Estudo comprova resultados do Stewardship diagnóstico sobre evolução do paciente, custos e a prescrição de antimicrobianos.
A Infecção por Clostridioides difficile (CDI) representa um desafio persistente para a saúde global, sendo uma das principais causas de diarreia associada a cuidados de saúde. A precisão diagnóstica é fundamental para o manejo eficaz da CDI e para a otimização do uso de antimicrobianos. Este artigo explora uma intervenção de stewardship diagnóstico de vanguarda que impactou positivamente as práticas de solicitação de painéis sindrômicos e o tratamento inadequado de C. difficile. Acompanhe esta análise aprofundada para compreender como estratégias inovadoras podem revolucionar o controle de infecções hospitalares e a luta contra a resistência bacteriana.
Qual o Principal Achado do Estudo?
O estudo central desta análise, publicado na Infection Control & Hospital Epidemiology, revelou um achado de grande relevância: a remoção do alvo de Clostridioides difficile de um painel de patógenos gastrointestinais (GIPP) resultou em um stewardship diagnóstico e antimicrobiano altamente eficaz, sem que houvesse atrasos no diagnóstico da infecção. Esta intervenção levou a uma redução significativa nos pedidos de GIPP e, concomitantemente, a um aumento nos testes direcionados especificamente para C. difficile.1
Adicionalmente, observou-se uma diminuição notável nas prescrições de tratamento para CDI tanto em ambientes ambulatoriais quanto hospitalares. Este dado é crucial, pois sugere que a intervenção não apenas otimizou o processo diagnóstico, mas também impactou diretamente o uso de antimicrobianos, um pilar fundamental no combate à resistência.1 A capacidade de influenciar positivamente a prática clínica sem comprometer a segurança do paciente destaca o potencial transformador de abordagens proativas de stewardship diagnóstico.
Importância do Tema
A infecção por Clostridioides difficile (CDI) é uma preocupação global, reconhecida como uma causa comum de infecções associadas à assistência à saúde (IAS), com significativa morbidade e mortalidade.1 O ônus da CDI é substancial, com custos econômicos elevados em sistemas de saúde, tanto para adultos quanto para crianças, devido a hospitalizações prolongadas e complicações.2
Um dos maiores desafios no manejo da CDI reside na dificuldade em diferenciar a colonização assintomática pela bactéria da infecção verdadeira. C. difficile é um colonizador frequente do trato gastrointestinal, com prevalências que podem atingir 18% em ambientes hospitalares e até 51% em instituições de longa permanência.1 A detecção incidental de colonização, muitas vezes via painéis moleculares multiplex, pode levar a tratamentos desnecessários. Tais tratamentos não apenas expõem o paciente a riscos de toxicidade e eventos adversos, mas também perturbam o microbioma intestinal, o que pode exacerbar a disbiose preexistente e dificultar a restauração de um estado eubiótico.1
Os painéis moleculares multiplex, embora revolucionários por sua velocidade e sensibilidade, podem inadvertidamente contribuir para o sobrediagnóstico e o tratamento excessivo. A inclusão de múltiplos alvos que podem detectar colonização em vez de infecção verdadeira enfatiza a necessidade premente de estratégias robustas de stewardship diagnóstico.1 A otimização do uso de antimicrobianos, impulsionada por um diagnóstico preciso, é um componente vital para combater a emergência da resistência microbiana e diminuir a disseminação de microrganismos multirresistentes.5 Portanto, a gestão diagnóstica não é apenas uma questão de eficiência laboratorial, mas uma estratégia central para a segurança do paciente e a sustentabilidade da eficácia antimicrobiana.
O que se Sabia Sobre o Tema?
