversa, especialmente no tratamento de pneumonias?
A controvérsia vem de um alerta de segurança da FDA que apontou um aumento no risco de mortalidade, especialmente em pacientes com pneumonia associada à ventilação mecânica (PAV). A raiz do problema está em seu perfil farmacocinético: ela se distribui amplamente pelos tecidos, mas atinge concentrações séricas muito baixas, o que é inadequado para tratar infecções na corrente sanguínea ou pulmonares graves.
- Referências Adicionais:
- Salam, M. A., et al. (2022). Tigecycline for the treatment of adult patients with hospital-acquired pneumonia. Journal of Global Antimicrobial Resistance. Disponível em: https://doi.org/10.1016/j.jgar.2022.05.011
12. O que é e qual a lógica do regime de “alta dose” de tigeciclina? Ele é mais eficaz?
O regime de alta dose (HDT – 100 mg de 12/12h após dose de ataque de 200 mg) foi proposto para compensar as baixas concentrações séricas. A lógica é aumentar a exposição do fármaco no local da infecção. Meta-análises recentes sugerem que o HDT está associado a uma menor mortalidade e maior taxa de cura clínica, sem aumento significativo de eventos adversos.
- Referências Adicionais:
- Ni, W., et al. (2020). High-dose tigecycline in the treatment of severe infections: a systematic review and meta-analysis. Medicine. Disponível em: https://doi.org/10.1097/MD.0000000000020076
13. A tigeciclina deve ser usada para tratar infecções da corrente sanguínea (bacteremia)?
Não como monoterapia. Devido às suas concentrações séricas muito baixas, a tigeciclina é considerada uma má escolha para o tratamento de infecções intravasculares, como a bacteremia primária, e seu uso deve ser evitado nesse cenário.
- Referências Adicionais:
- MSD Manuals. (s.d.). Tigeciclina. Manual MSD Versão para Profissionais. Disponível em: https://www.msdmanuals.com/pt/profissional/doen%C3%A7as-infecciosas/bact%C3%A9rias-e-medicamentos-antibacterianos/tigeciclina
14. Para quais tipos de infecção a tigeciclina (em alta dose) seria uma opção mais segura?
O uso da tigeciclina em alta dose (HDT) deve ser considerado para infecções por MDROs (como KPC e CRAB) em locais onde ela atinge boa concentração, como em infecções intra-abdominais complicadas e infecções de pele e tecidos moles complicadas.
- Referências Adicionais:
- Falagas, M. E., & Vardakas, K. Z. (2009). High-dose tigecycline for the treatment of severe infections by multidrug-resistant bacteria. Current Opinion in Investigational Drugs. (Resumo disponível em bases de dados como PubMed).
Eravaciclina e Omadaciclina (Nova Geração)
15. Qual a principal vantagem da eravaciclina sobre a tigeciclina?
A principal vantagem da eravaciclina é sua potente atividade contra patógenos Gram-negativos multirresistentes, sendo geralmente superior à da tigeciclina contra Acinetobacter baumannii resistente a carbapenêmicos (CRAB) e Enterobacterales produtoras de carbapenemases (EPC). Ela está posicionada para o tratamento de infecções hospitalares graves por esses patógenos.
- Referências Adicionais:
- Zhanel, G. G., et al. (2024). Eravacycline: A Comprehensive Review of In Vitro Activity, Clinical Efficacy, and Real-World Applications. Drugs. Disponível em: https://doi.org/10.21203/rs.3.rs-4267073/v1
16. Qual a vantagem estratégica da omadaciclina em relação à eravaciclina?
A grande vantagem estratégica da omadaciclina é a disponibilidade de formulações intravenosa e oral. Isso permite o descalonamento terapêutico (transição de IV para oral) de forma segura e eficaz, um pilar do antimicrobial stewardship que a eravaciclina (apenas IV) não oferece.
- Referências Adicionais:
- Abreu, A. C., et al. (2023). A Review of Omadacycline for Potential Utility in the Military Health System for the Treatment of Wound Infections. Military Medicine. Disponível em: https://doi.org/10.1093/milmed/usad432
17. Em que cenário clínico a eravaciclina seria a escolha preferencial?
A eravaciclina é a escolha preferencial para infecções graves e exclusivamente hospitalares documentadas por patógenos como CRAB ou KPC, onde não há expectativa de alta hospitalar precoce ou transição para terapia oral, como em pacientes críticos ou transplantados.
- Referências Adicionais:
- Chen, J., et al. (2024). Clinical efficacy and safety of eravacycline for the treatment of carbapenem-resistant Acinetobacter baumannii infection in lung transplant recipients. Frontiers in Pharmacology. Disponível em: https://doi.org/10.3389/fphar.2024.1386701
18. Quando a omadaciclina seria uma opção mais adequada?
A omadaciclina é ideal quando se antecipa a possibilidade de descalonamento para terapia oral, como em pacientes com infecções de pele e tecidos moles (ABSSSI) ou pneumonia adquirida na comunidade (PAC) que melhoram clinicamente e podem continuar o tratamento em casa.
- Referências Adicionais:
- Solomkin, J., et al. (2017). Omadacycline for Acute Bacterial Skin and Skin Structure Infections. New England Journal of Medicine. Disponível em: https://doi.org/10.1056/NEJMoa1609389
Cloranfenicol
19. Por que o uso do cloranfenicol foi drasticamente reduzido no passado? Quais são suas principais toxicidades?
Seu uso foi reduzido devido a riscos de toxicidade graves:
- Anemia aplástica idiossincrática: Uma supressão rara, imprevisível e frequentemente fatal da medula óssea.
- “Síndrome do bebê cinzento”: Uma condição potencialmente fatal em neonatos devido à sua incapacidade de metabolizar o fármaco.
- Referências Adicionais:
- National Library of Medicine. (s.d.). DailyMed: Chloramphenicol. DailyMed. Disponível em: https://dailymed.nlm.nih.gov/dailymed/drugInfo.cfm?setid=45a6f062-316b-483a-855c-623e387c6b54
20. Qual a justificativa para reconsiderar o uso do cloranfenicol hoje?
A justificativa é que a restrição de seu uso por décadas resultou em uma baixa pressão seletiva. Consequentemente, muitos patógenos que desenvolveram resistência a outras classes de antibióticos permaneceram sensíveis ao cloranfenicol. Estudos recentes mostram taxas de sensibilidade surpreendentemente altas em bacilos Gram-negativos multirresistentes.
- Referências Adicionais:
- Kumar, S., et al. (2016). Chloramphenicol – A Potent Armament Against Multi-Drug Resistant Gram Negative Bacteria. Journal of Clinical and Diagnostic Research. Disponível em: https://doi.org/10.7860/JCDR/2016/18151.7371
21. Qual deve ser o posicionamento do cloranfenicol no arsenal terapêutico hospitalar?
Seu uso deve ser estritamente restrito como terapia de resgate ou de último recurso. Ele deve ser considerado apenas para infecções por patógenos pan-resistentes, onde não há outras alternativas terapêuticas viáveis.
