Este artigo aborda um estudo observacional retrospectivo que investiga os fatores que afetam as taxas de contaminação no reprocessamento de duodenoscópios após procedimentos de colangiopancreatografia retrógrada endoscópica (CPRE).
FAQ — Duodenoscópios: o que (ainda) contamina, o que funciona e como medir
1) Qual é a mensagem central do artigo?
Mesmo seguindo rotinas, as taxas de contaminação seguem relevantes em duodenoscópios. O estudo destacado no post mostra que limpeza manual ≤5 minutos se associou a mais risco de contaminação — ou seja, tempo de limpeza virou KPI crítico (proxy de diligência/abrangência). → Ler o artigo
Referências: CCIH+. Práticas de reprocessamento… (03/jun/2025). (CCIH Cursos) • van der Ploeg et al., 2024 (limpeza ≤5 min ↑ contaminação). (PubMed)
2) Quanto é “muito”? Qual a ordem de grandeza das taxas hoje?
Estudos fora de surto apontam ~5% de contaminação pós-reprocessamento mesmo com técnicas reforçadas (ESRT) e faixas mais altas (10–20%+) em coortes/centros com variação operacional; a FDA já havia sinalizado 3–6% para organismos de “alta/baixa preocupação” em auditorias do mundo real. → Ler o artigo
Referências: Okamoto 2022 (multicêntrico). (Cambridge University Press & Assessment) • Meta-análise ESRT (~5%). (ResearchGate) • FDA (contaminação “acima do esperado”). (American College of Gastroenterology)
3) Por que o duodenoscópio é “o problema dos problemas”?
Design complexo (elevator mechanism/fendas/canais estreitos) dificulta limpeza e secagem; resíduos orgânicos e biofilme sobrevivem ao HLD se a limpeza falha. Não é só “cumprir passo”: é qualidade do passo. → Ler o artigo
Referências: Revisão narrativa ARIC 2021. (BioMed Central) • CDC — Disinfection & Sterilization (atual. 2024). (CDC)
4) O que, pragmaticamente, mais impacta a fase de limpeza?
- Tempo efetivo de fricção/escovação (não “passar por cima”): >5 min como piso prático na limpeza manual.
- Acesso correto a canais (adaptadores/“credit card”) e detergente conforme IFU.
- Verificação de limpeza (ATP/proteína) como gate antes do HLD.
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Referências: van der Ploeg 2024 (tempo de limpeza). (PubMed) • AORN 2025 (essenciais de reprocessamento: limpar canais certo). (Aorn.org) • AAMI ST91:2021 (verificação/competência). (Default, Healthmark, A Getinge company)
5) “Secagem e armazenamento” são mesmo o calcanhar de Aquiles?
Frequentemente, sim. Secagem insuficiente favorece recontaminação; gabinetes com ar filtrado/tempo adequado e rastreamento reduzem risco. Evidência recente testa métodos híbridos de secagem para melhorar desempenho. → Ler o artigo
Referências: Estudo 2025 comparando método de secagem. (Lippincott) • AAMI ST91 (exige secagem comprovada + armazenamento controlado). (Default)
6) “ESRT”, cultura-quarentena e auditoria microbiológica: qual o papel?
Como camadas adicionais em contextos de alto risco, ESRT e cultura-quarentena podem reduzir contaminação, mas não zeram (pós-ESRT ≈ 5%). Use amostragem dirigida para validar processo e investigar desvios. → Ler o artigo
Referências: Meta-análise ESRT. (ResearchGate) • Revisões Ofstead 2025. (ScienceDirect)
7) E quanto aos novos desenhos (tampa distal descartável) e duodenoscópios 100% descartáveis?
A FDA recomenda migrar de modelos com endcap fixo para componentes descartáveis ou uso único, pois facilitam/dispensam reprocessamento; estudos sugerem menos resíduos/contaminação versus fixos. Custo/ambiental conta, mas segurança do paciente pesa mais. → Ler o artigo
Referências: FDA (transição para designs inovadores). (U.S. Food and Drug Administration, American Gastroenterological Association, APIC) • Trindade 2021 / AORN tabela de evidência (endcap descartável/uso único). (giejournal.org, Aorn.org)
8) “Quanto tempo até começar o reprocesso” e “quem reprocessa” importam?