Antes da implementação de intervenções de stewardship diagnóstico como a apresentada, o panorama da detecção de patógenos gastrointestinais já estava em evolução. Painéis moleculares multiplex, como os painéis gastrointestinais de patógenos (GIPPs), haviam rapidamente substituído muitos métodos de teste convencionais. Essa transição foi impulsionada pela superioridade dos GIPPs em termos de velocidade de resultado e sensibilidade analítica, o que, por sua vez, resultava em um tempo mais rápido para a terapia direcionada ao patógeno, descontinuação de terapias empíricas, redução dos tempos de isolamento hospitalar e menor risco de hospitalização em 30 dias por gastroenterite.1
No entanto, essa maior sensibilidade e abrangência dos GIPPs apresentavam uma limitação significativa: a capacidade de detectar a colonização por certos microrganismos, como o Clostridioides difficile, em vez de uma infecção ativa.1 O C. difficile é um colonizador frequente do trato gastrointestinal, e sua detecção em pacientes assintomáticos ou com diarreia por outras causas podia levar a tratamentos desnecessários.1 Estudos anteriores, incluindo uma revisão interna na Mayo Clinic Arizona, já indicavam que o C. difficile era o alvo mais comumente identificado nos GIPPs da instituição e que o GIPP era solicitado com maior frequência do que o teste preferencial para C. difficile, sugerindo um uso inapropriado.1
A complexidade diagnóstica era ainda mais acentuada na população pediátrica, onde a prevalência de colonização assintomática por C. difficile é notoriamente alta, especialmente em neonatos e lactentes. Estimativas indicam que até 80% dos neonatos e 60% dos lactentes com até um mês de idade podem estar colonizados.2 Essa alta taxa de colonização em crianças pequenas tornava a interpretação dos resultados de testes laboratoriais desafiadora e aumentava o risco de sobrediagnóstico e tratamento excessivo.2 Reconhecia-se, portanto, a necessidade de estratégias de stewardship diagnóstico para otimizar o rendimento dos testes e garantir que os resultados positivos refletissem a doença ativa, e não apenas a colonização.2
Metodologia do Estudo
O estudo em questão foi concebido como um esforço de melhoria da qualidade rotineira, adotando um desenho quase-experimental, retrospectivo, do tipo pré/pós-intervenção. Foi conduzido em um único centro médico acadêmico terciário e suas clínicas associadas, a Mayo Clinic Arizona.1
A população do estudo incluiu todos os pacientes adultos que receberam testes para Clostridioides difficile e/ou tratamento para a infecção durante o período de análise. O estudo foi estruturado em três fases distintas: um período de linha de base, que se estendeu de 1º de janeiro de 2022 a 31 de janeiro de 2023; um mês de washout em fevereiro de 2023; e um período pós-intervenção, de 1º de março de 2023 a 31 de janeiro de 2024.1
Os testes laboratoriais para C. difficile seguiam um algoritmo específico na instituição. O método preferencial para o diagnóstico de CDI consistia em um imunoensaio de fluxo lateral para antígeno de toxina e glutamato desidrogenase (GDH), com resultados discrepantes sendo confirmados por um teste molecular para toxina A/B.1 O painel de patógenos gastrointestinais (GIPP) utilizado testava para 22 alvos durante o período de linha de base. Um aspecto crítico da metodologia laboratorial era a avaliação da consistência das amostras de fezes; testes eram cancelados se as amostras não atendessem aos critérios de consistência apropriados para o diagnóstico de diarreia.1
A intervenção principal consistiu na remoção do alvo de C. difficile do GIPP, realizada por meio de uma atualização de software fornecida pelo fabricante. Para mitigar o risco de diagnósticos tardios de CDI, uma série de estratégias comportamentais e operacionais foram implementadas. Isso incluiu a criação de alertas no prontuário eletrônico (EHR) no momento da solicitação do GIPP, informando os médicos que o C. difficile não estava mais incluído e oferecendo prompts para a solicitação do teste preferencial. Adicionalmente, alertas foram configurados no sistema de informação laboratorial (LIS) para que o resultado do C. difficile no GIPP fosse reportado como “não testado”. Durante um período inicial de dois meses, uma sinalização de resultado “anormal” foi gerada no EHR para todos os resultados de GIPP, mesmo os negativos, para garantir que os médicos revisassem o relatório completo e notassem a ausência do C. difficile.1
Paralelamente às mudanças tecnológicas, uma campanha educacional direcionada foi conduzida. Médicos infectologistas forneceram sessões educativas a grupos de prescritores de alto volume (incluindo medicina da família, medicina interna e emergência) entre novembro de 2022 e janeiro de 2023. Essas sessões destacaram as diferenças entre os diversos diagnósticos de C. difficile e notificaram os médicos sobre a iminente remoção do alvo do GIPP. A educação foi amplamente disseminada por memorandos eletrônicos.1
Para entender as práticas de solicitação e as lacunas de conhecimento, foram realizadas pesquisas separadas com grupos de médicos e enfermeiros. A pesquisa com médicos focou nas indicações para solicitação de GIPP e no conhecimento sobre testes de C. difficile e GIPP, enquanto a pesquisa de enfermagem abordou sinais e sintomas apropriados e consistência das fezes para pedidos de teste.1
A análise estatística comparou os resultados do período de linha de base com o período pós-intervenção, utilizando o teste qui-quadrado para dados categóricos e o teste t de Student para comparar médias, garantindo a avaliação da significância estatística das mudanças observadas.1
Principais Resultados
Os resultados do estudo demonstraram um impacto significativo e multifacetado da intervenção de stewardship diagnóstico.