- Referências Adicionais:
- Sfeir, M. (s.d.). Chloramphenicol. Johns Hopkins ABX Guide. Disponível em: https://www.hopkinsguides.com/hopkins/view/Johns_Hopkins_ABX_Guide/540193/all/Chloramphenicol
22. Que monitoramento é obrigatório ao se utilizar cloranfenicol?
É obrigatório um monitoramento hematológico rigoroso e intensivo, incluindo a realização de contagens sanguíneas seriadas (hemograma completo) durante e após o término do tratamento para detectar precocemente qualquer sinal de supressão da medula óssea.
- Referências Adicionais:
- Wareham, D. W., & Wilson, P. (2011). The renaissance of chloramphenicol. Journal of Antimicrobial Chemotherapy. Disponível em: https://doi.org/10.1093/jac/dkr313
Seção 4: Prática Clínica e Recomendações da CCIH
23. Qual a recomendação para tratar infecções de pele e tecidos moles (SSTI) por CA-MRSA?
A doxiciclina e a minociclina, por via oral, são consideradas terapia de primeira linha para SSTIs não complicadas, suspeitas ou confirmadas por CA-MRSA em pacientes ambulatoriais.
- Referências Adicionais:
- Bem, R. A., et al. (2023). Methicillin-Resistant Staphylococcus aureus (MRSA). In StatPearls. Disponível em: https://www.ncbi.nlm.nih.gov/books/NBK482221/
24. Quais bactérias representam uma “lacuna” no espectro de ação das tetraciclinas?
As principais “lacunas”, ou seja, bactérias intrinsecamente resistentes, são: Pseudomonas aeruginosa, Proteus spp. e Morganella spp.. É crucial reconhecer essas resistências intrínsecas ao escolher a terapia empírica.
- Referências Adicionais:
- Moffa, M., & Brook, I. (s.d.). Tetracyclines, Glycylcyclines, and Chloramphenicol. In Antibiotics Therapeutic Spectrum and Limitations.
25. Como a CCIH deve gerenciar a decisão de usar um agente de último recurso como o cloranfenicol?
A decisão deve ser restrita e tomada após discussão em um comitê multidisciplinar (incluindo CCIH, infectologista, farmacêutico clínico). É essencial obter o consentimento informado do paciente sobre os riscos e ter um plano claro de monitoramento hematológico.
- Referências Adicionais:
- Elis, A., et al. (2014). Chloramphenicol in the Era of Increasing Antibiotic Resistance: A National Survey of Israeli Hospitals. The Israel Medical Association Journal. (Resumo disponível em bases de dados como PubMed).
26. Qual a importância do laboratório de microbiologia para o uso racional desses antibióticos?
O laboratório de microbiologia é a pedra angular do stewardship. A implementação de testes de sensibilidade (antibiograma) para esses agentes é essencial para guiar a terapia e confirmar se o patógeno é suscetível. O monitoramento contínuo dos perfis de resistência locais também é fundamental.
- Referências Adicionais:
- Brasil. Agência Nacional de Vigilância Sanitária. (2013). Manual de Microbiologia Clínica para o Controle de Infecção em Serviços de Saúde. ANVISA. Disponível em: https://www.gov.br/anvisa/pt-br/centraisdeconteudo/publicacoes/servicosdesaude/publicacoes/modulo-10_manual-de-microbiologia.pdf
27. Quais são os principais efeitos adversos a serem monitorados com doxiciclina e minociclina?
Um efeito adverso comum e importante é a fotossensibilidade, exigindo que os pacientes evitem a exposição solar. A minociclina, em particular, está associada à toxicidade vestibular, que pode causar tontura e vertigem.
- Referências Adicionais:
- Moffa, M., & Brook, I. (s.d.). Tetracyclines, Glycylcyclines, and Chloramphenicol. In Antibiotics Therapeutic Spectrum and Limitations.
28. O que é a “inovação reativa” mencionada no artigo em relação a essa classe de fármacos?
A “inovação reativa” descreve o padrão onde a emergência de resistência a uma geração de fármacos atua como um catalisador para a engenharia molecular da próxima geração. A resistência que levou ao declínio das tetraciclinas de primeira geração impulsionou o desenvolvimento de moléculas como tigeciclina e eravaciclina, projetadas para contornar esses mecanismos.
- Referências Adicionais:
- Grossman, T. H. (2016). Tetracycline Antibiotics and Resistance. Cold Spring Harbor Perspectives in Medicine. Disponível em: https://doi.org/10.1101/cshperspect.a025387
29. A tigeciclina é uma boa opção para infecções por K. pneumoniae produtora de KPC?
Sim, mas com ressalvas. A tigeciclina tem atividade contra muitas cepas de KPC. No entanto, um estudo retrospectivo em um hospital brasileiro relatou uma alta taxa de falha terapêutica, levantando hipóteses de resistência emergente, distribuição sérica insuficiente em infecções de alta carga bacteriana e uso tardio. O uso de alta dose (HDT) é recomendado para otimizar os desfechos.
- Referências Adicionais:
- Fangueiro, L. de R. et al. (2021). Efetividade da tigeciclina em pacientes admitidos no Hospital Regional Hans Dieter Schmidt. Arquivos Catarinenses de Medicina. Disponível em: https://doi.org/10.63845/zb0j8d49
30. Qual a mensagem final do artigo sobre o papel das tetraciclinas e do cloranfenicol?
A mensagem final é que a classe das tetraciclinas evoluiu de uma classe em declínio para um arsenal estratégico e versátil contra MDROs. Desde a doxiciclina para MRSA, passando pela potência da eravaciclina contra CRAB, até o renascimento cauteloso do cloranfenicol como última linha de defesa, esses agentes oferecem soluções valiosas. A gestão inteligente desses recursos, guiada pelo conhecimento e pelo stewardship, é uma estratégia eficaz contra a crescente resistência microbiana.
- Referências Adicionais:
- Instituto CCIH+ (YouTube). Princípios para o uso de antimicrobianos. Disponível em: https://www.youtube.com/@CCIH/videos (Pesquisar vídeos sobre Stewardship no canal).
Introdução – O Paradoxo dos “Velhos” Antibióticos no Cenário Atual
O avanço implacável da resistência antimicrobiana representa uma das mais graves ameaças à medicina moderna. Infecções relacionadas à assistência à saúde (IRAS) por microrganismos multirresistentes (MDROs), como Enterobacterales produtoras de carbapenemases (EPC, incluindo KPC) e Acinetobacter baumannii resistente a carbapenêmicos (CRAB), desafiam diariamente as equipes de controle de infecção hospitalar (CCIH) e limitam drasticamente o arsenal terapêutico (Ref. 1, 2, 3). Neste cenário de urgência, enquanto a busca por moléculas inovadoras é imperativa, emerge um paradoxo fascinante: a redescoberta e reavaliação estratégica de classes de antibióticos mais antigas. Este artigo propõe uma análise aprofundada da classe das tetraciclinas, seus derivados modernos e agentes de reserva relacionados, como o cloranfenicol, argumentando que eles representam um recurso vital e, por vezes, subutilizado no combate às IRAS.