Curiosamente, no estudo de 2024 atraso >30 min e secagem <90 min não se associaram a ↑ risco, enquanto limpeza ≤5 min sim; também houve tendência de menor contaminação quando o escopo era usado com mais frequência (provável ganho de proficiência). Tradução: treino/competência e tempo adequado de limpeza valem ouro. → Ler o artigo
Referências: van der Ploeg 2024 (análise multivariada). (PubMed) • Slides WFHSS/2024 (dados do mesmo grupo). (wfhss.com)
9) O que dizem normas/guias que devo cobrar no meu POP? (checklist curto)
ST91:2021 (AAMI): validação local do fluxo; competência periódica; verificação de limpeza; borescope quando indicado; secagem/armazenamento validados; rastreabilidade total. Multisocietárias (SHEA/ASGE/SGNA): foco em limpeza manual meticulosa, secagem robusta, auditoria. → Ler o artigo
Referências: AAMI ST91:2021. (Default, Healthmark, A Getinge company) • SHEA/ASGE/SGNA multisocietária. (shea-online.org, sgna.org)
10) E a base regulatória/tecnovigilância no Brasil ajuda?
Há alertas de tecnovigilância da Anvisa sobre videoduodenoscópios e IFUs que reforçam aderência estrita ao reprocesso recomendado e registros; vale acompanhar ações de campo e atualizações de IFU do seu modelo. → Ler o artigo
Referências: Anvisa — alertas/tecnovigilância (videoduodenoscópio). (antigo.anvisa.gov.br) • IFUs/Manuais em base pública da Anvisa. (consultas.anvisa.gov.br)
11) KPIs que não dá pra negociar (gestão à prova de autoengano)
- Tempo de limpeza manual por escopo (mediana; alvo >5–10 min conforme IFU/complexidade).
- Taxa de falha em testes de limpeza (ATP/proteína) antes do HLD.
- Taxa de cultura positiva pós-processo (quando adotado) e tendência por modelo.
- Adesão a passos críticos (checklist observacional).
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Referências: van der Ploeg 2024 (tempo de limpeza como indicador). (PubMed) • AAMI ST91 (verificação/competência). (Default) • FDA — panorama e transição de design. (U.S. Food and Drug Administration)
12) Plano de 30 dias (sem perfume, só execução)
- Sem. 1: Cronometre limpeza manual real em 20 processos; treine técnica (canais/elevator) + adapte POP para refletir tempo/IFU.
- Sem. 2: Implante verificação de limpeza (ATP/proteína) como gate; mapeie lacunas de secagem/armazenamento.
- Sem. 3: Pilote amostragem microbiológica dirigida (ou borescope onde indicado); teste tampa distal descartável se disponível.
- Sem. 4: Publique dashboard (tempo de limpeza, falha em verificação, culturas) e defina decisão 2025–26: endcap descartável / uso único onde risco/volume justificarem.
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Referências: CCIH+. (CCIH Cursos) • AAMI ST91; FDA (designs inovadores). (Default, U.S. Food and Drug Administration)
Qual o contexto do estudo?
Duodenoscópios são instrumentos médicos usados durante procedimentos de CPRE, que envolvem exposição significativa a bactérias gastrointestinais. Dado seu papel no diagnóstico e tratamento de condições biliares e pancreáticas, a limpeza e desinfecção eficazes dos duodenoscópios são cruciais para prevenir infecções cruzadas entre os pacientes. Apesar da adesão aos protocolos de limpeza existentes, taxas de contaminação de aproximadamente 15% a 20% foram relatadas em estudo recentes, indicando que as práticas atuais podem exigir mais refinamento e padronização. Esse estudo é fruto de preocupações contínuas com a segurança do paciente, destacando a necessidade de protocolos de reprocessamento aprimorados para mitigar os riscos associados a duodenoscópios contaminados.
Qual a metodologia adotada?
O estudo analisou culturas coletadas de oito duodenoscópios Pentax ED34-i10T2 equipados com tampas descartáveis entre fevereiro de 2022 e dezembro de 2023. A pesquisa incluiu uma análise abrangente de amostras de cultura, com foco na detecção de microrganismos de origem intestinal ou oral (MGO). Dados sobre o uso do duodenoscópio, tempos de reprocessamento e pessoal envolvido em procedimentos de limpeza foram coletados de registros médicos eletrônicos. Os fatores de risco foram identificados a partir de diretrizes de reprocessamento existentes e literatura relevante, com foco particular em atrasos no início da limpeza manual, duração da limpeza, tempos de secagem, frequência de realização de ciclos de reprocessamento do pessoal e duração de armazenamento superior a sete dias.