Observou-se uma redução estatisticamente significativa nos pedidos de GIPP, que caíram de uma média de 3,23 para 2,70 pedidos por 1.000 visitas de pacientes (P < 0,001). Em contrapartida, os pedidos para o teste preferencial de C. difficile aumentaram notavelmente, passando de 764 para 1.273 pedidos (P < 0,001).1 Como esperado, a taxa de positividade para
- difficile no GIPP caiu de 18,7% para zero após a remoção do alvo. É importante notar que a taxa de positividade para o teste preferencial de C. difficile não apresentou uma queda significativa (7,2% vs. 5,5%, P não significativo), indicando que o aumento no volume de testes direcionados não resultou em um excesso de diagnósticos positivos, mas sim em uma substituição efetiva do método de teste.1
A intervenção também teve um impacto direto na gestão antimicrobiana. As prescrições ambulatoriais para CDI diminuíram significativamente, de uma média de 2,36 para 1,81 por 1.000 visitas ambulatoriais (P < 0,001). No cenário de internação, os dias de terapia (DOT) com antibióticos para CDI por 1.000 dias-paciente (DP) reduziram de 13,77 para 10,58, embora essa redução não tenha atingido significância estatística estrita (P = 0,051), ainda assim representa uma tendência positiva.1
Um aspecto crucial da intervenção foi a monitorização de possíveis atrasos no diagnóstico. Durante o período pós-intervenção, nenhuma evidência de atraso no diagnóstico de CDI foi identificada em pacientes internados mais de 72 horas após a admissão.1 Isso demonstra que a otimização diagnóstica pode ser alcançada sem comprometer a segurança do paciente, um ponto de preocupação em intervenções de stewardship.
Em termos econômicos, a intervenção gerou uma economia hipotética substancial. Com base na redução de 0,53 GIPP por 1.000 visitas de pacientes, substituídos por testes direcionados de C. difficile, estimou-se uma economia de $164.337,85 em encargos durante os 11 meses do período pós-intervenção.1
As pesquisas realizadas com médicos e enfermeiros forneceram um contexto valioso para a intervenção. Na linha de base, C. difficile era o alvo positivo mais comum no GIPP (51% dos resultados positivos), levando a tratamento em 94.9% dos casos.1 A pesquisa revelou que 57% dos médicos solicitavam o GIPP especificamente para testar C. difficile. No entanto, apenas metade dos médicos compreendia que a positividade do GIPP era inerentemente maior em comparação com o teste isolado para C. difficile, indicando uma lacuna de conhecimento que a educação buscou preencher. Entre as enfermeiras, 33% não se sentiam confortáveis em gerenciar situações em que o teste de C. difficile era inapropriado, e 10% relataram pressão de médicos para solicitar o GIPP apesar de suas reservas baseadas nos sintomas do paciente.1 Esses achados sublinham a importância da educação e do suporte à decisão clínica para alinhar as práticas de solicitação com os princípios de stewardship.
