Estudo revela principais não conformidades no uso de EPIs em unidade de emergências e sugere medidas corretivas
Introdução:
Durante a pandemia de COVID-19, a correta utilização dos Equipamentos de Proteção Individual (EPI) tornou-se crucial para proteger profissionais de saúde contra infecções. Entretanto, a adesão às recomendações de uso correto dos EPI tem se mostrado variável. Um recente estudo analisou fatores associados à correção da não conformidade no uso de EPI em um departamento de emergência pediátrica multidisciplinar, por meio de análise retrospectiva por vídeo.
Qual o Principal Achado?
O estudo revelou que embora 83% dos profissionais tenham apresentado alguma não conformidade no uso de EPI, apenas 10% dessas ocorrências foram corrigidas. A maioria das correções ocorreu espontaneamente, com poucas intervenções ou lembretes de outros colegas.
Importância do Tema
A adesão inadequada ao uso de EPI aumenta significativamente o risco de infecção hospitalar, especialmente durante procedimentos que geram aerossóis, colocando em risco tanto a saúde dos profissionais quanto a segurança dos pacientes.
O que já se sabia sobre o tema?
Estudos anteriores já haviam demonstrado baixa adesão inicial ao uso correto de EPI, identificando fatores como falta de materiais adequados e percepção reduzida do risco. Entretanto, havia pouca informação sobre os fatores que favorecem ou dificultam a correção das não conformidades após o início dos procedimentos assistenciais.
Metodologia do Estudo
Foi realizada uma análise retrospectiva de vídeos em 18 ressuscitações pediátricas que envolveram procedimentos geradores de aerossóis (como intubação, ventilação com bolsa-válvula-máscara) durante o período de março de 2020 a dezembro de 2022. Foram identificadas e quantificadas as situações de não conformidade no uso dos EPI (máscaras, aventais e luvas) e as correções realizadas pelos profissionais.
Principais Resultados com Significância Estatística
- De 434 profissionais avaliados, 362 (83%) apresentaram ao menos uma não conformidade.
- Apenas 186 de 1.832 ocorrências (10%) de não conformidade foram corrigidas.
- Luvas foram o EPI com maior taxa de correção (22%), enquanto máscaras tiveram menor taxa (menos de 1%).
- Não conformidades por ausência total de EPI tiveram correções significativamente mais lentas em relação às não conformidades parciais (HR 0,39; IC 95%: 0,16-0,90, p = 0,03).
Quais foram os principais erros encontrados por EPI?
🧤 1. Luvas
- Foi o EPI com mais ocorrências de uso inadequado: 704 das 1.832 não conformidades (38,4%).
- Tipo de erro mais comum: ausência completa das luvas.
- Correções: 154 correções (82,8% das correções totais do estudo).
- Quase todas as correções foram auto-iniciadas (sem que outro profissional alertasse).
- Causa frequente da não conformidade: entrada na sala sem luvas ou troca durante procedimentos.
Comentário dos autores: A alta taxa de correção foi atribuída à facilidade de acesso às luvas (havia várias caixas pela sala) e à necessidade constante de trocá-las.
🥼 2. Aventais (Gowns)
- Total de não conformidades: 650 (35,5%).
- Tipos de erro:
- Ausência total (548 casos – 84,3%)
- Uso incompleto (ex: não amarrar atrás do pescoço ou deixar o tronco exposto)
- Correções: 28 correções.
- Mecanismo: maioria também foi auto-iniciada. Apenas 1 caso foi corrigido por outro profissional.
Comentário dos autores: Aventais mal colocados eram corrigidos mais rapidamente que máscaras, pois causavam incômodo físico (ex: escorregavam) e serviam como “alerta” visual.
😷 3. Máscaras
- Foi o EPI com menor número de correções, apesar de ser essencial contra aerossóis.
- Total de não conformidades: 478 (26,1%).
- 97,5% eram incompletas — uso de máscaras que não cobriam bem nariz e boca ou uso de máscaras inadequadas (ex: não-N95).
- Ausência total foi rara.
- Correções: apenas 4!
- Mecanismo:
- 3 correções foram por alerta de colegas.
- 1 foi auto-correção.
- Em dois casos, outro profissional trouxe as máscaras N95 e entregou aos colegas.
Comentário dos autores: O baixo número de correções sugere que máscaras eram negligenciadas mesmo em contextos críticos, talvez por desconforto, falsa sensação de proteção ou falta de reposição disponível na sala.
Segundo os autores quais as principais causas do uso inadequado de EPIs?
🧠 1. Falta de Pressão Social e de Lembretes Externos
Mesmo em ambientes de alto risco, como a ressuscitação de pacientes com COVID-19, a maioria dos profissionais não era lembrada por colegas sobre a inadequação dos EPIs. Isso sugere:
- Desconforto em corrigir colegas durante situações críticas.
- Normalização da não conformidade — quando muitos estão errados, ninguém se sente obrigado a corrigir.
👉 Ou seja: se ninguém corrige, a cultura de segurança enfraquece.
🕐 2. Situações de Emergência Criam Conflito com a Proteção
Os profissionais muitas vezes:
- Entram apressados nos ambientes sem EPIs adequados;
- Retiram EPIs para realizar tarefas específicas (como digitar ou preparar medicações);
- Executam múltiplas tarefas simultâneas, dificultando manter a atenção à segurança pessoal.
👉 Em emergência, o “instinto assistencial” supera o cuidado com si mesmo.
🚫 3. Barreiras Operacionais e Arquitetônicas
- O carrinho de EPI ficava dentro da sala de atendimento, o que fazia os profissionais entrarem sem estar paramentados.
- Falta de EPIs fora da sala dificultava o uso adequado antes do contato com o paciente.
👉 A organização do ambiente contribuía diretamente para a não adesão.
Conclusões dos Autores
Os resultados indicam grandes desafios para manter a adesão correta ao uso de EPI durante emergências médicas, sugerindo a necessidade urgente de estratégias que promovam comportamentos seguros e correções rápidas em caso de não conformidade.
Fatores Limitantes e Possíveis Confundidores
Entre os fatores limitantes estão o fato do estudo ter sido realizado em um único centro hospitalar, o que pode reduzir a generalização dos resultados, e o fato de não terem sido avaliados aspectos como a correta higienização das mãos ou técnicas detalhadas de colocação e retirada dos EPIs.
Recomendações dos Autores
Para melhorar a conformidade e correção do uso inadequado de EPI, os autores sugerem:
- Melhorar o acesso aos EPIs, disponibilizando-os de forma estratégica e suficiente em múltiplos locais.
- Implementar programas contínuos de feedback em tempo real sobre a adesão ao uso dos EPIs.
- Incentivar práticas como o uso de dupla luva em procedimentos que exigem trocas frequentes.
Fonte do artigo
KIM, Mary S. et al. Factors associated with correction of personal protective equipment nonadherence in a multidisciplinary emergency department setting: a retrospective video review. American Journal of Infection Control, v. 53, p. 30-35, 2025. Disponível em: https://doi.org/10.1016/j.ajic.2024.08.001.
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Resumo: Analisou barreiras para adesão de EPI, destacando necessidade de treinamento contínuo e monitoramento em tempo real.
Comentários Adicionais
É essencial intensificar os programas educacionais e adotar práticas que fortaleçam a cultura de segurança e autocuidado nas instituições de saúde. Estratégias mais robustas para a adesão e correção do uso inadequado de EPIs são necessárias para minimizar riscos associados às infecções.
Sinopse por:
Antonio Tadeu Fernandes:
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