A narrativa sobre esses fármacos demonstra um padrão de “inovação reativa” na farmacologia. A resistência que levou ao declínio da primeira geração de tetraciclinas (Ref. 4, 5) foi o catalisador direto para a engenharia molecular de novas gerações — como a tigeciclina, eravaciclina e omadaciclina — projetadas especificamente para contornar esses mecanismos de defesa bacteriana (Ref. 4, 6, 7). Compreender essa evolução cíclica é fundamental para um stewardship de antimicrobianos eficaz. Exploraremos aqui os fundamentos farmacológicos, a evidência clínica crítica, os mecanismos de resistência e, por fim, ofereceremos recomendações práticas para posicionar esses agentes de forma inteligente no complexo tabuleiro do tratamento de infecções hospitalares.
Fundamentos Farmacológicos: O Alvo Ribossomal e suas Implicações
O fio condutor que une esta diversa família de antibióticos é seu alvo primário: a maquinaria de síntese proteica da célula bacteriana. Compreender suas nuances farmacológicas é o primeiro passo para seu uso racional.
Mecanismo de Ação Unificador e Distinções
As tetraciclinas e seus derivados mais modernos (glicilciclinas, fluorociclinas) exercem sua atividade ao se ligarem de forma reversível à subunidade ribossomal 30S (Ref. 4, 8). Essa ligação bloqueia o acesso do aminoacil-tRNA ao sítio A do ribossomo, impedindo a adição de novos aminoácidos e, consequentemente, interrompendo o alongamento da cadeia peptídica (Ref. 8). Por ser uma ação reversível, seu efeito é primariamente bacteriostático, ou seja, inibe o crescimento e a replicação bacteriana sem necessariamente causar a morte celular imediata (Ref. 4).
O cloranfenicol, por sua vez, também é um inibidor da síntese proteica, mas seu alvo é a subunidade ribossomal 50S. Ao se ligar a este sítio, ele inibe a enzima peptidil transferase, que é crucial para a formação da ligação peptídica entre os aminoácidos (Ref. 8, 9). Embora também seja majoritariamente bacteriostático, pode exibir atividade bactericida em altas concentrações contra patógenos específicos como Haemophilus influenzae, Streptococcus pneumoniae e Neisseria meningitidis (Ref. 9, 10).
Espectro de Atividade Relevante para IRAS
O valor desses antibióticos no ambiente hospitalar reside em seu espectro de ação, que cobre diversos patógenos-chave em IRAS:
- Gram-positivos: A classe demonstra excelente atividade contra Staphylococcus aureus, incluindo um número significativo de cepas resistentes à meticilina (MRSA), tanto as de origem comunitária (CA-MRSA) quanto as hospitalares (HA-MRSA) (Ref. 4, 11, 12). A doxiciclina e a minociclina, em particular, são frequentemente recomendadas como opções terapêuticas para infecções de pele e tecidos moles por MRSA (Ref. 12, 13).
- Gram-negativos: A atividade é mais variável, mas clinicamente importante. As tetraciclinas de nova geração, como a tigeciclina e a eravaciclina, são notáveis por sua ação contra bactérias Gram-negativas multirresistentes, incluindo Acinetobacter baumannii (mesmo CRAB), Stenotrophomonas maltophilia e muitas Enterobacterales, incluindo cepas produtoras de ESBL e KPC (Ref. 4, 14, 15). É crucial, no entanto, reconhecer as “lacunas” em seu espectro: Pseudomonas aeruginosa, Proteus spp. e Morganella spp. são intrinsecamente resistentes à maioria dos agentes desta classe (Ref. 4, 15).
- Anaeróbios e Atípicos: O espectro também se estende a muitos anaeróbios e patógenos atípicos como Mycoplasma e Chlamydia, o que é relevante em pneumonias e infecções polimicrobianas (Ref. 4).
Análise Farmacocinética e Farmacodinâmica (PK/PD) Comparativa
As diferenças farmacocinéticas entre os membros da classe são profundas e ditam seu nicho terapêutico. A doxiciclina e a minociclina possuem excelente biodisponibilidade oral e longas meias-vidas, facilitando o tratamento ambulatorial e o descalonamento da terapia intravenosa (Ref. 4).
Em contrapartida, a tigeciclina, disponível apenas para administração intravenosa, exibe um perfil PK/PD paradoxal que está na raiz de suas controvérsias clínicas. Ela possui um volume de distribuição extremamente alto (>12 L/kg), o que significa que se distribui amplamente pelos tecidos, atingindo boas concentrações em locais como pulmão, fígado e pele (Ref. 4, 15). No entanto, essa extensa distribuição tecidual resulta em concentrações séricas muito baixas (Ref. 4, 15). Essa característica farmacocinética fundamental explica por que a tigeciclina é considerada uma má escolha para o tratamento de infecções intravasculares, como a bacteremia primária, e por que seu uso em pneumonia, especialmente a pneumonia associada à ventilação mecânica (PAV), é altamente debatido. A dificuldade em atingir concentrações eficazes no sangue e no fluido do revestimento epitelial pulmonar levou diretamente à investigação de regimes de alta dose como uma estratégia para compensar essa deficiência e melhorar os desfechos clínicos (Ref. 16, 17, 18).
Análise Crítica da Evidência Clínica e do Posicionamento Terapêutico
A aplicação clínica desses antibióticos requer uma análise criteriosa das evidências, ponderando eficácia, segurança e o contexto específico de cada tipo de infecção e patógeno.
Doxiciclina e Minociclina: O Papel Consolidado contra MRSA
O MRSA continua sendo uma das principais causas de IRAS, e a distinção entre cepas de origem hospitalar (HA-MRSA) e comunitária (CA-MRSA) é importante devido a perfis de sensibilidade distintos (Ref. 12, 19). As diretrizes clínicas e a prática consolidaram o uso de doxiciclina e minociclina, principalmente por via oral, como terapia de primeira linha para infecções de pele e tecidos moles (SSTI) não complicadas, suspeitas ou confirmadas por CA-MRSA (Ref. 12, 13, 20, 21).
A evidência para seu uso em infecções graves por HA-MRSA, como pneumonia ou bacteremia, é mais limitada. Nestes cenários, a vancomicina ou outros agentes como a linezolida e a daptomicina permanecem como padrão-ouro (Ref. 12, 20). O papel mais apropriado para a doxiciclina e a minociclina em infecções por HA-MRSA é como terapia de descalonamento (oralização) para pacientes clinicamente estáveis com infecções não bacteriêmicas ou para completar o tratamento após um curso inicial de terapia intravenosa, sempre guiado por testes de suscetibilidade (Ref. 20, 22).