A Tabela 1 do artigo original 1 ilustra claramente as mudanças nas taxas de pedidos e positividade:
Resultados | Linha de Base | Pós-intervenção | Valor P |
Pedidos de GIPP/1.000 visitas (DP) | 3.23 (0.35) | 2.70 (0.27) | <.001 |
Qualquer alvo detectado no GIPP (%) | 1,018 (36.7%) | 532 (24.7%) | <.001 |
Adenovirus | 11 (1.1%) | 6 (1.1%) | |
Astrovirus | 17 (1.7%) | 25 (4.7%) | |
Clostridioides difficile | 517 (50.8%) | Não testado | |
Campylobacter | 46 (4.5) | 49 (9.2%) | |
Cryptosporidium | 11 (1.1%) | 7 (1.3%) | |
Cyclospora | 2 (0.2%) | 11 (2.1%) | |
Entamoeba histolytica | 2 (0.2%) | 1 (0.2%) | |
Enteroaggregative Escherichia coli | 75 (7.4%) | 58 (10.9%) | |
Enteropathogenic E. coli | 159 (15.6%) | 118 (22.2%) | |
Enterotoxigenic E. coli | 45 (4.4%) | 33 (6.2%) | |
Giardia | 14 (1.4%) | 7 (1.3%) | |
Norovirus | 182 (17.9%) | 197 (37%) | |
Plesiomonas shigelloides | 3 (0.29%) | 3 (0.6%) | |
Rotavirus | 48 (4.7%) | 32 (6.0%) | |
Salmonella species | 29 (2.9%) | 29 (5.5%) | |
Sapovirus | 23 (2.3%) | 36 (6.8%) | |
Shiga toxin-producing E. coli | 16 (2.6%) | 21 (4.0%) | |
Shigella/enteroinvasive E. coli | 23 (2.3%) | 12 (2.3%) | |
Vibrio cholerae | 1 (0.1%) | 0 (0%) | |
Vibrio species | 5 (0.5%) | 0 (0%) | |
Yersinia species | 17 (1.7%) | 12 (2.3%) | |
Testes de C. difficile isolados/1.000 visitas (SD) | 0.92 (0.16) | 3.06 (0.25) | <.001 |
Testes de C. difficile isolados positivos (%) | 55/763 (7.2%) | 70/1273(5.5%) | NS |
Prescrições ambulatoriais de CDI/1.000 visitas (%) | 2.36 (0.34) | 1.81 (0.37) | <.001 |
DOT de antibiótico para CDI em internados/1.000 DP | 13.77 | 10.58 | NS (P=.051) |
Nota: GIPP, painel gastrointestinal de patógenos; DOT, dias de terapia; DP, dias presentes. Adaptado de Ilges et al., 2025. 1
Esta tabela reitera a eficácia da intervenção em redirecionar os pedidos de teste para o método mais apropriado, resultando em uma redução tangível no tratamento desnecessário de CDI.
Conclusões dos Autores
Os autores do estudo concluíram que a remoção do alvo de Clostridioides difficile do painel de patógenos gastrointestinais (GIPP) constitui uma intervenção de stewardship diagnóstico e antimicrobiano altamente eficaz.1 A abordagem multidisciplinar adotada, que integrou educação direcionada e o aproveitamento de ferramentas de suporte à decisão clínica dentro do prontuário eletrônico (EHR), foi fundamental para o sucesso da iniciativa.1
Eles enfatizam que a significativa redução nos pedidos totais de GIPP, concomitante ao mascaramento do alvo de C. difficile, e o aumento substancial nos pedidos de testes direcionados para C. difficile, juntamente com a diminuição das prescrições ambulatoriais para tratamento de CDI, são indicadores claros da eficácia da estratégia. A ausência de casos de diagnóstico tardio de CDI durante o período pós-intervenção reforça a segurança da abordagem.1
Os autores sugerem que os dados coletados indicam que uma abordagem semelhante pode ser replicada e transladada para outras instituições. Essa aplicação é crucial para melhorar a precisão do diagnóstico de CDI e, consequentemente, limitar o tratamento apenas para casos de infecção verdadeira, contribuindo para o uso racional de antimicrobianos e a prevenção da resistência.1
Fatores Limitantes e Possíveis Confundidores