Um modelo logístico de efeitos mistos foi implementado para avaliar o impacto desses fatores de risco nas taxas de contaminação do duodenoscópio. Esse método permitiu que os pesquisadores avaliassem múltiplos fatores simultaneamente e determinassem suas respectivas contribuições para os resultados da contaminação.
Quais os principais resultados?
A análise avaliou 307 culturas de duodenoscópios, revelando que 58 delas (18,9%) estavam contaminadas com MGO. Durante o período do estudo, os duodenoscópios passaram por 1.296 ciclos de reprocessamento. Uma descoberta crucial foi que tempos de limpeza manual inferiores 5 minutos aumentaram significativamente as chances de contaminação, com uma razão de chances ajustada (aOR) de 1,61 e um intervalo de confiança (IC) variando de 1,10 a 2,34, indicando uma associação estatisticamente significativa (P = 0,01).
Além disso, os dados também revelaram que o aumento do uso dos equipamentos foi inversamente associado às chances de contaminação, com uma aOR de 0,80 e um IC de 0,64 a 0,995 (P = 0,045). Sugerindo que a frequência do uso do duodenoscópio pode desempenhar um papel na redução da contaminação, potencialmente devido a práticas de manuseio e reprocessamento mais consistentes. No entanto, outros fatores de risco examinados não demonstraram um impacto significativo nas taxas de contaminação.
Quais as principais considerações e conclusões dos autores?
As descobertas deste estudo destacam que a duração da limpeza manual serve como um indicador crítico de desempenho no reprocessamento de duodenoscópios. Especificamente, a associação entre durações mais curtas de limpeza manual (≤5 minutos) e maior risco de contaminação ressalta a necessidade de práticas de limpeza diligentes e completas. Muitos profissionais de saúde enfrentam pressões de tempo e desafios para entender instruções detalhadas de reprocessamento, potencialmente levando a procedimentos de limpeza apressados ou incompletos.
Além disso, os dados do estudo sugerem que indivíduos com experiência infrequente em reprocessamento podem inadvertidamente contribuir para maiores taxas de contaminação devido a atrasos no início dos processos de limpeza e uma tendência a apressar a limpeza manual. Dada a carga cognitiva imposta pelos protocolos de reprocessamento existentes, o treinamento adequado e a prática regular para o pessoal de reprocessamento são essenciais para garantir que os procedimentos de limpeza sejam realizados de forma correta e eficiente.
Sendo assim, os autores defendem o estabelecimento de padrões mínimos para duração da limpeza e frequência de reprocessamento para aumentar a eficácia das práticas de limpeza. Eles também enfatizam a necessidade de mecanismos de monitoramento aprimorados, incluindo tecnologias digitais que podem rastrear os tempos de reprocessamento e alertar o pessoal sobre possíveis deficiências nos protocolos de limpeza.
Em conclusão, o estudo indica a necessidade de uma reavaliação dos protocolos atuais de reprocessamento de duodenoscópios, defendendo maior conscientização sobre práticas ideais de limpeza manual. As evidências coletadas indicam que melhorar o treinamento e a proficiência do pessoal de reprocessamento, juntamente com melhores tecnologias de monitoramento, pode reduzir significativamente as taxas de contaminação e melhorar a segurança do paciente. Pesquisas futuras devem explorar os benefícios potenciais de tais intervenções, incluindo o uso de sistemas automatizados que garantam a conformidade com os protocolos de limpeza.
Fonte:
van der Ploeg, K et al. “Impact of duodenoscope reprocessing factors on duodenoscope contamination: a retrospective observational study.” The Journal of hospital infection vol. 154 (2024): 88-94. https://doi.org/10.1016/j.jhin.2024.09.018
Sinopse por:
Maria Julia Ricci
E-mail: mariaricci.j@gmail.com
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HAANAPPEL, C. P. et al. Unveiling 8 years of duodenoscope contamination: insights from a retrospective analysis in a large tertiary care hospital. Gut, v. 73, p. 613-621, 2024. DOI: https://doi.org/10.1136/gutjnl-2023-330355.
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LARSEN, S. et al. Rate and impact of duodenoscope contamination: A systematic review and meta-analysis. EClinicalMedicine, v. 25, p. 100451, 2020. DOI: https://doi.org/10.1016/j.eclinm.2020.100451.
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BOMMAN, S. et al. Contamination Rates in Duodenoscopes Reprocessed Using Enhanced Surveillance and Reprocessing Techniques: A Systematic Review and Meta-Analysis. Clinical Endoscopy, v. 55, n. 1, p. 33-40, 2022. DOI: https://doi.org/10.5946/ce.2021.212.
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