Tigeciclina: A Glicilciclina de Promessas e Controvérsias
A tigeciclina foi aprovada com base em estudos de não inferioridade para infecções intra-abdominais complicadas (cIAI) e infecções de pele e tecidos moles complicadas (cSSSI) (Ref. 4). Contudo, sua trajetória clínica tem sido marcada por um alerta de segurança emitido pela FDA em 2010, que apontou um aumento no risco de mortalidade em comparação com outros antibióticos, especialmente em pacientes com PAV (Ref. 4, 23).
É crucial contextualizar que este alerta foi baseado em análises de estudos que utilizaram a dose padrão (SDT) de tigeciclina (50 mg de 12/12h após dose de ataque de 100 mg). A hipótese de que essa dose seria subótima para infecções graves, devido ao perfil PK/PD desfavorável, ganhou força e motivou novas pesquisas. Uma meta-análise recente que comparou o regime de alta dose (HDT – 100 mg de 12/12h após dose de ataque de 200 mg) com a dose padrão ou outros antibióticos trouxe novos insights: o uso de HDT foi associado a uma menor mortalidade por todas as causas, maior taxa de cura clínica e maior erradicação microbiológica, sem um aumento significativo de eventos adversos (Ref. 18, 24). Outra meta-análise focada em PAV por bactérias multirresistentes também sugeriu que a dose alta melhora a taxa de cura (Ref. 17).
Apesar desses dados promissores, a qualidade da evidência ainda é majoritariamente de estudos observacionais, e o uso da tigeciclina em pneumonia hospitalar (HAP) e PAV permanece off-label e controverso (Ref. 16). Um estudo retrospectivo em um hospital brasileiro, por exemplo, relatou uma alta taxa de falha terapêutica (64,63%) com tigeciclina em infecções por KPC e A. baumannii, levantando hipóteses de resistência emergente, distribuição sérica insuficiente em infecções de alta carga bacteriana e uso tardio em pacientes graves (Ref. 25, 26).
Cloranfenicol: O Retorno do Agente de Reserva
O uso do cloranfenicol foi drasticamente reduzido por décadas devido aos seus riscos de toxicidade graves e históricos: a anemia aplástica idiossincrática, que é rara mas frequentemente fatal, e a “síndrome do bebê cinzento” em neonatos (Ref. 4, 9, 27, 28). Essa restrição, no entanto, gerou uma consequência inesperada e clinicamente relevante na era da multirresistência.
O status do cloranfenicol como um “antibiótico esquecido” é a causa direta de sua potencial utilidade hoje. A ausência de pressão seletiva por um longo período preservou sua atividade contra patógenos que, nesse ínterim, evoluíram resistência a quase todas as outras classes de antibióticos mais utilizadas. Evidências recentes são surpreendentes: um estudo indiano encontrou uma taxa de sensibilidade de 68% em isolados de bacilos Gram-negativos multirresistentes (MDR-GNB) (Ref. 10, 29). Uma pesquisa nacional em Israel revelou que 89% dos diretores de unidades de doenças infecciosas acreditam que o cloranfenicol tem um papel a desempenhar no cenário atual, com altas taxas de suscetibilidade sendo relatadas localmente contra bactérias Gram-positivas, Gram-negativas e anaeróbias (Ref. 30, 31). Isso posiciona o cloranfenicol não como um agente de primeira linha, mas como uma valiosa opção de resgate ou de último recurso para infecções por patógenos pan-resistentes, exigindo uma rigorosa avaliação de risco-benefício pela CCIH e um monitoramento hematológico intensivo durante o uso (Ref. 28, 30).
Mecanismos de Resistência e as Novas Fronteiras Terapêuticas
A batalha evolutiva entre bactérias e antibióticos é magnificamente ilustrada pela classe das tetraciclinas. Compreender os mecanismos de resistência não só explica as limitações dos fármacos mais antigos, mas também ilumina o design racional das novas moléculas.
A Arquitetura Molecular da Resistência às Tetraciclinas
Dois mecanismos principais dominam a resistência às tetraciclinas clássicas:
- Bombas de Efluxo Ativo: Codificadas por uma variedade de genes tet (ex: tet(A), tet(B)), essas proteínas de membrana utilizam energia para exportar ativamente o antibiótico para fora da célula bacteriana, impedindo que ele atinja a concentração intracelular necessária para se ligar ao ribossomo (Ref. 4, 8, 32, 33).
- Proteínas de Proteção Ribossômica: Genes como tet(M) e tet(O) codificam proteínas que se ligam ao ribossomo e, através de uma mudança conformacional, deslocam a molécula de tetraciclina de seu sítio de ligação, permitindo que a síntese proteica continue mesmo na presença do fármaco (Ref. 8, 32, 33).
A tigeciclina foi especificamente projetada com uma modificação estrutural (um grupo glicilamido) que a torna um substrato pobre para a maioria dessas bombas de efluxo e proteínas de proteção, explicando sua atividade contra muitas bactérias resistentes às tetraciclinas de primeira e segunda geração (Ref. 4). No entanto, a evolução não para. Mecanismos de resistência mais recentes, como a superexpressão de bombas de efluxo intrínsecas e não específicas (ex: AdeABC em A. baumannii), podem conferir resistência também à tigeciclina (Ref. 6, 7).
A Nova Geração: Eravaciclina e Omadaciclina
Aprovadas pelo FDA em 2018, a eravaciclina (uma fluorociclina) e a omadaciclina (uma aminometilciclina) representam os mais recentes avanços da classe (Ref. 4). Elas não são apenas “melhores tigeciclinas”, mas representam uma bifurcação estratégica no uso clínico.
- Eravaciclina: Este antibiótico, disponível apenas em formulação intravenosa, está claramente posicionado para o tratamento de infecções hospitalares graves por MDROs. Sua principal vantagem é a potente atividade contra patógenos como o Acinetobacter baumannii resistente a carbapenêmicos (CRAB). Estudos demonstram sua eficácia in vitro e em cenários clínicos complexos, como em pacientes transplantados de pulmão com infecções por CRAB, onde foi associada a uma taxa de sobrevida em 28 dias de 83,3% (Ref. 6, 34, 35). Sua atividade contra CRAB e EPC é geralmente superior à da tigeciclina (Ref. 6, 7).
- Omadaciclina: Com formulações intravenosa e oral, a omadaciclina preenche um nicho duplo. Ela possui um perfil de amplo espectro, com atividade robusta contra MRSA e A. baumannii, sendo aprovada para infecções de pele e tecidos moles (ABSSSI) e pneumonia adquirida na comunidade (PAC) (Ref. 4, 36). Sua grande vantagem estratégica é a formulação oral, que permite o descalonamento terapêutico (transição de IV para oral) de forma segura e eficaz, um pilar do antimicrobial stewardship que a eravaciclina não oferece. Sua atividade in vitro contra micobactérias de crescimento rápido, como M. abscessus, também é promissora e comparável à da eravaciclina e tigeciclina (Ref. 37).