Embora o estudo demonstre resultados promissores, é fundamental reconhecer suas limitações para uma interpretação contextualizada e para guiar futuras pesquisas. Primeiramente, o estudo foi realizado em um único centro médico acadêmico terciário. Essa característica pode limitar a generalização dos achados para outras instituições, que podem ter diferentes perfis de pacientes, recursos laboratoriais ou sistemas de prontuário eletrônico.1 A população de pacientes em Phoenix, Arizona, onde o estudo foi conduzido, é notável por ter uma alta proporção de pacientes imunocomprometidos, incluindo receptores de transplantes de órgãos sólidos. Esses pacientes apresentam um risco elevado de colonização por C. difficile e de desenvolver CDI, o que pode influenciar os resultados e a aplicabilidade em outros contextos.1
Outra limitação reside na implementação de mudanças nos sistemas de prontuário eletrônico (EHR) e de informação laboratorial (LIS). A capacidade de replicar essas modificações pode ser restrita em centros com menor infraestrutura tecnológica ou recursos limitados.1
A análise de possíveis danos, como atrasos no diagnóstico, focou-se exclusivamente em pacientes internados que testaram positivo para C. difficile mais de 72 horas após a admissão. Essa abordagem pode não ter capturado todos os casos de diagnóstico tardio, especialmente aqueles em pacientes ambulatoriais que poderiam ter tido um diagnóstico atrasado devido ao mascaramento do C. difficile no GIPP, ou que buscaram atendimento em outras instituições.1
Existe um debate contínuo na comunidade médica sobre o método de teste primário mais apropriado para o diagnóstico de CDI.1 Embora o estudo tenha utilizado um algoritmo de teste preferencial, a diversidade de abordagens e a falta de consenso universal podem influenciar a comparabilidade dos resultados com outras práticas.
Finalmente, a intervenção investigada concentrou-se primariamente no mascaramento do alvo de C. difficile no GIPP. Embora eficaz, outras intervenções de stewardship, como “paradas rígidas” (hard stops) para testes GIPP repetidos dentro de um período específico, que foram sugeridas pelo feedback das pesquisas, não foram estudadas. A combinação de múltiplas estratégias poderia ter resultados ainda mais otimizados, e a ausência de sua avaliação representa uma limitação.1
Recomendações dos Autores
Com base nos resultados robustos do estudo, os autores reforçam a importância crítica do stewardship diagnóstico na prática clínica moderna. Eles recomendam que o stewardship diagnóstico seja uma prioridade para garantir que o teste correto seja realizado na amostra adequada e no momento oportuno.1
Especificamente para o Clostridioides difficile, os autores defendem a supressão rotineira do alvo de C. difficile nos painéis gastrointestinais de patógenos (GIPPs). Essa medida visa direcionar os profissionais de saúde para a solicitação de testes mais apropriados e específicos para CDI, evitando o sobrediagnóstico de colonização e o tratamento desnecessário.1
O estudo, ao demonstrar uma intervenção bem-sucedida, oferece um roteiro prático para outras instituições. Este roteiro inclui a supressão do teste de C. difficile no GIPP, a redução de pedidos inapropriados de GIPP e a diminuição do tratamento desnecessário, tudo isso sem causar danos aos pacientes, como atrasos no diagnóstico.1 A combinação de educação, suporte à decisão clínica no prontuário eletrônico e a modificação do painel de testes são elementos-chave desse roteiro, que podem ser adaptados para otimizar o diagnóstico e o manejo da CDI em diversos cenários clínicos.
Comentários Adicionais e Revisão Bibliográfica
A intervenção de stewardship diagnóstico para Clostridioides difficile analisada neste artigo se insere em um contexto mais amplo de esforços para otimizar o uso de recursos diagnósticos e terapêuticos na saúde. A seguir, uma revisão bibliográfica que contextualiza e expande os achados, incluindo uma comparação com diretrizes pediátricas.
Artigos Relacionados do www.ccih.med.br
O site do CCIH (www.ccih.med.br) oferece recursos valiosos sobre o controle de infecções hospitalares e stewardship. Dois artigos relevantes foram identificados:
- Stewardship de antimicrobianos: gerenciando o uso dos antimicrobianos para salvar vidas
- Link: https://www.ccih.med.br/stewardship-de-antimicrobianos-gerenciando-o-uso-dos-antimicrobianos-para-salvar-vidas/ 5
- Resumo: Este artigo destaca a importância do uso criterioso de antimicrobianos como um desafio global, exigindo uma estratégia multiprofissional. Define stewardship de antimicrobianos como a gestão de antibióticos, antifúngicos, antivirais e antiparasitários, visando adequar e otimizar a terapia, combater a resistência microbiana e diminuir a disseminação de microrganismos multirresistentes. Embora não mencione explicitamente “stewardship diagnóstico” ou Clostridioides difficile, ele estabelece a base conceitual para a gestão racional de terapias, um objetivo intrínseco ao stewardship diagnóstico.5
- Programa de Controle de Antimicrobianos (Stewardship): como implementar na minha instituição?
- Link: https://www.ccih.med.br/programa-de-controle-de-antimicrobianos-stewardship-como-implementar-na-minha-instituicao/ 10
- Resumo: O artigo aborda a metodologia de implementação de um Programa de Controle de Antimicrobianos (PCA) em instituições de saúde, enfatizando a necessidade de uma mudança cultural. Detalha as fases de implementação (preparatória, planejamento, otimização do cuidado clínico e aprimoramento), destacando a formação de uma equipe multidisciplinar, o apoio da direção e o uso de ferramentas como software de vigilância e suporte à decisão clínica. Os ganhos incluem melhorias operacionais, financeiras e na redução de custos e resistência. Similar ao anterior, o foco é o stewardship antimicrobiano geral, sem menção direta ao stewardship diagnóstico ou C. difficile.10
A análise desses artigos do CCIH revela que, embora o site promova ativamente a importância do stewardship antimicrobiano, há uma oportunidade para aprofundar a discussão sobre o stewardship diagnóstico e suas aplicações específicas, como no caso do C. difficile. O estudo em revisão preenche essa lacuna, demonstrando uma aplicação prática e bem-sucedida de princípios de stewardship no campo do diagnóstico laboratorial.
Revisão de Artigos Científicos Adicionais
A literatura científica corrobora a complexidade do diagnóstico de CDI e a necessidade de stewardship.
- Krutova, M. et al. Evaluation of a Gastrointestinal Pathogen Panel Immunoassay in Stool Testing of Patients with Suspected Clostridioides (Clostridium) difficile Infection. J Clin Microbiol., v. 57, n. 10, e00710-19, 24 set. 2019.
- DOI: 10.1128/JCM.00710-19
- Resumo: Este estudo avaliou o benefício da implementação do imunoensaio multiplex mariPOC CDI and Gastro para amostras de fezes com suspeita de CDI. Os resultados mostraram que o mariPOC CDI and Gastro teve sensibilidade comparável ao C. Diff Quik Chek Complete para GDH, mas maior sensibilidade para detecção de toxina A/B. Além disso, em 4,53% dos casos, o teste detectou outro patógeno causador de diarreia (Campylobacter spp., rotavírus, norovírus), que teriam permanecido sem diagnóstico com testes mais limitados. Isso sugere que painéis multiplex podem melhorar o diagnóstico microbiológico, mas também reforça a necessidade de interpretação cuidadosa para evitar tratamentos desnecessários de C. difficile quando outros patógenos são a causa primária.11
- Saling, C. F.; Seville, M. T.; Patron, R. L. The effect of gastrointestinal pathogen panel (GIP) on antibiotic management. Antimicrob Steward Healthc Epidemiol, v. 1, n. 1, e5, 24 jun. 2021.
- DOI: 10.1017/ash.2021.162
- Resumo: Este artigo investigou o impacto do GIPP na gestão de antibióticos. Em um estudo retrospectivo com 50 pacientes, descobriu-se que, com exceção da infecção por C. difficile, o GIPP teve pouca utilidade em guiar a gestão antimicrobiana. C. difficile foi o organismo mais detectado (66,7% dos testes positivos), e o teste GIPP não diferenciava colonização de doença ativa, o que poderia levar a tratamento excessivo. Os autores sugerem que pode ser mais eficiente testar primeiro para C. difficile isoladamente, especialmente em pacientes com fatores de risco. Este achado apoia diretamente a intervenção do estudo principal, que removeu o C. difficile do GIPP para promover testes direcionados.8
- Christensen, A. B. et al. Diagnostic stewardship of C. difficile testing: a quasi-experimental antimicrobial stewardship study. Infect Control Hosp Epidemiol, v. 40, n. 3, p. 269–275, mar. 2019.