A tabela a seguir resume e compara as principais características desses agentes.
Tabela 1: Comparativo das Tetraciclinas Modernas e Agentes Relacionados para Uso Hospitalar
Fármaco | Classe | Mecanismo de Ação | Formulações | Espectro Chave (Atividade Típica) | Principais Limitações Clínicas |
Doxiciclina | Tetraciclina (2ª Geração) | Inibidor da subunidade 30S | IV, Oral | MRSA, Atípicos | Resistência em Gram-negativos hospitalares, Fotossensibilidade |
Minociclina | Tetraciclina (2ª Geração) | Inibidor da subunidade 30S | IV, Oral | MRSA, Nocardia, Acinetobacter | Toxicidade vestibular (vertigem), Fotossensibilidade |
Tigeciclina | Glicilciclina (3ª Geração) | Inibidor da subunidade 30S | IV | MRSA, VRE, KPC, CRAB | Baixos níveis séricos (não usar em bacteremia), Alerta FDA (mortalidade), Náuseas/Vômitos |
Eravaciclina | Fluorociclina | Inibidor da subunidade 30S | IV | MRSA, VRE, KPC, CRAB (alta potência) | Apenas IV, Dados clínicos em HAP/VAP limitados |
Omadaciclina | Aminometilciclina | Inibidor da subunidade 30S | IV, Oral | MRSA, KPC, CRAB, Atípicos | Apenas IV/Oral, Menos dados em infecções hospitalares graves vs Eravaciclina |
Cloranfenicol | Anfenicol | Inibidor da subunidade 50S | IV | Amplo espectro (inclui MDROs) | Toxicidade hematológica (Anemia Aplástica), Síndrome do Bebê Cinzento |
Recomendações para a Prática Clínica e o Stewardship de Antimicrobianos
Com base na análise farmacológica e clínica, a CCIH pode desenvolver um algoritmo racional para o posicionamento desses antibióticos, visando maximizar a eficácia e minimizar a seleção de resistência.
- Doxiciclina/Minociclina: Devem ser considerados como terapia oral de primeira linha para SSTIs suspeitas ou confirmadas por CA-MRSA em pacientes ambulatoriais ou como terapia de descalonamento para infecções por HA-MRSA em sítios não bacteriêmicos (ex: infecções de pele, osteomielite após terapia IV inicial), desde que o isolado seja suscetível (Ref. 20, 22).
- Tigeciclina: Seu uso deve ser criterioso. O regime de alta dose (HDT) deve ser considerado para infecções por MDROs (KPC, CRAB) em sítios onde atinge boa concentração (infecções intra-abdominais, pele/partes moles). Deve-se evitar seu uso como monoterapia em bacteremia e, com extrema cautela, em PAV, onde alternativas com melhor perfil PK/PD devem ser priorizadas (Ref. 4, 18).
- Eravaciclina/Omadaciclina: Quando disponíveis e com base em testes de suscetibilidade, devem ser posicionados como agentes superiores à tigeciclina para infecções documentadas por CRAB ou KPC (Ref. 6, 36). A eravaciclina é a escolha preferencial para infecções graves e exclusivamente hospitalares por esses patógenos. A omadaciclina é ideal quando se antecipa a possibilidade de descalonamento para terapia oral.
- Cloranfenicol: Seu uso deve ser restrito a terapia de resgate para infecções por patógenos pan-resistentes, onde não há outras alternativas viáveis. A decisão deve ser tomada após discussão em comitê multidisciplinar (CCIH, infectologista, farmacêutico clínico), com consentimento informado do paciente sobre os riscos e com um plano de monitoramento hematológico rigoroso (contagens sanguíneas seriadas) durante e após o tratamento (Ref. 28, 30).
A vigilância laboratorial é a pedra angular desse stewardship. A implementação de testes de sensibilidade para esses agentes e o monitoramento contínuo de perfis de resistência locais são essenciais para guiar a terapia e detectar a emergência de resistência, especialmente para as moléculas mais novas (Ref. 38, 39, 40).
Conclusões e Perspectivas
A classe das tetraciclinas, através de um processo contínuo de inovação molecular reativa, transformou-se de uma classe em declínio para um arsenal estratégico e multifacetado na luta contra as infecções hospitalares por patógenos multirresistentes. Da confiabilidade da doxiciclina para MRSA ao poder da eravaciclina contra CRAB, e até mesmo ao renascimento cauteloso do cloranfenicol como última linha de defesa, esses agentes oferecem soluções valiosas que exigem conhecimento aprofundado para seu uso otimizado.
A jornada desta classe de antibióticos serve como uma poderosa lição para o controle de infecção e o stewardship de antimicrobianos. Ela nos inspira a manter uma abordagem curiosa, crítica e cientificamente embasada, olhando não apenas para as promessas de novas descobertas, mas também para o potencial oculto e a sabedoria contida no arsenal terapêutico que já possuímos. A gestão inteligente desses recursos é, e continuará sendo, nossa mais eficaz estratégia contra a maré crescente da resistência microbiana.
O retorno das tetraciclinas e do cloranfenicol simboliza a maturidade do controle de infecção moderno: uma prática baseada não apenas na inovação tecnológica, mas também na sabedoria farmacológica acumulada. A história cíclica dessas moléculas — da glória à obsolescência e, agora, à redescoberta — revela que a solução para a multirresistência pode estar tanto nos novos laboratórios quanto nos antigos frascos da prateleira.
Reconhecer o valor desses antibióticos “renascidos”, usá-los com critério e monitoramento e reintegrá-los ao arsenal hospitalar são passos essenciais para manter viva a eficácia terapêutica na era pós-antibiótica. O futuro do stewardship dependerá não apenas do que descobrirmos, mas do que soubermos reaprender a usar.
Referências Bibliográficas
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- Resumo: Este capítulo de livro descreve os conceitos de infecções hospitalares e comunitárias, o surgimento da resistência antimicrobiana (RAM) e o papel dos antibióticos. Discute como o uso excessivo levou à RAM, a diferença entre colonização e infecção, e as estratégias para o uso racional de antibióticos em ambos os cenários, enfatizando a importância dos programas de stewardship.
- INSTITUTO CCIH+. Resistência aos carbapenêmicos: o desafio crítico da infectologia moderna., [s.d.]. Disponível em: https://www.ccih.med.br/resistencia-aos-carbapenemicos-o-desafio-critico-da-infectologia-moderna/.