- DOI: 10.1017/ice.2018.336
- Resumo: Este estudo avaliou uma iniciativa de stewardship diagnóstico que combinou pré-autorização do Programa de Gestão de Antimicrobianos (ASP) com educação para reduzir resultados falso-positivos de CDI de início hospitalar. A intervenção resultou em uma diminuição significativa na taxa de incidência de CDI e na razão de infecção padronizada (SIR), concomitante com uma redução no uso de vancomicina oral. Este estudo demonstra que intervenções multifacetadas, envolvendo educação e controle de pedidos, são eficazes para otimizar o diagnóstico de CDI e reduzir o tratamento desnecessário, corroborando a abordagem do estudo principal.3
Comparação com Diretrizes Pediátricas
As diretrizes para o diagnóstico de CDI em crianças apresentam nuances importantes devido à alta prevalência de colonização assintomática nessa população, que difere significativamente da população adulta.
- Desafio da Colonização: Em neonatos, a taxa de colonização assintomática por C. difficile pode ser de até 80%, e em lactentes com menos de um mês, de cerca de 60%.2 Essa taxa diminui com a idade, estabilizando-se em 0-3% em crianças com mais de 3 anos, similar aos adultos saudáveis.4 Essa alta prevalência de colonização torna a interpretação de testes positivos em crianças muito jovens um desafio, pois a detecção do organismo ou de suas toxinas não necessariamente indica doença ativa.2
- Recomendações Específicas:
- As diretrizes da Infectious Diseases Society of America (IDSA), Society for Healthcare Epidemiology of America (SHEA) e American Academy of Pediatrics (AAP) recomendam que lactentes com menos de 12 meses de idade não sejam rotineiramente testados para C. difficile devido à alta taxa de colonização assintomática.2
- Para crianças entre 1 e 2 anos, o teste pode ser considerado após a avaliação de outras etiologias para a diarreia.2
- Crianças com mais de 2 anos, que apresentam diarreia (definida como ≥3 fezes não formadas em 24 horas) e fatores de risco relevantes (como uso recente de antibióticos, hospitalização ou comorbidades subjacentes), podem ser consideradas para teste de CDI.2
- Testes de amplificação de ácidos nucleicos (NAATs), embora altamente sensíveis, não conseguem diferenciar de forma confiável entre infecção e colonização por C. difficile em crianças.2 Imunoensaios enzimáticos (EIAs) para detecção de toxinas podem ter baixa sensibilidade.2
- Não é recomendado realizar “teste de cura” após a resolução dos sintomas, pois a eliminação prolongada do patógeno e suas toxinas é comum.2
- Divergências e Complementariedade:
- O estudo principal foca em adultos, onde a colonização assintomática é uma preocupação, mas em menor grau do que em crianças pequenas. A estratégia de remover o alvo de C. difficile do GIPP em adultos é um exemplo de stewardship diagnóstico que se alinha com o princípio de evitar testes em populações com alta probabilidade de colonização assintomática, como crianças pequenas.2
- A complexidade do diagnóstico em pediatria, impulsionada pela colonização fisiológica, torna o stewardship diagnóstico ainda mais crítico e com abordagens mais restritivas, como a não recomendação de testes por idade.2
- A experiência do estudo principal em educar médicos e usar alertas no prontuário eletrônico para direcionar o teste apropriado é altamente relevante para a pediatria. Essas ferramentas podem ser adaptadas para reforçar as diretrizes pediátricas e garantir que os testes sejam realizados apenas em crianças com alta probabilidade pré-teste de CDI.
A revisão bibliográfica e a comparação com diretrizes pediátricas reforçam a mensagem central do estudo principal: o stewardship diagnóstico é uma ferramenta indispensável. Ele permite que os profissionais de saúde naveguem pela complexidade dos testes modernos, garantindo que os resultados sejam interpretados corretamente e que o tratamento seja direcionado apenas para a doença ativa, evitando o uso desnecessário de antimicrobianos e suas consequências adversas.