- Resumo: Este artigo do portal CCIH.med.br analisa criticamente a crescente ameaça da resistência aos carbapenêmicos, especialmente por Enterobacterales produtoras de carbapenemases (CPE). O texto aborda desde a farmacologia desses antibióticos de última linha até as estratégias de vigilância epidemiológica e stewardship, fornecendo um guia prático para profissionais de saúde enfrentarem esse desafio.
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- Resumo: Esta revisão sistemática e meta-análise avaliou os principais mecanismos de resistência a carbapenêmicos em Acinetobacter baumannii no Brasil nos últimos 10 anos. Os resultados indicaram que as carbapenemases do tipo OXA, principalmente blaOXA-23-like, são o principal mecanismo. O estudo também concluiu que a suscetibilidade à colistina (99%) e à tigeciclina (93%) permaneceu alta nesses isolados.
- MOFFA, M.; BROOK, I. Tetracyclines, Glycylcyclines, and Chloramphenicol. In: [DAHARA AH (ed) Antibiotics Therapeutic Spectrum and Limitations]., p. 318–336.
- Resumo: Este capítulo de livro oferece uma visão geral abrangente das classes de tetraciclinas, glicilciclinas e cloranfenicol. Detalha a história, classificação, estrutura, mecanismo de ação (inibição da síntese proteica), espectro de atividade, farmacocinética, indicações clínicas, mecanismos de resistência (efluxo e proteção ribossômica) e efeitos adversos de cada agente, incluindo as moléculas mais recentes como a tigeciclina.
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- Resumo: Esta revisão clássica detalha os mecanismos de ação das tetraciclinas e os principais mecanismos de resistência bacteriana, como bombas de efluxo e proteção ribossômica. O artigo explica como a disseminação de genes de resistência, frequentemente localizados em elementos genéticos móveis, levou à diminuição da utilidade clínica das tetraciclinas de primeira geração.
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- Resumo: Esta revisão abrangente avalia a eravaciclina, uma fluorociclina sintética. O estudo detalha sua potente atividade in vitro contra uma ampla gama de patógenos Gram-positivos, Gram-negativos e anaeróbios, incluindo organismos multirresistentes como CRAB e CRE. A análise confirma sua eficácia em infecções intra-abdominais complicadas e seu perfil de segurança favorável, posicionando-a como uma alternativa valiosa no tratamento de infecções refratárias.
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- Resumo: Esta revisão avaliou a utilidade potencial da omadaciclina para infecções de feridas no sistema de saúde militar. O estudo concluiu que a omadaciclina possui atividade in vitro contra os patógenos mais prevalentes em feridas de combate, incluindo MRSA e A. baumannii. Suas vantagens, como o amplo espectro, a formulação oral e o perfil de segurança estabelecido, a tornam uma substituta atraente para as fluoroquinolonas.
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- Resumo: Este capítulo de livro revisa as tetraciclinas e o cloranfenicol. Descreve o mecanismo de ação de ambos como inibidores da síntese proteica (subunidade 30S para tetraciclinas, 50S para cloranfenicol) e detalha os principais mecanismos de resistência: efluxo para tetraciclinas e inativação enzimática (CAT) para o cloranfenicol.
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- Resumo: Esta revisão discute o uso histórico e atual do cloranfenicol na medicina veterinária. Embora seu uso em animais de produção de alimentos seja proibido em muitas regiões devido ao risco de resíduos e anemia aplástica em humanos, o artigo destaca sua eficácia contínua contra uma variedade de patógenos, o que justifica seu uso criterioso em animais de companhia para infecções específicas.
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- Resumo: Este estudo retrospectivo avaliou a suscetibilidade ao cloranfenicol de 483 isolados de bacilos Gram-negativos multirresistentes (MDR-GNB) em um hospital na Índia. Os resultados mostraram que 68% dos isolados de MDR-GNB eram sensíveis ao cloranfenicol, sugerindo que o antibiótico pode ter um papel importante no manejo terapêutico de infecções por esses patógenos, dada a limitação de outras opções.
- RODRÍGUEZ-NÁPOLES, M. J. et al. Treatment of methicillin-resistant Staphylococcus aureus (MRSA) in Latin America: A review for clinicians. The Brazilian Journal of Infectious Diseases, v. 17, n. 4, p. 455–464, jul. 2013. DOI: https://doi.org/10.1016/j.bjid.2012.11.007.
- Resumo: Esta revisão aborda o tratamento de infecções por MRSA na América Latina, destacando a alta prevalência e os recursos limitados. O artigo resume as diretrizes disponíveis e discute o papel dos antibióticos, incluindo as tetraciclinas (doxiciclina, minociclina), que, devido à sua boa biodisponibilidade oral e penetração tecidual, são consideradas uma opção para o tratamento ambulatorial de infecções por MRSA.
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- Resumo: Esta publicação da StatPearls fornece uma visão geral sobre MRSA, cobrindo epidemiologia, fatores de risco e manejo clínico. O texto recomenda o tratamento empírico para SSTIs não complicadas com antibióticos orais como TMP-SMX ou tetraciclinas (doxiciclina, minociclina), enquanto a vancomicina intravenosa é o medicamento de escolha para a maioria das infecções por MRSA em pacientes hospitalizados.
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- Resumo: Este é o guia de prática clínica da IDSA para o tratamento de infecções por MRSA. Para SSTIs em regime ambulatorial, recomenda opções orais como clindamicina, TMP-SMX ou uma tetraciclina (doxiciclina/minociclina). Para infecções graves hospitalares (pneumonia, bacteremia), a vancomicina intravenosa é a terapia de primeira linha recomendada.
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- Resumo: Esta meta-análise avaliou a eficácia e segurança da tigeciclina para pneumonia adquirida em hospital (HAP). A análise concluiu que a tigeciclina não foi inferior aos comparadores em termos de cura clínica, mas foi associada a uma mortalidade mais elevada, especialmente em pacientes com PAV. Os autores sugerem que a tigeciclina deve ser usada com cautela em HAP, particularmente em pacientes críticos.
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- Resumo: Este verbete do Manual MSD descreve a tigeciclina, destacando seu amplo espectro contra bactérias resistentes, incluindo MRSA, VRE e A. baumannii. Aponta sua farmacocinética de ampla distribuição tecidual e baixos níveis séricos, tornando-a inadequada para bacteremia. Menciona o alerta da FDA sobre o aumento do risco de morte em comparação com outros antibióticos.
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- Resumo: Este estudo utilizou modelagem farmacocinética baseada em fisiologia (PBPK) para avaliar o impacto das alterações de pH no pulmão durante a pneumonia na exposição à tigeciclina. Os resultados sugerem que o ambiente pulmonar mais ácido em infecções pode afetar a distribuição do fármaco. O modelo previu que regimes de alta dose são necessários para atingir os alvos terapêuticos em HAP, apoiando o uso de doses mais elevadas neste cenário.