Conclusões Finais e Campos para Pesquisa Futura
A análise aprofundada do estudo sobre o impacto do stewardship diagnóstico na gestão da infecção por Clostridioides difficile (CDI) revela uma verdade fundamental: a otimização do processo diagnóstico é um pilar insubstituível para o controle eficaz de infecções e para a sustentabilidade da eficácia antimicrobiana. A remoção direcionada de alvos em painéis moleculares multiplex, como demonstrado com o C. difficile no GIPP, é uma estratégia poderosa que, quando combinada com educação robusta e ferramentas de suporte à decisão clínica, pode reduzir significativamente o tratamento desnecessário de colonização e o uso inadequado de antimicrobianos, sem comprometer a segurança do paciente. A capacidade de gerar economias substanciais enquanto se melhora a qualidade do cuidado sublinha o valor inerente dessas intervenções.
Recomendações Sintetizadas
Com base nos achados e na literatura correlata, as seguintes recomendações são propostas para instituições de saúde:
- Implementação de Programas de Stewardship Diagnóstico: Estabelecer e fortalecer programas de stewardship diagnóstico focados na adequação dos testes, especialmente para patógenos com alta taxa de colonização, como o Clostridioides difficile. Isso inclui a revisão e otimização de painéis multiplex.
- Aproveitamento de Ferramentas de Suporte à Decisão Clínica: Integrar alertas e prompts no prontuário eletrônico (EHR) para guiar os profissionais de saúde na solicitação de exames, informando sobre as melhores práticas e as implicações dos resultados.
- Educação Continuada e Multidisciplinar: Investir em programas de educação contínua para médicos, enfermeiros e equipe laboratorial sobre o uso apropriado de painéis moleculares, a interpretação de seus resultados e a diferenciação entre colonização e infecção.
- Adoção de Algoritmos de Teste em Etapas: Priorizar algoritmos de teste em etapas para C. difficile, iniciando com testes direcionados quando a suspeita clínica é alta, em vez de depender exclusivamente de painéis amplos que podem detectar colonização.
- Consideração de Restrições de Teste Baseadas na Idade: Para populações pediátricas, implementar e reforçar restrições de teste baseadas na idade, alinhadas às diretrizes existentes, para evitar o sobrediagnóstico e o tratamento desnecessário de C. difficile em lactentes e crianças pequenas.
Campos para Pesquisa Futura
Avanços contínuos no stewardship diagnóstico são essenciais para otimizar ainda mais o manejo da CDI e de outras infecções. Áreas promissoras para pesquisa futura incluem:
- Avaliação em Diferentes Populações: Conduzir estudos para avaliar o impacto de intervenções de stewardship diagnóstico em diversas populações de pacientes (ex: pediátrica, imunocomprometidos em diferentes contextos clínicos) para determinar a generalização dos resultados.
- Eficácia de Intervenções Combinadas: Investigar a eficácia de múltiplas intervenções de stewardship (ex: mascaramento de alvos, hard stops para testes repetidos, auditoria com feedback) aplicadas em conjunto para identificar as estratégias mais sinérgicas.
- Desenvolvimento de Biomarcadores: Fomentar a pesquisa e o desenvolvimento de biomarcadores que possam diferenciar de forma mais precisa a colonização da infecção verdadeira por C. difficile, especialmente em populações com alta prevalência de colonização assintomática.
- Análise de Custo-Efetividade de Longo Prazo: Realizar análises de custo-efetividade de longo prazo de programas de stewardship diagnóstico para quantificar o retorno sobre o investimento e justificar a alocação de recursos.
- Estudos Multicêntricos e Internacionais: Promover estudos multicêntricos e colaborações internacionais para validar os achados em diferentes sistemas de saúde e culturas, contribuindo para diretrizes globais baseadas em evidências.
Ao abraçar essas recomendações e explorar esses campos de pesquisa, a comunidade médica pode continuar a aprimorar o diagnóstico de infecções, promover o uso responsável de antimicrobianos e, em última instância, melhorar os desfechos clínicos para pacientes em todo o mundo.
Fonte e Referências Bibliográficas
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Sinopse por:
Antonio Tadeu Fernandes:
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