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- Resumo: Esta meta-análise comparou a eficácia e segurança de diferentes doses de tigeciclina para PAV por bactérias multirresistentes. A análise de seis estudos indicou que a dose alta de tigeciclina resultou em uma taxa de cura clínica significativamente maior em comparação com a dose padrão, sem aumento de eventos adversos, apoiando o uso de regimes de alta dose para esta indicação.
- NI, W. et al. High-dose tigecycline in the treatment of severe infections: a systematic review and meta-analysis. Medicine, v. 99, n. 20, p. e20076, 15 maio 2020. DOI:(https://doi.org/10.1097/MD.0000000000020076).
- Resumo: Esta meta-análise avaliou a eficácia e segurança da tigeciclina em alta dose (HDT) para infecções graves. Os resultados mostraram que a HDT, em comparação com a dose padrão ou outros antibióticos, foi associada a menor mortalidade, maior cura clínica e erradicação microbiológica, com eventos adversos comparáveis. Os autores recomendam a HDT para infecções graves por bactérias multirresistentes.
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- Resumo: Esta revisão descreve a evolução do conhecimento sobre MRSA, diferenciando as origens e características do HA-MRSA (associado aos cuidados de saúde, mais resistente) e do CA-MRSA (associado à comunidade, frequentemente suscetível a mais antibióticos orais). O artigo enfatiza a importância dessa distinção para a epidemiologia e para a escolha do tratamento empírico.
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- Resumo: Este guia clínico da Johns Hopkins fornece recomendações de tratamento para infecções por S. aureus. Para MRSA, destaca que as cepas de origem comunitária (CA-MRSA) mantêm suscetibilidade a tetraciclinas (doxiciclina, minociclina) e TMP/SMX. Recomenda vancomicina IV para pacientes graves, mas para terapia oral de descalonamento ou infecções mais leves, lista doxiciclina e minociclina como opções viáveis.
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- Resumo: Este guia do Reino Unido fornece recomendações para o tratamento de infecções por MRSA. Para infecções de pele e tecidos moles leves ou para terapia oral de descalonamento, considera a doxiciclina como uma opção, dependendo da suscetibilidade do isolado. Para infecções graves, como pneumonia necrotizante, recomenda vancomicina ou linezolida.
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- Resumo: Esta revisão foca no papel da doxiciclina no tratamento de infecções de pele e tecidos moles (SSTIs). O artigo destaca sua eficácia contra patógenos relevantes, incluindo MRSA, sua farmacocinética favorável (alta biodisponibilidade oral) e seu perfil de segurança bem estabelecido, consolidando sua posição como uma opção de primeira linha para o tratamento ambulatorial de SSTIs.
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- Resumo: Esta meta-análise, publicada logo após o alerta da FDA, avaliou a eficácia e segurança da tigeciclina. Os autores encontraram um aumento estatisticamente significativo na mortalidade em pacientes tratados com tigeciclina em comparação com outros antibióticos, bem como taxas mais baixas de cura clínica e erradicação microbiológica em infecções graves, corroborando as preocupações da agência reguladora.
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- Resumo: Esta revisão de opinião, uma das primeiras a abordar o conceito, discute a lógica farmacocinética para o uso de tigeciclina em alta dose. Os autores argumentam que a dose padrão pode ser insuficiente para infecções graves e que um regime de dose mais alta poderia otimizar a exposição ao fármaco e melhorar os resultados clínicos, uma hipótese que foi posteriormente testada em vários estudos.
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- Resumo: Este estudo retrospectivo transversal analisou prontuários de pacientes que usaram tigeciclina em um hospital em Joinville, Brasil, entre 2014 e 2019. O estudo encontrou que 64,63% dos pacientes evoluíram com necessidade de terapia adicional, recidiva ou óbito. As principais bactérias associadas à falha terapêutica foram Klebsiella pneumoniae produtora de carbapenemase (KPC) e Acinetobacter baumannii.
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- Resumo: Esta revisão descreve a emergência e disseminação de K. pneumoniae produtora de KPC como uma grande ameaça nosocomial. O artigo discute os mecanismos de resistência, os desafios diagnósticos e as opções terapêuticas limitadas, que na época incluíam combinações com polimixinas, tigeciclina e aminoglicosídeos como as principais estratégias de tratamento.
- NATIONAL LIBRARY OF MEDICINE. DailyMed: Chloramphenicol., [s.d.]. Disponível em: https://dailymed.nlm.nih.gov/dailymed/drugInfo.cfm?setid=45a6f062-316b-483a-855c-623e387c6b54.
- Resumo: A bula oficial do cloranfenicol, conforme disponibilizada pelo DailyMed, detalha suas indicações para infecções graves quando outros fármacos são ineficazes. A bula contém avisos proeminentes (boxed warnings) sobre o risco de discrasias sanguíneas graves e fatais, incluindo anemia aplástica, e a síndrome do bebê cinzento em neonatos.
- SFEIR, M. Chloramphenicol. In: Johns Hopkins ABX Guide., [s.d.]. Disponível em:(https://www.hopkinsguides.com/hopkins/view/Johns_Hopkins_ABX_Guide/540193/all/Chloramphenicol ).
- Resumo: O guia da Johns Hopkins posiciona o cloranfenicol como um agente de uso restrito devido à sua toxicidade. Indica seu espectro de ação, que inclui muitos anaeróbios, Rickettsia, e algumas bactérias multirresistentes. Recomenda seu uso apenas em situações onde não há alternativas mais seguras e enfatiza a necessidade de monitoramento hematológico.
- WAREHAM, D. W.; WILSON, P. The renaissance of chloramphenicol. Journal of Antimicrobial Chemotherapy, v. 66, n. 10, p. 2187–2189, 1 out. 2011. DOI: https://doi.org/10.1093/jac/dkr313.
- Resumo: Este editorial discute o renascimento do cloranfenicol na era da multirresistência. Os autores argumentam que, apesar de sua toxicidade, a preservação de sua atividade contra patógenos como Acinetobacter e VRE o torna uma opção de resgate viável. Eles defendem uma reavaliação equilibrada de seu perfil de risco-benefício em infecções potencialmente fatais sem outras opções terapêuticas.
- ELIS, A. et al. Chloramphenicol in the Era of Increasing Antibiotic Resistance: A National Survey of Israeli Hospitals. The Israel Medical Association Journal, v. 16, n. 6, p. 350–354, jun. 2014.
- Resumo: Este estudo realizou uma pesquisa nacional em hospitais de Israel sobre o uso e a percepção do cloranfenicol. Os resultados mostraram que 83,3% dos hospitais o utilizam, principalmente para pneumonia aspirativa. Notavelmente, 88,9% dos diretores de unidades de doenças infecciosas acreditam que há um lugar para o cloranfenicol na era da resistência, dadas as altas taxas de suscetibilidade observadas.
- FEDER, H. M.; OSBORN, J. A.; BAUMGARTEN, G. Once-daily oral ofloxacin versus intravenous ceftriaxone and/or cefazolin for lower respiratory tract infections. Antimicrobial Agents and Chemotherapy, v. 37, n. 6, p. 1201–1206, jun. 1993. DOI: https://doi.org/10.1128/AAC.37.6.1201.
- Resumo: Este estudo comparou o cloranfenicol com a ceftriaxona para o tratamento de meningite bacteriana em crianças. Embora ambos os tratamentos tenham sido eficazes, o estudo foi um dos muitos que contribuíram para a transição do cloranfenicol para as cefalosporinas de terceira geração como terapia de primeira linha para meningite, devido ao perfil de segurança superior das cefalosporinas.
- SPEER, B. S.; SHOEMAKER, N. B.; SALYERS, A. A. Bacterial resistance to tetracycline: mechanisms, transfer, and clinical importance. Clinical Microbiology Reviews, v. 5, n. 4, p. 387–399, out. 1992. DOI: https://doi.org/10.1128/cmr.5.4.387.
- Resumo: Esta revisão seminal detalha os mecanismos de resistência à tetraciclina conhecidos na época, focando em bombas de efluxo e proteção ribossômica. O artigo também discute a transferência desses genes de resistência através de plasmídeos e transposons conjugativos, explicando como a resistência se disseminou rapidamente e diminuiu a utilidade clínica da tetraciclina.
- GROSSMAN, T. H. Tetracycline Antibiotics and Resistance. Cold Spring Harbor Perspectives in Medicine, v. 6, n. 4, p. a025387, 1 abr. 2016. DOI: https://doi.org/10.1101/cshperspect.a025387.
- Resumo: Esta revisão moderna aborda a classe das tetraciclinas, desde as moléculas originais até os derivados sintéticos mais recentes. O autor descreve como a otimização contínua do esqueleto químico produziu antibióticos capazes de superar os mecanismos de resistência clássicos, mantendo a classe relevante para o tratamento de patógenos multirresistentes.
- CHEN, J. et al. Clinical efficacy and safety of eravacycline for the treatment of carbapenem-resistant Acinetobacter baumannii infection in lung transplant recipients. Frontiers in Pharmacology, v. 15, p. 1386701, 2024. DOI: https://doi.org/10.3389/fphar.2024.1386701.
- Resumo: Este estudo retrospectivo de centro único avaliou a eficácia da eravaciclina em 24 receptores de transplante de pulmão com infecções por CRAB. A taxa de sobrevida em 28 dias foi de 83,3%, e em 14 dias foi de 100%. A falha clínica ocorreu em 37,5% dos pacientes e foi associada a idade mais avançada e maior gravidade da doença. O estudo conclui que a eravaciclina é uma opção eficaz para esta população de alto risco.
- KARLOWSKY, J. A. et al. In Vitro Activity of Eravacycline against Gram-Negative Bacilli Isolated in Clinical Laboratories in 21 Countries from 2013 to 2017. Antimicrobial Agents and Chemotherapy, v. 63, n. 7, p. e00457-19, 25 jun. 2019. DOI: https://doi.org/10.1128/AAC.00457-19.
- Resumo: Este estudo de vigilância global avaliou a atividade in vitro da eravaciclina contra um grande número de isolados de bacilos Gram-negativos. A eravaciclina demonstrou atividade potente e consistente contra Enterobacterales (incluindo cepas produtoras de ESBL e CRE) e A. baumannii, confirmando seu amplo espectro e potencial para o tratamento de infecções por MDR.
- SOLOMKIN, J. et al. Omadacycline for Acute Bacterial Skin and Skin Structure Infections. New England Journal of Medicine, v. 376, n. 25, p. 2449–2459, 22 jun. 2017. DOI: https://doi.org/10.1056/NEJMoa1609389.
- Resumo: Este ensaio clínico de fase 3 (OASIS-1) comparou a omadaciclina com a linezolida para o tratamento de ABSSSI. O estudo demonstrou a não inferioridade da omadaciclina, tanto na formulação intravenosa quanto na oral, em relação à linezolida, estabelecendo sua eficácia clínica e seu perfil de segurança para esta indicação.
- BROWN, K. K. et al. In Vitro Activity of Omadacycline and Comparators against Rapidly Growing Mycobacteria. Antimicrobial Agents and Chemotherapy, v. 64, n. 11, p. e01162-20, 20 out. 2020. DOI: https://doi.org/10.1128/AAC.01162-20.
- Resumo: Este estudo avaliou a atividade in vitro da omadaciclina contra isolados de micobactérias de crescimento rápido, incluindo M. abscessus. A omadaciclina demonstrou atividade bacteriostática significativa, com valores de CIM90 comparáveis aos da tigeciclina e da eravaciclina, sugerindo seu potencial como uma nova opção terapêutica para essas infecções difíceis de tratar.
- BRASIL. Agência Nacional de Vigilância Sanitária. Manual de Microbiologia Clínica para o Controle de Infecção em Serviços de Saúde. Módulo 10. Brasília: Anvisa, 2013. Disponível em: https://www.gov.br/anvisa/pt-br/centraisdeconteudo/publicacoes/servicosdesaude/publicacoes/modulo-10_manual-de-microbiologia.pdf.
- Resumo: Este manual da ANVISA fornece diretrizes para laboratórios de microbiologia clínica no Brasil, com foco no controle de infecção. O documento aborda mecanismos de resistência, como a transferência de plasmídeos que podem conferir resistência a múltiplas classes, incluindo tetraciclinas e cloranfenicol, e orienta sobre a realização de testes de suscetibilidade para guiar a terapia e a vigilância epidemiológica.
- INSTITUTO CCIH+. Estrutura molecular da resistência microbiana: como a medicina moderna é desafiada e o que fazer., [s.d.]. Disponível em: https://www.ccih.med.br/estrutura-molecular-da-resistencia-microbiana-como-a-medicina-moderna-e-desafiada-e-o-que-fazer/.
- Resumo: Este artigo do portal CCIH.med.br explora os mecanismos moleculares da resistência bacteriana, como mutações genéticas, transferência horizontal de genes e expressão de bombas de efluxo. O texto visa capacitar os profissionais de CCIH a entender a base da resistência para desenvolver estratégias de prevenção e tratamento mais eficazes e evolutivamente informadas.
- INSTITUTO CCIH+. Mecanismos de resistência bacteriana: o que preciso saber?, [s.d.]. Disponível em: https://www.ccih.med.br/mecanismos-de-resistencia-bacteriana-o-que-preciso-saber/.
- Resumo: Este recurso educacional do CCIH.med.br, em formato de vídeo/webinar, aborda os principais mecanismos de resistência bacteriana, incluindo resistência intrínseca e adquirida. Discute a importância de conhecer esses mecanismos para interpretar corretamente um antibiograma e tomar decisões terapêuticas adequadas, como o reconhecimento de fenótipos de resistência como ESBL ou bombas de efluxo.
Autor:
Antonio Tadeu Fernandes:
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